Ana Carolina de Camargo Clève

Suzan Raphaellen Franche

Não se trata de novidade que, no mundo todo, os shopping centers estão sendo desafiados dia após dia, sobretudo em razão da ampla ascensão do comércio on-line. Bem por isso é que os shoppings, na tentativa de manutenção de sua relevância para o desenvolvimento econômico e social, passaram a mirar também – e especialmente - nos serviços e entretenimento.
O fato é que, mesmo com as transformações do varejo, é possível afirmar que, no Brasil, os shopping centers ainda mantêm considerável relevância como “fonte de recursos, de empregos e de recolhimento de impostos”; e, para além disso, possuem importante função social e de desenvolvimento de marcas e produtos” (ELIAS FILHO, Rubens Carmo; CARVALHO, Ana Carolina Paes de. Direito imobiliário: contratos de shopping center e suas peculiaridades. In: SOARES, Renata Domingues Balbino Munhoz. (Coord.) Fashion Law – direito da moda. São Paulo, Almedina, 2019, p. 96).
Em síntese, a cultura brasileira de consumo ainda aposta nos shopping centers, motivo pelo qual tais empreendimentos são grandes consumidores de energia elétrica, água, gás... (dados da Associação Brasileira de Shopping Centers – Abrasce apontam que esses estabelecimentos geram no país 998 milhões de empregos e contam, em média, com 341 milhões de visitantes por mês).
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Contudo, em razão das – necessárias – restrições impostas para o controle da pandemia de COVID-19, houve significativa redução nos horários de funcionamento dos shopping centers (isso quando não foi imposto o completo fechamento do comércio em geral), o que – notoriamente – repercutiu no fluxo de circulação de pessoas e, por consequência, impactou sobremaneira no faturamento desses empreendimentos. Exatamente à luz desse contexto, recentemente, os Tribunais de Justiça têm caminhado no sentido de admitir a possibilidade de readequação – transitória – do contrato firmado entre os shopping centers e as fornecedoras de energia elétrica para fins de que seja cobrado, durante o período de restrição de funcionamento ante a situação de reconhecida calamidade pública, apenas a tarifa relativa ao efetivo consumo. Explica-se: empreendimentos que consomem demasiada energia elétrica (porquanto o funcionamento depende de iluminação, climatização e segurança) costumam contratar o fornecimento de energia por demanda. Assim, o tarifamento ocorre por meio de cálculo que leva em conta o potencial de energia estimado (demanda); com isso, a empresa fornecedora de energia recebe todo mês um valor mínimo - ainda que o consumo em determinado mês fique abaixo daquele valor estipulado mediante a média dos maiores consumos.
No Paraná, o Tribunal de Justiça, no julgamento do Agravo de Instrumento de n.º 0049199-72.2020.8.16.0000 (16 de março de 2021), entendeu – acertadamente e na linha do que vem decidindo o Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo – que a restrição do funcionamento dos shopping centers, em decorrência da pandemia que ora se enfrenta, enquadra-se no conceito de caso fortuito ou força maior previstos nos contratos de fornecimentos de energia elétrica. Na ocasião, o Relator, Des. Leonel Cunha, alertou que a situação atual “não se trata de dificuldades financeiras ou mera alteração de condições de mercado e sim de restrição de funcionamento regular do shopping em razão da pandemia. São condições adversas e imprevisíveis quando da celebração do contrato”, fato este que “alterou o cenário de normalidade previsto quando o contrato de uso de sistema de distribuição (CUSD) foi pactuado”. Daí que se justifica – temporariamente – a alteração para estabelecer o reequilíbrio e readequação do contrato para que o valor pago seja correspondente ao consumido.
Na mesma linha de entendimento, o Tribunal de Justiça de São Paulo no julgamento da Apelação Cível de n.º 1041688-18.2020.8.26.0100, reconheceu que “a pandemia consubstanciou-se em caso fortuito ou força maior, com modificação da base do negócio, tornando necessária a readequação dos contratos de fornecimento de energia firmados entre as partes”. De acordo com essa decisão, o impacto de toda a cadeia produtiva ocasionado pela suspensão, determinada pelo Governo Estadual, dos estabelecimentos comerciais, exige a intervenção do Poder Judiciário para reequilibrar as relações jurídicas.
<blockquote class="jota-article__eye">Diante dos graves prejuízos econômicos ocasionados pela pandemia, entende-se adequada a postura de intervenção do Judiciário para minimizar o colapso de empreendimentos e setores que exercem importante papel na movimentação da economia regional.</blockquote>
Até porque, em casos como este, é relevante frisar que não se está provocando a intervenção do Judiciário para suspender o pagamento do serviço contratado; ao revés, apenas para que – enquanto perdurar o cenário de crise – o contrato seja readequado para que o valor pago seja de acordo com a energia efetivamente consumida e não de acordo com o potencial de consumo (demanda) em períodos de normalidade. Ou seja, preserva-se o adimplemento de acordo com critérios de proporcionalidade.
A acertada medida que vem sendo adotada pelos Tribunais direciona para o necessário restabelecimento do equilíbrio nos contratos firmados entre os shopping centers e as distribuidoras de energia elétrica - especialmente por se tratar de setor que exerce fundamental papel para fins de desenvolvimento econômico, social e cultural.
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Diante dos graves prejuízos econômicos, entende-se adequada a postura de intervenção do Judiciário

Shoppings centers e fornecedoras de energia elétrica na pandemia

Diante dos graves prejuízos econômicos, entende-se adequada a postura de intervenção do Judiciário para minimizar o colapso de empreendimentos