Bárbara Helena Breda

Maria Júlia Abdala

Ao longo das últimas décadas, a aliança entre Brasil e agronegócio vem se desenvolvendo de maneira exponencial. Hoje, a nossa herança produtiva leva o país a se consolidar como um dos principais produtores de alimentos, fibras e bioenergia do mundo. Responsável por 26,6% do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/pib">Produto Interno Bruto</a> (PIB) brasileiro, o agronegócio corresponde a mais de 20% dos empregos do país e mantém o saldo positivo da balança comercial nacional. Com exportações que chegam a todos os continentes, temos a capacidade de alimentar 1,5 bilhão de pessoas ao redor do mundo. 
O crescimento e o dinamismo que têm assumido o setor não se veem livres, porém, dos problemas públicos e da consequente necessidade de políticas públicas eficientes. Anterior à análise do tema no setor, é a necessária diferenciação de problema público e política pública. Enquanto o primeiro refere-se à diferença entre a realidade pretendida e a verificada (a barreira entre a expectativa de um cenário ideal e a realidade), o segundo é o percurso a ser seguido pelo Estado para a resolução desse problema, que deve ser trilhado com base em leis e programas do Estado[1]. Frente a grande importância que tais políticas assumem no alcance dos objetivos sociais, foi desenvolvida a ciência da política pública, que vem aperfeiçoando um vasto material científico para a análise de políticas e intervenção social, sistematizando o processo decisório estatal. 
Como era de se esperar, uma vez que a realidade social difere, substancialmente, em cada nação, às políticas públicas atribuem-se características regionais próprias. De modo geral, especificamente no tema que nos atinge, a atividade agrícola (aqui, em sentido amplo, portanto, agricultura, pecuária, pesca, aquicultura e de reflorestamento), os governos lhe dedicam mais atenção devido à segurança alimentar e riscos que lhe são específicos. Países em desenvolvimento têm demanda estatal diferenciada, reclamando governo coeso e em condições de articular ações para a alteração de estruturas que reproduzem atraso e desigualdade. Ao governo, recai a incumbência de planejar suas ações de forma estratégica e em prazo curto o suficiente, permitindo que não se perca a credibilidade no processo e, ainda, garantindo que os objetivos de longo prazo buscados sejam atingidos[2].
As políticas públicas, em outras palavras, são o meio pelo qual o Direito Econômico é aplicado – seguindo os limites traçados e bem delineados pela ordem constitucional, aqui, brasileira – afetando a existência e o funcionamento dos mercados, buscando a superação de seus limites operativos e estruturais, clamando por regras definidas como instrumento de superação de falhas de mercado[3] que, vale dizer, assume duas modalidades no agronegócio hoje: 1) agroalimentar, conjunto de atividades que concorrem à produção, transformação e distribuição de produtos alimentares, com o consequente cumprimento da função alimentar; e 2) agroindustrial, conjunto de atividades que concorrem à geração de produtos oriundos das cadeias agroindustriais não destinados à alimentação, como os sistemas energético, madeireiro, de couro e calçados, papel e têxtil, por exemplo[4].
O apresentado, ainda que possa parecer, em um primeiro momento, um simples introito, já corresponde à política agrícola. Isso porque, ainda que venhamos a dar nome distinto, uma política agrícola nada mais é do que uma política pública direcionada ao setor. Ressaltamos, porém, que qualquer simplicidade atinente ao tema a isso se limita. Sendo o agronegócio setor econômico que permeia atividades que envolvem, tradicional e indissociavelmente, riscos inerentes e que, mais do que isso, se vinculam diretamente à nutrição e segurança alimentar mundial, é obrigatória maior cautela estatal quando da elaboração de políticas direcionadas. 
A busca pelo desenvolvimento do setor fez com que a política agrícola fosse mais bem traçada pelo legislador infraconstitucional com a criação da Lei n. 8.171/1991 que, entre seus fundamentos, dispõe sobre objetivos e competências institucionais, prevendo fontes de recursos e estabelecendo ações e instrumentos para a efetivação da política nacional (especialmente, em seu artigo 4º). Visando promover a descentralização da execução dos serviços de apoio ao setor, busca a atuação complementar de Estados, Distrito Federal, Territórios e municípios, competindo-lhes adequar os diversos instrumentos disponíveis às suas necessidades e realidades.  
Enquanto empresa a céu aberto, o setor esbarra em produtos de extrema fragilidade e sensibilidade a diversos fatores externos e, muitas vezes, incontroláveis. É o caso das variações climáticas, das oscilações e rigidez das ofertas, da variabilidade de preços e dispersão da produção, da perecibilidade própria dos produtos cultivados e das doenças e pragas. Considerando isso, ao Estado caberá atuar, de maneira indireta[5], fiscalizando, incentivando e planejando as atividades, por meio do estabelecimento de diretrizes e bases vocacionadas a uma produção que cumpra os 3S: saúde, sanidade e sustentabilidade. 
