Danilo Dourado Lages

O acordo de compartilhamento de custos/despesas (cost sharing agreement) se caracteriza por ser realizado por meio de contratos intercompany, com o objetivo de promover a alocação de custos e despesas entre pessoas jurídicas distintas, porém pertencentes ao mesmo grupo econômico.
Como exemplo de um dos diversos cenários pertencentes a esse gênero, a matriz de um grupo empresarial poderá desembolsar o valor integral para o pagamento de um serviço de treinamento externo para os seus executivos, que será aproveitado por todas as sociedades pertencentes a esse grupo. Como as demais empresas do grupo também se beneficiam do serviço prestado, é realizado o rateio proporcional da despesa, havendo fluxo financeiro entre elas por reembolso. 
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Aplicabilidade e benefícios
Os contratos de rateio de custos/despesas se tornaram prática comum em grandes grupos empresariais, que buscam uma economia de escala atrelada ao modelo de contratação.
Nesse contexto, há um maior poder de barganha na negociação comercial com fornecedores e consequente redução de custos/despesas, podendo haver, ainda, um ganho de sinergia gerencial no controle das contratações do grupo internamente. De forma geral, há um custo consideravelmente menor quando uma empresa contrata em nome de todo o grupo para, em seguida, haver o compartilhamento de custos.
O tratamento tributário a ser aplicado à situação em análise dependerá dos procedimentos adotados e lançamentos contábeis realizados, conforme se mostrará a seguir.
Previsão legal (Ausência)
Não há previsão legal expressa no ordenamento jurídico brasileiro em relação aos contratos de rateio de custos/despesas. Há, entretanto, alguns critérios recorrentemente elencados pelas autoridades fiscais para que tais custos e despesas compartilhados sejam caracterizados como reembolso, conforme Solução de Consulta COSIT nº 8/2012 e Solução de Divergência COSIT nº 23/2013:
<ol>
<li>Rateio unicamente entre empresas do mesmo grupo econômico;</li>
<li>Bens e serviços recebidos e efetivamente pagos;</li>
<li>Gastos rateados têm que ser necessários, usuais e normais às atividades das empresas (art. 311 do RIR/2018);</li>
<li>Formalização de contrato de rateio de custos/despesas, elencando as empresas participantes e definindo os critérios e parâmetros;</li>
<li>Critério de rateio de acordo com o efetivo gasto de cada empresa e com o preço global pago pelos bens/serviços, em observância aos princípios técnicos ditados pela Contabilidade. Assim sendo, deve haver um controle de rateio efetivo entre as empresas participantes do rateio;</li>
<li>Cada empresa se apropria somente da sua parte da despesa. A empresa centralizadora deve contabilizar as parcelas a serem ressarcidas como Direitos de Créditos a Recuperar; e</li>
<li>Não pode haver favorecimento de uma empresa em detrimento de outras através do rateio (i.e.prejuízo operacional, prejuízo fiscal, optante pelo lucro presumido).</li>
</ol>
Desse modo, a ausência de legislação específica para o referido modelo de rateio, por si só, não implica em obstáculo para as organizações o adotarem, desde que seguidos os requisitos listados acima.
Segmentação: Serviços adquiridos de terceiros
Entre os diversos tipos de acordos de repartição de custos (gênero) e, mais especificamente, de cost-sharing intercompany, propõe-se discutir os efeitos tributários intra-grupo na hipótese de haver serviços adquiridos de terceiros por meio de uma empresa centralizadora (contrato de compartilhamento de custos e despesas). Em outras palavras, quando uma empresa do grupo econômico contrata diretamente serviços de um fornecedor (que não faz parte do grupo econômico), mas outras empresas do mesmo grupo também se beneficiam do serviço prestado por esse fornecedor.
Tal compartilhamento de custos se faz por meio de reembolsos, a serem feitos pelas demais empresas beneficiadas à empresa do grupo centralizadora (contratante perante o fornecedor externo). A tais reembolsos não se aplica margem de lucro, sendo realizados via nota de débito<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> (documento financeiro a ser emitido pela empresa centralizadora para recuperação dos custos e despesas, com evidências que o sustenta: usualmente, a própria nota fiscal referente ao serviço contratado junto ao terceiro fornecedor pela empresa do grupo centralizadora).
Faz-se imprescindível, ainda, um contrato prévio de cost-sharing entre as empresas do grupo com a discriminação dos custos/despesas que serão objeto de rateio, bem como com os critérios de rateio acordados entre as partes.
Em suma, podemos elencar como as principais características que devem se fazer presentes na configuração em análise:
<ul>
<li>Benefícios comuns às empresas partícipes do rateio (ausência de interesses contrapostos);</li>
<li>Concentração do desembolso inicial em uma única empresa, que será reembolsada pelas outras empresas participantes;</li>
