Phelippe Toledo Pires de Oliveira

No início de fevereiro, o governador de São Paulo, <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/tarcisio-de-freitas">Tarcísio de Freitas</a>, vetou o <a href="https://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=1000331890">PL 511/2020</a>, aprovado pela Assembleia Legislativa no final de 2022. Tal projeto reduzia a alíquota do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/itcmd">ITCMD</a>, atualmente em 4%, para 0,5% na hipótese de doações e 1% nas transmissões por morte, como as heranças. A pretendida redução tinha por justificativa a necessidade de alívio da carga tributária em razão da crise econômica causada pela pandemia.
O veto se deu por razões de natureza orçamentária, tendo por fundamento o art. 113 do ADCT e o art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Esses dispositivos exigem não somente a estimativa de impacto orçamentário e financeiro das proposições legislativas que impliquem renúncia de receitas, como também previsão na lei orçamentária ou medida compensatória para neutralizar a perda de arrecadação, estimada pela Secretaria da Fazenda em R$ 4 bilhões por ano.
De certa forma, o veto já era esperado, em vista das declarações do próprio governador quando assumiu o mandato. Agora, o PL 511/2020 retorna para a Assembleia, que terá 30 dias para deliberar, a contar do recebimento da motivação do veto. A derrubada do veto depende de aprovação da maioria absoluta de seus membros, conforme o art. 28, § 5º, da Constituição do Estado de São Paulo.
Independentemente das limitações orçamentárias que condicionam a redução do ITCMD e, portanto, justificariam o veto, a questão que se coloca é saber se faz sentido reduzir a alíquota do tributo na forma pretendida pela proposta legislativa. E mais, se haveria justificativa razoável para efetuar uma diferenciação entre a alíquota do tributo que incide na transmissão causa mortis e aquela que incide sobre as doações. 
O ITCMD, tributo de competência dos estados, incide tanto na transmissão de bens e direitos causa mortis como na doação, nos termos do art. 155, I, “a”, da Constituição. Cabe ao Senado fixar as alíquotas máximas do tributo em conformidade com o art. 155, §1º, IV, da Constituição. Por meio da Resolução 9, de 5 de maio de 1992, o Senado fixou a alíquota máxima do ITCMD em 8%, estabelecendo ainda que o imposto poderia ter alíquota progressiva.
Vários estados possuem alíquotas aquém do limite de 8% estabelecido pelo Senado, mas nenhum em patamares tão baixos como aqueles previstos no PL 511/2020. O estado com a menor alíquota de ITCMD – ressalvadas as hipóteses de alíquota progressiva em que a alíquota inicial é menor, mas a alíquota marginal é superior – é o Amazonas, com alíquota fixa de 2%, tanto na hipótese de doação como herança. 
Na verdade, o que se percebe nos últimos anos é o fenômeno inverso do pretendido na referida proposta. Nota-se uma tendência de aumento das alíquotas do ITCMD, com cada vez mais estados estabelecendo alíquotas progressivas que chegam a 8%, a depender do valor recebido em razão de doação ou herança. É o caso, por exemplo, do Ceará e do Rio de Janeiro. São Paulo, entretanto, não seguiu a mesma linha, permanecendo com a alíquota fixa de 4%.
Assim, seria de se cogitar se o PL 511, que prevê a redução do ITCMD de 4% para 0,5% no caso de doações e 1% em heranças, não estaria indo na contramão, sobretudo em um contexto de perda de arrecadação dos estados com as recentes mudanças no ICMS. Ainda, seria de se perguntar se faria sentido reduzir a alíquota do ITCMD, de forma definitiva, a pretexto de amenizar os efeitos da crise econômica decorrente da pandemia, que seriam temporários.
Outro importante ponto para reflexão diz respeito à opção do legislador paulista em estabelecer uma diferenciação de alíquota de ITCMD aplicável para a transmissão por doação em relação àquela que incide na transmissão causa mortis. É verdade que alguns estados praticam alíquotas diferenciadas para doações e heranças. Alagoas, por exemplo, prevê a alíquota de 4% para heranças e apenas 2% para doações. Mas será que faz sentido?
Cogita-se que a fixação de uma alíquota menor para as doações teria o propósito de incentivar a filantropia, estimulando as doações para entidades vinculadas à promoção da cultura, meio ambiente etc. No entanto, o estímulo à filantropia pode se dar tanto por meio de doações em vida a entidades com essas finalidades como em virtude de disposições testamentárias. Além disso, não são raras as hipóteses de isenção para as doações efetuadas a essas entidades.   
Em realidade, a previsão de alíquotas diferenciadas para as hipóteses de transmissão de bens e direitos por doação e herança configura a adoção de uma política tributária equivocada e disfuncional. Tal distinção estimula que os contribuintes efetuem um “planejamento tributário” banal, fazendo doações em vida com o objetivo único e exclusivo de pagar menos tributo na transferência de seu patrimônio para seus herdeiros.  
A Assembleia Legislativa de São Paulo ainda irá deliberar sobre o veto ao PL 511/2020, podendo eventualmente derrubá-lo. É preciso que, quando de sua apreciação, os deputados reflitam sobre se a proposta de redução do ITCMD para patamares inferiores àqueles estabelecidos pelos demais estados, com a fixação de alíquotas diferenciadas do imposto para doações e heranças, seria a melhor política tributária.

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JOTA

Faz sentido reduzir a alíquota, indo na contramão de outros estados num contexto de perda de arrecadação com o ICMS?

Redução do ITCMD em SP: derrubada do veto ao PL 511 seria acertada?

Faz sentido reduzir a alíquota do ITCMD em São Paulo, indo na contramão de outros estados num contexto de perda de arrecadação com o ICMS?