Elisa Cruz

A obesidade infantil tem se tornado um tema de preocupação nacional e internacional. Dados do <a href="http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/dados_atlas_obesidade.pdf">Atlas Mundial da Obesidade</a> colocam o Brasil em 5º lugar em um ranking de países com o maior número de crianças e adolescentes com obesidade.
Na publicação do <a href="https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf">Plano Nacional de Alimentação e Nutrição</a>, em 2013, já constava a advertência de que nos 20 anos anteriores “as prevalências de obesidade em crianças entre 5 a 9 anos foram multiplicadas por quatro entre os meninos (4,1% para 16,6%) e por praticamente cinco entre as meninas (2,4% para 11,8%). Nos adolescentes, após quatro décadas de aumento gradual nas prevalências, em torno de 20% apresentaram excesso de peso (com pequena diferença entre os sexos) e quase 6% dos adolescentes do sexo masculino e 4% do sexo feminino foram classificados como obesos".
Essa doença causa riscos à saúde física, emocional e social de crianças e adolescentes, tais como doenças respiratórias, ortopédicas, cardiológicas, depressão, disfunções alimentares etc.
Entre as principais causas da obesidade infantil, está o consumo de bebidas adoçadas e de alimentos ultraprocessados, cuja redução é um dos objetivos do plano nacional. Para atingir esse objetivo não é suficiente o estímulo individual de pais, mães e de crianças e adolescentes. É essencial a adoção de uma política pública que desincentive o consumo desses produtos.
Esse é o caminho pretendido pelo <a href="https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2314498">PL 239/2022</a>, que disciplina a propaganda e venda de produtos com alto teor de açúcar e alimentos ultraprocessados e pretende a aplicação de duas principais medidas: a advertência em propagandas e eventos televisionados sobre os riscos do consumo imoderado desses produtos, inclusão de advertência nas embalagens, advertência nos locais de venda e proibição de comercialização em instituições de ensino básico e locais de recreação infantil.
O projeto de lei utiliza algumas determinações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (<a href="https://www.jota.info/tributos-e-empresas/saude">Anvisa</a>) contidas na <a href="https://static.poder360.com.br/2022/01/Resolucao-rotulagem-nutricional-alimentos-embalados.pdf">RDC nº 429/2020</a> e na <a href="https://static.poder360.com.br/2022/01/Resolucao-rotulagem-nutricional-alimentos-embalados.pdf">IN nº 75/2020</a>, que a partir de outubro de 2022 já obrigaria fabricantes a incluírem nas embalagens informações sobre teor de açúcares, valor energético, gorduras e sódio.
O projeto de lei, contudo, vai além ao se inspirar na política de redução ao consumo de tabaco no Brasil e estabelece medidas adicionais àquelas previstas pela Anvisa.
Vale lembrar que o Programa Nacional de Controle do Tabagismo no Brasil, aprovado em 2003, reduziu o consumo de tabaco em aproximadamente 40% e colocou o Brasil como país de <a href="https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2019-07/oms-brasil-e-exemplo-para-o-mundo-no-combate-ao-tabagismo">referência</a> no combate ao tabagismo. Entre as medidas utilizadas nessa política, estão o controle do comércio ilícito de tabaco, a proibição de venda a menores de 18 anos de idade ou a sua comercialização por menores de 18 anos, medidas de proteção ao tabagismo passivo, controle da propaganda de tabaco e restrição de publicidade em eventos culturais e esportivos.
As medidas propostas pelo projeto de lei de regulação da propaganda e venda de alimentos com alto teor de açúcar e alimentos ultraprocessados vai nesse mesmo caminho e institui medidas concretas de redução do consumo. Considerando o histórico da política antitabagista, é possível prever que serão conquistados bons resultados com a restrição na divulgação e venda dos alimentos.
Talvez um aspecto não observado pela lei e que mereceria ser incluído é a proibição de recursos chamativos nas embalagens e na publicidade, pois de acordo com pesquisa realizada em parceria pelo <a href="https://idec.org.br/noticia/pesquisa-revela-como-rotulos-influenciam-alimentacao-das-criancas">Idec e Unicef</a>, cores vibrantes, informações sobre sabor, brindes e personagens nas embalagens geram maior atratividade por crianças e aumentam o consumo dos alimentos e bebidas ultraprocessados.
No Brasil, em 2011, o <a href="https://www.saopaulo.sp.gov.br/ultimas-noticias/procon-sp-multa-mcdonald-s-por-publicidade-abusiva-do-mclanche-feliz/">Procon-SP</a> aplicou multa ao McDonald’s pela veiculação de brindes junto com kits de lanches. O órgão de regulação de direitos do consumidor considerou abusiva a estratégia de marketing da empresa por incentivar o consumo de ultraprocessados por crianças.
Há ainda caso julgado pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que advertiu a empresa Quatá Alimentos e Laticínios e o influenciador Luccas Neto pela publicidade de achocolatado cujos anúncios associavam o consumo do produto ao aumento de força da criança. Nesta representação, julgada em julho de 2021, o conselho determinou a alteração da publicidade para eliminar o “apelo imperativo de consumo”.
A ausência desses tópicos no projeto de lei pode ser suprida no processo legislativo, de modo que podemos considerar como positiva a propositura da lei.
A implementação de políticas de redução de bebidas açucaradas e alimentos ultraprocessados seria capaz de reverter a tendência de obesidade infantil, o que significaria reconduzir o país no caminho da proteção dos direitos da criança e do adolescente, que contam com especial proteção pelo art. 227 da Constituição e pelos arts. 3º e 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

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JOTA

Projeto disciplina propaganda e venda de produtos com alto teor de açúcar e alimentos ultraprocessados

PL 239/2022: atuação legislativa contra a obesidade infantil

PL disciplina propaganda e venda de produtos com alto teor de açúcar e alimentos ultraprocessados e é avanço contra obesidade infantil