Manoella Keunecke

Hoje, sexta-feira, é dia de mais um capítulo do projeto “Dúvida Trabalhista? Pergunte ao Professor!” dedicado a responder às perguntas dos leitores do JOTA, sob a coordenação acadêmica do professor de Direito do Trabalho e mestre nas Relações Trabalhistas e Sindicais, dr. Ricardo Calcini.
O projeto tem periodicidade quinzenal, cujas publicações são veiculadas sempre às sextas-feiras. E a você leitor que deseja ter acesso completo às dúvidas respondidas até aqui pelos professores, basta acessar o portal com a  <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/pergunte-ao-professor" target="_blank" rel="noopener noreferrer">#pergunte ao professor</a>.
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>Neste episódio de nº 66 da série, a dúvida a ser respondida é a seguinte:
Pergunta ► Quais são os impactos, na seara processual trabalhista, da recente decisão do STF que afastou a responsabilidade solidária empresarial na fase executiva?
Resposta ► Com a palavra, a professora Manoella Keunecke.
A pergunta demanda uma resposta, inicialmente, direta: a decisão monocrática do ministro relator Gilmar Mendes, no Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.160.361/SP, recaiu sobre uma questão prejudicial, mas não resolveu o mérito da matéria objeto do recurso – a violação aos incisos LV, LIV, XXXV e II do artigo 5º da Constituição Federal em se responsabilizar empresa de suposto grupo econômico em fase de execução, sem que essa constasse no título executivo judicial.
Em realidade, que ficou decidido pelo ministro relator, como questão prejudicial, foi a cassação da decisão denegatória de seguimento do Recurso de Revista da 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho para que outra seja, então, proferida; desta vez, com observância aos conhecidos artigo 97 da CF e Súmula Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal, e em consideração à análise de constitucionalidade sobre o §5º do artigo 513 do CPC/2015, que dispõe: “§5º O cumprimento da sentença não poderá ser promovido em face do fiador, do coobrigado ou do corresponsável que não tiver participado da fase de conhecimento.”.
É que, para o ministro Gilmar Mendes, quando a 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho não aplicou o §5º do artigo 513 ao processo trabalhista, pelo filtro do artigo 15 do CPC, estava, na verdade, declarando sua inconstitucionalidade de forma implícita, o que atrairia a incidência do artigo 97 da Constituição Federal.
A partir desta premissa, não seria da 4ª Turma, mas do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho a competência para julgar, incidentalmente, a declaração de inconstitucionalidade do §5º do artigo 513 do CPC (inciso IX do artigo 75 e artigo 257 do RITST).
<blockquote class="jota-article__eye">Daí que o ministro relator compreendeu a existência de erro de procedimento e determinou que seja realizada nova análise da questão através de incidente ou arguição de inconstitucionalidade pelo Tribunal Superior do Trabalho.</blockquote>
Não é possível, portanto, afirmar que a decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes produziu efeitos em outros processos trabalhistas ou que tenha definido tese quanto à inconstitucionalidade da responsabilização solidária de empresas de grupo econômico diretamente em execução trabalhista, embora seja este o assunto principal do recurso a ser, futuramente, apreciado pelo Supremo Tribunal Federal. Sobre o mérito, portanto, todos terão que aguardar o desfecho.
A despeito de o trâmite recursal do caso em análise não ser infenso a críticas e permitir alguns questionamentos – como a possível ausência de prequestionamento sobre a violação ao artigo 97 da CF/88 e à Súmula Vinculante nº 10 do STF, a inobservância dos temas nºs 181 e 660 do próprio STF e a omissão acerca dos artigos 769 e 889 da CLT e do artigo 4º da Lei de Execuções Fiscais – é inegável que a decisão do ministro Gilmar Mendes tem, em certa medida, impacto imediato na prática da advocacia trabalhista e nas estratégias processuais das partes.
Diante da possibilidade concreta de o Supremo Tribunal Federal compreender a responsabilização de empresa de suposto grupo econômico diretamente em fase de execução como violadora das importantes garantias constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal – seja neste Recurso Extraordinário em análise, seja na ADPF nº 488 –, é certo que, para as ações a serem ainda propostas e para aquelas já propostas em que ainda não houve citação válida ou audiência inicial, haverá um importante incentivo aos autores e a seus advogados para que incluam estas empresas como rés desde o início do processo de conhecimento, fazendo-as constar no título executivo judicial.
Se o objetivo dos autores é mesmo aumentar a garantia patrimonial e, portanto, resguardar a futura efetividade da tutela jurisdicional prestada em processo de conhecimento, alegar e instruir a ocorrência de grupo econômico entre diferentes empresas em amplo contraditório, em cognição plena e, possivelmente, exauriente, sem exigência da prestação de garantia de juízo, é estratégia que equaciona os interesses dos autores às garantias processuais dos réus.
São favorecidos os autores, que conseguem exercer o ônus probatório sobre a ocorrência de grupo econômico em ampla dilação probatória no processo de conhecimento e podem, ao final, obter título executivo judicial desfavorável às empresas do grupo econômico reconhecido, acelerando a fase de execução e evitando preclusão, caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal seja mesmo de ressuscitar a antiga Súmula 205 do TST.