<li>Cada empresa partícipe se obriga a assumir parcela da despesa (Princípio da Entidade, que se trata de um pilar fundamental da Contabilidade);</li>
<li>Compartilhamento de atividades-meio (a atividade compartilhada não pode fazer parte do objeto social da empresa centralizadora. Caso contrário, poder-se-ia argumentar que se trata de uma prestação de serviço interno entre empresas do mesmo grupo, o que não é o caso);</li>
<li>Ausência de lucro;</li>
<li>Necessidade de instrumento firmado entre os intervenientes: cost-sharing agreement.</li>
</ul>
Aspectos contábeis e impactos tributários – Rateio entre empresas nacionais
Na hipótese de haver rateio de custos/despesas entre empresas situadas no Brasil, tomando-se como premissa que o reembolso de custo/despesa é um mero ressarcimento e seguindo-se todos os requisitos supramecionados, não há que se falar em tributação no valor recebido pela empresa centralizadora das empresas coligadas. Há, entretanto, uma configuração de lançamentos contábeis que dá ensejo à não-tributação de PIS e COFINS, conforme será mostrado a seguir.
Analisemos um exemplo de contratação nos presentes moldes:
&nbsp;
<ul>
<li>Grupo formado por quatro empresas (incluindo a centralizadora);</li>
<li>Método de rateio: horas gastas pelo fornecedor (timesheet);</li>
<li>Percentual do timesheet: Empresa A (centralizadora) - 40%; Empresa B - 25%; Empresa C - 15%; Empresa D – 20%</li>
<li>Valor do custo ou despesa rateada: R$100.000,00.</li>
</ul>
<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/03/1.png"><img class="aligncenter wp-image-299037 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/03/1.png" alt="" width="1495" height="452" /></a>
Considerando que o intuito é evitar a tributação do reembolso recebido pela empresa centralizadora, o ideal é que tal ressarcimento não transite pelo resultado da Empresa A como um crédito (mas tão-somente pelas suas contas patrimoniais). Caso contrário, o Fisco pode entender que o reembolso transitado a crédito no resultado se trata, na verdade, de uma receita (para fins de tributação de PIS e COFINS).
Desse modo, o cenário ideal de contabilização na empresa centralizadora é o seguinte:
<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/03/2.png"><img class="aligncenter wp-image-299038 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/03/2.png" alt="" width="1140" height="467" /></a>
Importante notar que a empresa centralizadora somente toma como despesa a sua parte da despesa (R$40.000) e que os reembolsos não transitam pelo resultado.
Como contabilização alternativa, há o cenário abaixo, que é mais usual e envolve maiores riscos fiscais (para fins de PIS e COFINS):
<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/03/33.png"><img class="aligncenter wp-image-299039 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/03/33.png" alt="" width="1224" height="466" /></a>
Ainda que haja argumentos contábeis<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> que posssam ser utilizados no cenário 2 anterior (uma vez que a recuperação de despesas não resulta no aumento de patrimônio líquido, já que há mera reconstituição do patrimônio pelo desembolso realizado pela empresa centralizadora); e de não haver margem de lucro nessas operações, o segundo método de contabilização mostra-se mais arriscado.
Para fins de não-incidência de PIS e COFINS no reembolso, portanto, recomenda-se o primeiro método de contabilização.
Também não incide ISS no ressarcimento, uma vez que não há lucro na operação, conforme Solução de Consulta COSIT no 8/2012<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a> e Solução de Divergência COSIT no 23/2013<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>.
No que concerne à dedutibilidade para fins de IRPJ/CSLL, basta haver critérios de rateio bem estabelecidos e serem custos/despesas necessários às atividades das empresas.
Impactos tributários – Cost-sharing internacional
Usual também é o cenário em que uma empresa brasileira reembolsa para uma coligada no exterior (podendo ser a sua matriz) um custo/despesa a título de cost-sharing
Nesse caso, todos os requisitos já mencionados devem se fazer presentes para que, sobre o ressarcimento, não haja uma interpretação do Fisco de que se trata de importação de serviços (incidindo, neste caso, somente 0,38% a título de IOF). Caso contrário, há a possibilidade de incidência de até aproximadamente 50% de tributos sobre a operação (somados: Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), CIDE, PIS-Importação, COFINS-Importação, ISS e IOF).
Ainda assim, no cenário de cost-sharing internacional, em se tratando de remessas para o exterior, há divergência de interpretação por parte da Receita Federal do Brasil (RFB)<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>, Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF)<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a>, Conselho Municipal de Tributos de São Paulo (CMT)<a href="#_ftn7" name="_ftnref7">[7]</a> e Poder Judiciário<a href="#_ftn8" name="_ftnref8">[8]</a>, diferentemente da hipótese de cost-sharing nacional (pacificado).
