Claudio Lopes Cardoso Junior

Uma das novidades do recém aprovado Código de Processo Civil é o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsto nos artigos 133 a 137.
Pelo novo regime, a desconsideração pode ocorrer em qualquer fase do processo (o que já vem ocorrendo na vigência do CPC de 1973), mas será precedida por procedimento que conferirá, ao sócio, a oportunidade de exercer o direito de defesa e do contraditório. E isso, em geral, não vem ocorrendo na vigência do CPC de 1973.
Aspecto relevante consiste em se saber se o novo regime será aplicado no âmbito do procedimento das execuções fiscais, ou seja, se o incidente deve preceder ou não ao famoso redirecionamento. Dois argumentos podem ser suscitados para afastar a aplicação. Primeiro, poderia se cogitar que a hipótese de responsabilidade tributária prevista no Código Tributário Nacional, que é pressuposto para o redirecionamento, difere da desconsideração que trata a legislação civil (Código Civil – artigo 50) e do Consumidor (CDC – artigo 28). O segundo argumento, que, na verdade, poderia reforçar o primeiro, teria alicerce no artigo 1º da Lei nº 6.830/80. O dispositivo prescreve que “a execução fiscal (...) será regida subsidiariamente pelo Código de Processo Civil. Os dois argumentos, no entanto, são improcedentes.
O primeiro porque a responsabilidade tributária dos sócios de que trata o CTN é, na verdade, uma das espécies do gênero (o instituto da desconsideração da personalidade jurídica). Ademais, ainda que assim não fosse, é necessário entender a razão da criação do incidente no novo CPC, que é, pelo menos na minha leitura, conferir, especialmente nos processos de execução, a oportunidade de o terceiro ser ouvido previamente às agressões ao seu patrimônio e esfera jurídica.
O segundo argumento, por seu turno, improcede porque inexiste qualquer previsão na LEF a respeito de como se deve proceder na hipótese de redirecionamento. Havendo o vácuo, resta induvidoso a necessidade de aplicação subsidiária do novo CPC. A prática, aliás, revela que cada juiz trata o redirecionamento de um jeito diferente. Há casos em que a citação do sócio pode vir antes, ou junto ou depois da penhora. Em outras situações raras, há juízes que, atendendo aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, já procedem de forma semelhante à disciplina do novo CPC.
A despeito das razões apresentadas acima, é importante ressaltar que, atualmente, a aplicação subsidiária do CPC no âmbito da execução fiscal segue critério da jurisprudência que considero míope. Veja o caso do seguro garantia, que até pouco tempo não tinha previsão na LEF, mas tão somente no CPC de 1973. Não era aceito pelos tribunais, em razão da ausência de previsão na LEF. A penhora on line, por outro lado, também não tem previsão, mas sempre foi aceita e inclusive assumiu o topo da ordem de preferências das garantias em execução fiscal. Outro exemplo é o caráter excepcional do efeito suspensivo dos embargos à execução, que decorre de alteração do CPC de 1973 e vem sendo aplicado também nas execuções fiscais, a despeito da natureza jurídica ímpar do título executivo que aparelha a execução fiscal e de disposições da LEF incompatíveis com a alteração operada na legislação processual civil.
Superada a questão a respeito da possibilidade de aplicação do novo incidente no procedimento da execução fiscal, cumpre apontar que a inovação provocará o aumento de atos e incidentes processuais, o que, na prática, acabará por contribuir, para pior, com o congestionamento do Poder Judiciário, que já tem a execução fiscal como sua maior vilã, conforme levantamento do Conselho Nacional de Justiça. Vale dizer, nesse contexto, que as Fazendas Públicas contribuem, e muito, para esse cenário, eis que os processos de execução fiscal são ajuizados sem qualquer estudo prévio de viabilidade. E como em muitos casos as chances de recebimento do crédito tributário são pequenas, as Procuradorias, com seus deveres de sempre ajuizar e de sempre recorrer de todas as decisões, acabaram por transformar os pedidos de redirecionamento em “padrão de conduta”. Processos inviáveis atrapalham o trânsito do Judiciário tanto ou mais do que os processos viáveis, tal como ocorre com os carros nos congestionamentos das grandes cidades.
Se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica do novo CPC pode ser considerado um avanço, no que diz respeito aos princípios da ampla defesa e do contraditório, o mesmo, talvez, não possa ser dito com relação a sua contribuição para promessa constitucional de duração razoável do processo (CF – artigo 5º, LXXVIII). A expectativa é que o novo CPC possa contribuir para que o trânsito seja mais seguro, mais dialético e com velocidade razoável.

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JOTA

A versão atualizada do incidente de desconsideração da personalidade jurídica

Regra do novo CPC em execução fiscal contribui para congestionamento do Judiciário

A versão atualizada do incidente de desconsideração da personalidade jurídica