Wallace Corbo

Paula Flanzer

<a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/quem-faz-a-cabeca-dos-futuros-juristas-27052022">Em artigo anterior</a>, apresentamos os dados preliminares do levantamento em que buscamos identificar o perfil dos nomes indicados em bibliografias básicas oficiais de cursos de direito no Brasil. Aqueles dados consideravam as ementas oficiais de disciplinas obrigatórias relacionadas a direito civil, direito penal e direito constitucional, conforme disponibilizadas nos sites de cada faculdade.
Razões práticas poderiam apontar que o resultado não seria um retrato fidedigno; afinal, professores e professoras muitas vezes vão modificar ou mesmo ignorar as ementas oficiais das disciplinas, em favor de suas próprias escolhas e preferências teóricas.
Este artigo complementa o primeiro, então, com os dados colhidos a partir do contato direto com docentes que ministram as mencionadas disciplinas nas faculdades da FGV Rio, FGV São Paulo, UERJ, UFRJ, USP e UFMG. De um total de 164 professores contactados, obtivemos respostas de apenas 56, sendo que 26 encaminharam suas bibliografias recomendadas. Apesar do espaço amostral reduzido, algumas conclusões preliminares se destacam.
Foi possível identificar 350 diferentes nomes indicados nas bibliografias analisadas. Desses, 36 não possuem dados disponíveis nas redes para que seja possível determinar com segurança sua identidade racial. Entre os demais, 238 são homens brancos (75,8%), 58 mulheres brancas (18,4%), 9 homens negros (2,9%) e 9 mulheres negras (2,9%).
Uma clara divergência entre os perfis identificados nas bibliografias oficiais e nas bibliografias efetivamente praticadas diz respeito à presença feminina. Mulheres são mais indicadas nas bibliografias efetivamente adotadas por docentes, tanto em números absolutos (67 nessas, em comparação com 32 nomes nas ementas oficiais) quanto proporcionalmente (21,3% contra 12,9%). Mulheres negras, especificamente, triplicam a sua aparição, passando de 3 indicações anteriormente para 9 nesse novo recorte. Por outro lado, a citação de homens negros permanece estável em números absolutos, o que implica redução na sua presença proporcional considerando as ementas efetivamente praticadas, em comparação com as oficiais (2,9% contra 3,6% respectivamente).
No recorte por disciplina, direito penal segue apresentando números que indicam conservadorismo na indicação de nomes − e consequente homogeneidade nos perfis de autores referenciados. Em números absolutos, há menos autores referenciados em geral (48), aproximando as bibliografias efetivas das oficiais. Entre os nomes referenciados, mais de 60% são homens brancos (31), 18,75% são mulheres brancas (9), e coincide o número de homens negros (4) e mulheres negras (4).
No direito civil, com uma lista de 159 nomes indicados nas bibliografias efetivas, a desproporção entre nomes femininos e masculinos é também esmagadora. São quatro homens indicados para cada mulher referenciada. Do universo total de autores, apenas 3 são negros (1 homem e 2 mulheres).
No direito constitucional, com 107 autores identificados, a desproporção se repete. São referenciadas três vezes mais mulheres brancas (21) do que homens negros e mulheres negras somados (7, sendo 4 homens e 3 mulheres). O número de homens brancos referenciados (79 nomes), por sua vez, é quase quatro vezes maior que o de mulheres brancas e mais de 11 vezes maior que o de homens negros e mulheres negras somados.
Enquanto seguimos montando este quebra-cabeça, fica cada vez mais evidente que – não importa o recorte que se faça – a homogeneidade de vozes parece ser ainda uma marca do ensino jurídico contemporâneo. Algumas perguntas importantes seguem em aberto. Por exemplo: a homogeneidade na bibliografia reflete uma homogeneidade no corpo docente? Afinal, textos iguais podem ser trabalhados de maneira diversa por professores e professoras com perfis diversos. Quais são as consequências gerais, para o sistema jurídico, provocadas pela ausência de pluralismo nas vozes que fazem a cabeça dos estudantes de direito? E para cada uma dessas áreas, há preocupações específicas? Essas são algumas das perguntas que deveremos responder mais adiante.

diversidade

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Uma bibliografia homogênea tanto no registro oficial quanto no mundo real

Quem faz a cabeça dos futuros juristas? &#8211; parte 2

Quem faz a cabeça dos futuros juristas? - parte 2

Quem faz a cabeça dos futuros juristas? Uma bibliografia homogênea tanto no registro oficial quanto no mundo real