Frederico Augusto Fonseca dos Santos

A <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm">Constituição Federal de 1988</a> estabelece em seu art. 66 que a Casa Legislativa na qual tenha sido concluída a votação de projeto de lei o enviará ao presidente da República, que poderá sancionar ou vetar o texto, total ou parcialmente, por inconstitucionalidade ou contrário ao interesse público.
Na mensagem nº 178, de 5 de abril de 2022, encaminhada ao presidente do Senado Federal, o presidente da República despachou descrevendo as razões do veto ao Projeto de Lei Complementar 73, de 2021, que dispunha sobre apoio financeiro da União aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios para garantir ações emergenciais direcionadas ao setor cultural. Essa inovação legislativa traria alterações na Lei Complementar nº 101 (Lei de Responsabilidade Fiscal) ao dispor que as transferências não seriam contabilizadas na meta de resultado primário, bem como na Lei 8.313, de 23 de dezembro de 1991, que institui o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), atribuindo outras fontes de recursos ao Fundo Nacional da Cultura.
O Projeto de Lei Complementar intitulado “Lei Paulo Gustavo” destinaria o montante de R$ 3.862.000.000 (três bilhões oitocentos e sessenta e dois milhões de reais) do Orçamento Geral da União aos entes federativos com a finalidade de incrementar, em caráter emergencial, o setor cultural, sob a alegação de prejuízos decorrentes da pandemia (Covid-19). Assim, seriam destinados: R$ 2,79 bilhões para ações no setor audiovisual; R$ 1,06 bilhão para ações emergenciais no setor cultural por meio de editais, chamadas públicas e prêmios.
Em suas razões, o presidente da República sustentou que a proposição legislativa seria contrária ao interesse público e violaria o previsto no art. 107 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ao não apresentar compensação na forma de redução de despesa. Igualmente, ao adicionar uma exceção à meta de resultado primário, levaria o governo federal a incorrer em compressão de despesas discricionárias, sobretudo as relacionadas à execução de políticas públicas voltadas para saúde, educação e investimentos públicos.
Não obstante, rejeitado o veto presidencial pelo <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/congresso-nacional">Congresso Nacional</a> (na Câmara, 414 votaram pela rejeição e 39 pela manutenção. No Senado, rejeição por unanimidade dos presentes), a Lei Complementar 195, de 8 de julho de 2022 foi promulgada pelo presidente da República nos termos do parágrafo 5º do art. 66 da Constituição Federal. Esse é o pano de fundo.
O processo de elaboração de políticas públicas no Brasil sempre enfrentou dificuldades e interferências. Isso não é novidade. Seja de ordem moral, financeira ou política, sempre estiveram presentes. O ciclo das políticas públicas proposto por SECCHI (2013) já evidenciava as dificuldades na sua implementação. Longe de fomentar uma disputa política, apenas a título de curiosidade, convém observar que a iniciativa do Projeto da Lei Complementar foi de oito senadores que pertencem a partidos de oposição ao atual governo.
Pois bem, muito se tem falado sobre ativismo judicial e sua ingerência nas políticas públicas. O consenso está distante e os debates permanecem acalorados. Difícil realmente se posicionar, ainda há longo caminho a percorrer. Entretanto pouca atenção vem sendo empregada ao “ativismo legislativo”.
Explico melhor. A derrubada do veto presidencial que acarretou a promulgação da Lei Complementar 195 não estaria interferindo na execução das políticas públicas em curso pelo Executivo? Como equacionar e equilibrar o orçamento? Deve o Executivo alterar sua agenda?
Estas perguntas são pertinentes. Se compete ao Executivo o planejamento da ação e a aplicação das políticas públicas, como equacionar ou redirecionar o curso das políticas adotadas (ou que estariam na iminência de serem implementadas) quando da edição de nova norma que implica em aumento ou deslocamento de recursos financeiros?
Tarefa hercúlea, sem dúvida. O Estado possui recursos limitados e deve priorizar seus investimentos e como fomentar as políticas públicas com maior eficiência e efetividade. No planejamento orçamentário, o governo federal elabora e gerencia o modo como arrecada e como “gasta” o dinheiro. Necessita, portanto, diagnosticar e eleger as principais necessidades e priorizar suas ações dentro do limite orçamentário. Em outras palavras, deve assegurar que as contas públicas não extrapolem o arrecadado.
O fato é que o “cobertor” muita das vezes é curto e direitos exigem verba para sua efetivação. Não há direito sem “dinheiro”. Quando ele acaba, o direito acaba junto. Seria ilusão imaginarmos a atuação do executivo sem verba. Como assegurar o acesso à educação, à merenda e ao transporte escolar para os que se utilizam do ensino público quando a previsão orçamentária é insuficiente?
A solução parece ser o Executivo voltar para a prancheta e reanalisar as políticas públicas elaboradas e suas prioridades. Revisitaria, certamente, o ciclo das políticas públicas e violaria a análise ex ante. É evidente que esse não é o cenário ideal, mas não há alternativa.
Sem dúvida, em muitos casos o veto presidencial evidencia a falta de congruência entre Executivo e Legislativo. No caso da Lei Complementar 195, resta evidente. Entretanto, preferiria ficar com a ideia de divisão dos custos da decisão. Legislativo e Executivo dividem, de certa maneira, o peso da promulgação da referida Lei Complementar. Os direitos não têm apenas custo orçamentário, possuem também custos políticos e sociais. No caso da “Lei Paulo Gustavo”, vamos aguardar para saber qual ou quais políticas públicas serão afetadas. Quem vai pagar a conta? A única certeza é que os poderes instituídos fizeram suas escolhas, cada um no exercício de suas funções constitucionais.
Bibliografia
SECCHI, Leonardo. Políticas Públicas: conceitos, esquemas e análise, casos práticos. 2ª Ed. São Paulo: Cengage Learning, 2013.
HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. O Custo dos Direitos: Por que a liberdade depende dos impostos; tradução de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: WMF Martins Fontes. 2019.

Sessão do Congresso para analisar vetos e verba para o Fies

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JOTA

Derrubada do veto da Lei 'Paulo Gustavo' não interferiu na execução de políticas públicas do Executivo?

Rejeição do veto presidencial e o desafio das políticas públicas

Artigo 66 da Constituição Federal de 1988 estabelece poder de veto de projetos ao Presidente