Nesse cenário, fiscalizar significa analisar a efetividade das normas produzidas e as medidas escolhidas pelo Estado para regular a atividade econômica, sob a égide do princípio da legalidade. Incentivar, por sua vez, aponta à análise do uso de instrumentos de intervenção em consonância com as leis que regem o funcionamento dos mercados, as quais capazes de induzir os destinatários à adoção de uma opção econômica de interesse coletivo e social. Por fim, planejar, qualifica a intervenção do Estado sob o domínio econômico, visando seu exercício mais racional o que, porém, não se constitui na própria intervenção, mas sim, na preparação a que essa ocorra. 
Ainda que a temática pareça distante da realidade dos muitos agentes do setor, essa é mais presente do que imaginado. Isso porque, anualmente o agronegócio aguarda, ansiosamente, a apresentação do Plano Safra. Principal mecanismo de planejamento da política agrícola nacional, ditando não apenas o direcionamento dos recursos públicos, como também versando sobre a alocação do montante a subsetores ou a agentes específicos, funciona como uma diretriz da atuação do poder público no agronegócio brasileiro da segunda metade de um ano, até o primeiro semestre do seguinte. Seu olhar é voltado para pequenos e médios produtores e sua principal função é a destinação dos recursos públicos em subníveis para que seja convertido em manutenção e modernização do setor. É necessário que esse planejamento esteja de encontro com as expectativas dos mercados agrícolas nacional e internacional, fazendo com que o potencial do agronegócio brasileiro seja alavancado a curtos e médios prazos.  
Ainda que o Plano tenha obtido grande êxito no exercício de suas funções em um horizonte mais recente, especialmente no que concerne ao direcionamento de recursos, observa-se que o crescimento do agronegócio brasileiro é significativamente superior aos níveis de apoio ofertados, restando claro a incapacidade de cobertura total pelo governo, da crescente necessidade do pujante setor da economia.  
Uma vez que se estabelecem as diretrizes da política agrícola, é necessário que se tenha um acompanhamento de sua execução. Por esse motivo, foi instituído o Conselho Nacional de Política Agrícola (CNPA), que atua juntamente com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), para orientar a elaboração de Plano Safra anual e plurianual, propor ajustes ou alterações na política agrícola e manter sistema de análise e informações no tocante à conjuntura econômico-social da atividade agrícola.  
Apesar dos bons resultados obtidos pelo setor nos últimos anos, importante é que as políticas públicas direcionadas sejam capazes de acompanhar as mudanças que, em muito, superam o setor e que culminam em diversas complexidades aos produtores que precisarão se adaptar a novos ambientes. É, assim, 1) a redução do preço real dos produtos agrícolas, com consequente achatamento das margens de ganhos; 2) o aumento do valor adicionado nos estágios pós-porteira do sistema agroindustrial com a busca por alimentos processados e de rápido preparo; e 3) os desafios de acesso a mercados ocasionados por barreiras de entradas cada vez maiores e em muito relacionadas a uma intensificação do uso de tecnologias. 
Por fim, tomando por base a análise de transformação do sistema alimentar no mundo e suas implicações ao produtor rural, observamos ser necessária política que objetive sua inserção em um contexto de sistemas globais. Além de uma política afinada com as necessidades do mercado, necessário promover a unificação de todas as diversas e esparsas iniciativas, centralizadas no MAPA, aproximando e integrando todos os conceitos na convergência de um único interesse comum: o desenvolvimento do agronegócio brasileiro. 
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[1] SECCHI, Leonardo. Análise de Políticas Públicas: diagnóstico de problemas, recomendação de soluções. São Paulo: Cengage Learning, 2021. 
[2] BUCCI, Maria Paula Dallari. Fundamentos para uma Teoria Jurídica das Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2 ed., 2021. 
[3] De maneira simplificada, espaços que permitem a conexão e a transação entre seus integrantes, compostos por diversos compradores e vendedores que interagem, por meio de negociações (analisando preço, quantidade e qualidade de produtos), buscando como resultado ter suas necessidades sanadas. 
[4] BURANELLO, Renato. Cédula de Produto Rural: mercados agrícolas e financiamento da produção. Londrina/PR: Editora Thoth, 2021. 
[5] A Constituição Federal disciplina a intervenção econômica do Estado como uma hipótese excepcional e estritamente vinculada: a intervenção direta apenas será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo. A intervenção indireta, por sua vez, qualifica o Estado como um agente normativo e regulador, absorvendo atuações que visem corrigir falhas de mercado, através da fiscalização, do incentivo ou do planejamento.

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JOTA

Crescimento e dinamismo do setor não o livra dos problemas públicos e da necessidade de políticas públicas eficientes

Políticas públicas direcionadas: uma análise no agronegócio brasileiro

É necessário promover a unificação das iniciativas integrando os conceitos na convergência do desenvolvimento do agronegócio