No âmbito judicial, ainda que haja um número reduzido de casos apreciados, nota-se, contudo, um cenário positivo ao contribuinte (no sentido de não incidência de tributos de importação sobre o reembolso ao exterior).
O presente artigo busca demonstrar os impactos tributários do contrato de compartilhamento de custos/despesas (cost-sharing agreement) feitos entre empresas coligadas, especificamente na contratação de um fornecedor terceiro por meio de uma das empresas do grupo, que será reembolsada por suas coligadas proporcionalmente ao benefício decorrente do serviço prestado pelo terceiro.
É possível afirmar que, no âmbito nacional, seguindo-se os requisitos demonstrados e havendo uma contabilização adequada das operações, os contratos de rateio de custos e despesas são instrumentos eficientes para a alocação desses gastos entre empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico. Dessa maneira, feito o devido planejamento, há bons elementos para a não-tributação dos reembolsos.
Do ponto de vista de uma operação dessa natureza no âmbito internacional (remessa ao exterior), por sua vez, ainda que haja posicionamentos administrativos e judiciais divergentes, vemos com bons olhos a tendência de decisões judiciais favoráveis ao contribuinte (para a não-incidência dos tributos de importação, aplicando-se somente o IOF), dado se tratar de operação cada vez mais comum e necessária às empresas, dada a redução de custos por meio de ganho de sinergia.
Portanto, ainda no âmbito de remessas internacionais, há que se estar atento à maturação da matéria nos tribunais, haja vista que, apesar de serem instrumentos adequados de gestão, o tema ainda não é pacífico do ponto de vista tributário, o que gera insegurança jurídica aos contribuintes.
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O episódio 50 do podcast Sem Precedentes faz uma análise da decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal nesta semana e que pode acelerar a aplicação de vacinas contra a Covid-19. Ouça:
https://www.youtube.com/watch?v=b9z7dDRHnrg
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> A validade da nota de débito é corroborada pelo Acórdão no 101-85.116/93 do 1º Conselho de Contribuintes: “NOTAS DE DÉBITO (VALIDADE) - Identificam-se como despesas operacionais aquelas necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora de receitas. Se o fisco nada questiona sobre a necessidade ou legitimidade da despesa, sobre sua realização ou sobre o rateio, improcede a glosa que se amparou unicamente no fato de ter o contribuinte se utilizado de ‘Notas de Débito’, mormente se considera que essas Notas de Débito são documentos contábeis hábeis”. (Grifos nossos)
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Conceito de receita no Pronunciamento Técnico CPC n° 30: “Receita é o ingresso bruto de benefícios econômicos durante o período observado no curso das atividades ordinárias da entidade que resultam no aumento do seu patrimônio líquido, exceto os aumentos de patrimônio líquido relacionados às contribuições dos proprietários”.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> “Caso o preço estabelecido no contrato para os serviços vise apenas o ressarcimento dos custos incorridos pela empresa líder, sem elemento de lucro adicional, os preços deverão corresponder, efetivamente, a um reembolso dos custos. Na hipótese de os preços excederem o custo, a parcela excedente do custo efetivo constituirá rendimento (lucro) do prestador”.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> “Neste contexto, impende reconhecer que os valores auferidos pela pessoa jurídica centralizadora como ressarcimento pelos demais integrantes do grupo econômico dos dispêndios que ela suportou com as atividades compartilhadas não constituem receita por lhes faltar essencialmente o elemento caracterizador desse tipo de ingresso, qual seja o ganho, o potencial para gerar acréscimo patrimonial”.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> Solução de Consulta COSIT no 43/2015, Solução de Consulta COSIT no 50/2016, Solução de Consulta nº 378/2017.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a> Acórdãos nº 3201-003.152 e nº 3301-004.633 do CARF.
<a href="#_ftnref7" name="_ftn7">[7]</a> Processo Administrativo nº 6017.2016/0030813-8 e Processo Administrativo nº 2011-0.166.715-6.
<a href="#_ftnref8" name="_ftn8">[8]</a> TRF3: acórdão proferido na Apelação e Reexame Necessário nº 0027722-76.2007.4.03.6100/SP e Apelação e Reexame Necessário nº 0003712-54.2015.4.03.6110/SP.

calculadora e dinheiro

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JOTA

Análise do impacto tributário de serviços adquiridos de terceiros

Compartilhamento e reembolso de custos e despesas (cost sharing)

Cost sharing  -  compartilhamento e reembolso de custos e despesas: análise do impacto social de serviços adquiridos de terceiros