São, também, favorecidos os réus, que podem debater em contraditório aspectos processuais e materiais de todas as pretensões deduzidas na petição inicial, e não somente a pretensão de responsabilização por ocorrência de grupo econômico, tal qual ocorre quando o contraditório é exercido em execução trabalhista após a formação do título executivo judicial.
O momento e a extensão do exercício do contraditório são relevantes por legitimarem, propriamente, a tutela jurisdicional e, portanto, o título executivo judicial.
Não é sem razão, assim, que o §5º do artigo 315 do CPC preveja que os corresponsáveis nele constem e, claro, as empresas do grupo econômico nele se encaixam por serem corresponsáveis (“[...] serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.” – trecho final do §2º do artigo 2º da CLT).
Isso tudo especialmente em consideração que, quando reconhecida a responsabilização por grupo econômico apenas em execução trabalhista, alguns tribunais exigem dos executados a garantia do juízo para que possam se defender por oposição de embargos à execução (TRT 1ª Região, AP 0100482-24.2017.5.01.0222, rel. Jorge Orlando Sereno Ramos, 5ª Turma, publicação em 11/08/2021).
É bem possível que, havendo improcedência da pretensão de responsabilização solidária pela teoria do empregador único, os autores tenham que responder patrimonialmente pelos honorários advocatícios de sucumbência; contudo, este risco será só mais um elemento de desincentivo que precisarão avaliar no momento da propositura da ação judicial, dentre tantos outros que serão sopesados. Atentos aos riscos e ao inciso III do artigo 381 do CPC, os autores terão a ação de produção antecipada de provas como um importante instrumento estratégico.
Por outro lado, para os advogados que patrocinam as defesas destas empresas responsabilizadas em execução trabalhista por, supostamente, pertencerem a grupo econômico, a decisão do ministro Gilmar Mendes confere importante incentivo para que passem a argumentar a violação das garantias processuais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, a aplicação do §5º do artigo 513 do CPC ao processo trabalhista e, em sede recursal, insistam na observância da competência e quórum especiais da cláusula de reserva de plenário (artigo 97 da CF/88 e Súmula Vinculante 10 do STF), nos termos da decisão monocrática do Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.160.361/SP.
Em alguns Tribunais Regionais do Trabalho, a advocacia patronal, ainda, poderá ter sucesso ao pretender que a pretensão de responsabilização por configuração de grupo econômico seja veiculada em incidente na execução, tal qual o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (TRT 18ª Região, AP 0010186-28.2019.5.18.0281, rel. Eugenio Jose Cesario Rosa, 2ª Turma, publicado em 23/07/2020).
Para os advogados mais atentos e, também, por iniciativa do Ministério Público do Trabalho, da Defensoria Pública, de juízes ou de desembargadores de Tribunais Regionais do Trabalho, cujas jurisdições apresentem multiplicidade de processos sobre a controvérsia e decisões antagônicas, a aplicação do §5º do artigo 513 do CPC ao processo trabalhista poderia ser, propriamente, objeto de instauração de incidente de resolução de demandas repetitivas.
A matéria da tese porventura fixada no incidente, possivelmente acabaria por ser devolvida ao Tribunal Superior do Trabalho, que poderia, então, enfrentar o assunto com enfoque no diálogo das fontes processuais, a partir da redação modificada do §2º do artigo 2º da CLT e, talvez, em consideração a novos argumentos, antes não apreciados pelo Corte, e capazes de influenciar na tese jurídica.
Não é, mesmo, momento para conformismo e a decisão do ministro Gilmar Mendes pode, ao menos, servir de combustível para novas e criativas teses e estratégias processuais.
Por fim, não passa desapercebido que a decisão monocrática proferida no Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.160.361/SP incitará, também, a criação de novas teses acerca do diálogo das fontes processuais. Embora, haja substancial espaço para discordância acadêmica, a posição do ministro Gilmar Mendes permite supor a incidência automática de normas do Código de Processo Civil quando não houver, sobre a matéria, normas processuais na Consolidação das Leis Trabalhistas ou na legislação processual trabalhista esparsa.
Assim, devendo haver incidência de alguma norma processual do CPC, a sua não aplicação por heterointegração somente poderia ocorrer no caso de inconstitucionalidade declarada.
Deste raciocínio, extrai-se, portanto, um pressuposto de compatibilidade apriorística na aplicação das normas processuais civis ao processo do trabalho, sendo necessário que somente se investigue a ausência de tratamento sobre a matéria processual para se definir a heterointegração normativa.
O raciocínio é arrojado e, como dito, não é infenso a críticas – especialmente por não enfrentar o artigo 769 da CLT e as peculiaridades do processo trabalhista – mas não pode ser menosprezado, contudo. É preciso que se acompanhe os desdobramentos decorrentes do Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.160.361/SP.

carteira de trabalho

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JOTA

Ministro Gilmar Mendes compreendeu a existência de erro de procedimento e determinou nova análise da questão

Quais os impactos da decisão do STF sobre afastamento da responsabilidade executiva?

Ministro Gilmar Mendes compreendeu a existência de erro de procedimento e determinou nova análise da questão