Grupo de Estudos sobre Política Tributária

Embora a pandemia tenha antecipado o agravamento de uma crise, o que vivenciamos hoje não é uma crise provocada pelo coronavírus, mas, sim, o resultado de muitos anos de descontrole fiscal que foram acontecendo ao longo da Nova República, sem que uma indignação popular em grande escala fizesse mudar essa matriz de funcionamento da democracia e da administração pública, que não deu bons resultados e insiste continuar.
Desde 1995, a administração pública brasileira coleciona orçamentos com déficit nominal e a partir de 2014 convive com déficits primário e nominal. Essa negação do básico, esse gasto além das possibilidades, consumiu o que se arrecadou com aumento de carga tributária e ainda patrocinou um grande endividamento do Estado.
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O aumento de carga tributária entre 1995 e 2007 foi considerável. Saiu de 27,23% do Produto Interno Bruto (PIB) em 1995 para 33,77% do PIB em 2007, patamar que permanece até hoje. De 2008 em diante, sem ambiente para aumentar carga tributária, os governos patrocinaram o endividamento. Em janeiro de 2008, a dívida pública representava 57,5% do PIB; em julho de 2020, representava 86,5% do PIB.
Evidente que ter um ou outro ano com um determinado déficit não é um grande problema. Entretanto, avançar décadas colecionando déficits consecutivos é, claramente, um atestado de que a administração pública e o sistema político não estão funcionando bem.
Para cobrir ou evitar um déficit é necessário reduzir gastos, usar reservas, vender patrimônio, aumentar impostos ou contrair empréstimos aumentando a dívida pública. No Brasil, os Governos fizeram e continuam fazendo a opção por aumentar impostos e contrair empréstimos. Isso se tornou uma rotina na administração pública brasileira, quando o ideal seria controlar os gastos para ter um superávit fiscal, inclusive sem a necessidade de aumento dos impostos.
<blockquote class="jota-article__eye">Como resultado de Governos disfuncionais, temos um Estado com muitos gastos, uma carga tributária já bastante elevada e muita dívida.</blockquote>
Os pagamentos dos custos dessa dívida são elevados, continuarão crescendo e arrastarão sim a economia para baixo, pois isso reduz a capacidade de investimento do Estado e afugenta investidores externos. Além disso, significa uma irresponsabilidade de transferência de um pesado fardo para as gerações futuras, especialmente se os juros subirem e a economia não crescer em percentuais entre 5% e 7% do PIB durante 10 ou 15 anos. Situação que está mais próxima de sonho que realidade.
O que temos de previsão para os próximos anos é um PIB paralisado, que reflete uma baixa produção de bens e serviços. Além dessa previsão pouco animadora do PIB, contamos com uma série de indicadores econômicos e sociais desfavoráveis e uma grande dívida pública para administrar e pagar.
As agências de classificação de risco avaliam atualmente o Brasil no patamar BB, com perspectiva negativa. As classificações de risco soberano mostram a credibilidade de um país como tomador de empréstimo. Uma classificação de risco é aproximadamente isso: AAA (menor risco de calote), AA, A; BBB, BB, B; CCC, CC, C; DDD, DD, D (maior risco). As classificações que variam de AAA a BBB são consideradas grau de investimento, todas as classificações subsequentes são classificações de não investimento.
A classificação de não investimento de um país significa que a expectativa de solvência como tomador de empréstimo é baixa e os riscos de não pagamento de dívidas são elevados. Isso indica que esse país terá que pagar juros mais altos sobre seus empréstimos. Situação que já ocorre com o Brasil, e pode piorar. O custo médio do estoque da dívida brasileira é de 9,04% ao ano, e custo médio das emissões está em 5,35% ao ano para títulos de curto prazo. Isso já não é uma taxa singela, visto que a Selic está a 2% ao ano.
Com uma dívida pública bruta que já ultrapassa 86,5% do PIB (R$ 6,210 trilhões) e sem perspectiva de crescimento robusto da atividade econômica, o pagamento de taxas de juros ainda mais elevadas para o refinanciamento ou rolagem da dívida significará, sim, um desastre financeiro para o país. Esse assunto o governo não está abordando com a transparência devida.
O orçamento da União para 2020 prevê R$ 409 bilhões só para pagamento de juros e encargos da dívida (esse valor significa 23 vezes o valor do orçamento do Ministério da Agricultura, que é de R$ 17 bilhões em 2020), e um refinanciamento ou rolagem de títulos da dívida na ordem de R$ 1 trilhão.
Um ponto que merece atenção diz respeito a essa previsão de refinanciamento ou rolagem de aproximadamente R$ 1 trilhão de dívida ao ano. Isso é muito dinheiro, e posiciona o governo como grande competidor do setor produtivo pelo crédito disponível na praça.
Com isso, um aumento da taxa de juros para a rolagem da dívida pública cria, imediatamente, um piso de taxa de juros para o financiamento das atividades na economia real, ou seja, do setor produtivo.
Evidente que os investidores dificilmente emprestarão para o setor privado com taxas até mesmo iguais àquelas que o Governo está pagando pela compra de seus títulos. Emprestar para o Governo não precisa nem de estrutura para fazer análise de crédito. Como aconteceu nos últimos 25 anos, o setor produtivo terá que pagar taxas mais elevadas para competir com o Governo ou se beneficiar de equalização de juros com dinheiro do Governo, o que só fará agravar a situação financeira da República.
Entretanto, além da pouca confiança das agências de classificação de risco na capacidade de pagamento do Governo, do custo elevado da manutenção da dívida pública e da competição com o setor produtivo pelo crédito disponível, temos outro agravante: a dívida de hoje funciona como um indicador do patamar dos impostos do amanhã.
Um Estado endividado não terá condições de oferecer às empresas uma taxa de imposto atraente, que torne sua atividade competitiva ou mais competitiva. Assim, empresas internacionais ou mesmo investidores domésticos, ao considerarem esse fator, poderão dar preferência a países com menor grau de endividamento e maior disponibilidade para investir e administrar sua carga tributária.
<blockquote class="jota-article__eye">Evidente, portanto, que quanto maior a dívida e o custo dessa dívida, mais as mãos do Estado ficarão amarradas, independentemente de a dívida ser interna ou externa.</blockquote>
Fato é que quando aqueles que emprestam dinheiro ao governo vislumbrarem uma certa insustentabilidade da dívida, vão aumentar o prêmio de risco que será traduzido em aumento de juros, o que fará piorar a situação financeira do Estado.
Infelizmente os governos durante a Nova República não foram competentes o suficiente para administrar a dívida pública amoldando-a ao patamar da criação de riquezas. Deixaram, irresponsável e deliberadamente de fazer o básico, ou seja, de cumprir a regra orçamentária. Assim, chegamos a insustentabilidade das finanças públicas. Esse é o contexto onde se discute uma reforma tributária.
Autor: Reginaldo Minaré - Advogado e consultor na Confederação Nacional do Agronegócio (CNA). Mestre em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP)
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O episódio 46 do podcast Sem Precedentes discute se o contrato de trabalho intermitente é ou não constitucional. Ouça:
https://youtu.be/o8E3sXtx7j0
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tributos jota

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JOTA

Estado endividado e carga tributária em alta, o contexto da tentativa de reformulação do sistema tributário

Reforma tributária com finanças públicas insustentáveis

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