Glaucia Lauletta Frascino

Na última semana, foi anunciada a inclusão na pauta virtual do Plenário do <a href="https://www.jota.info/stf">Supremo Tribunal Federal</a> do tema 372, cujo julgamento ocorrerá entre 9 e 16 de dezembro. Quase que concomitantemente a essa divulgação, começaram a surgir declarações por parte das autoridades fiscais, via imprensa, no sentido de divulgar a suposta contingência envolvida – fala-se em R$ 115,2 bilhões – e alardear os efeitos que uma decisão pró-contribuinte traria aos cofres públicos.
Talvez os desavisados pudessem se sensibilizar com referidas manifestações, afinal, como decidir em favor de instituições financeiras – os processos específicos também envolvem bancos –, em detrimento do erário público, justamente em um momento em que o país encontra tamanha dificuldade para fechar suas contas?
Em primeiro lugar, é importante destacar que os alegados R$ 115,2 bilhões, que constam da Lei de Diretrizes Orçamentárias – <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/lei-de-diretrizes-orcamentarias">LDO</a>, estão superestimados. O próprio texto de introdução da LDO traz que a estimativa dos valores apresentados – dessa e de outras discussões ainda em curso no Judiciário – “representa o máximo de impacto ao erário, que pode não se concretizar em sua totalidade”. Leia-se: as próprias autoridades reconhecem a imprecisão dos números que apresentam até porque se baseiam exclusivamente em informações fornecidas pela Receita Federal do Brasil (RFB) e levam em consideração, na maioria dos casos, a perda total de arrecadação anual e uma estimativa de impacto de devolução, considerando os últimos cinco anos.
Mas não é só. Aqueles que acompanham a discussão desde o início certamente compreenderão que os argumentos utilizados pela União são questionáveis, para dizer o mínimo, pois é justamente ela, a União, a principal responsável pelo crescimento contínuo dos valores controversos (ainda que, como dito, estejam aquém dos alegados R$ 115,2 bilhões).
Realmente, em 10 de outubro de 2013, foi publicada a Lei nº 12.865, que trouxe o chamado “Refis dos bancos”, permitindo que os valores relativos à Contribuição ao <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/pis">PIS</a> e à <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/cofins">COFINS</a>, objeto da discussão judicial acima mencionada, fossem recolhidos sem a incidência de juros e multa, desde que os contribuintes desistissem dos respectivos processos.
Muitas das instituições financeiras que litigavam em Juízo, entre as quais alguns dos principais bancos do país, aderiram ao benefício e renunciaram às suas ações. Como consequência, os montantes que remanescem em discussão são muito inferiores aos valores divulgados como ainda controversos.
Há outro fato que merece nossa atenção. Assistimos, mais uma vez, às queixas da União, preocupada com eventual sangria aos cofres públicos, quando, na verdade, os valores só cresceram, em função da sua desídia. Explico: as receitas que não correspondem ao resultado da prestação de serviços e/ou da circulação de mercadorias não poderiam ser tributadas entre 1999 e 2014 porque, à época, inexistia lei que autorizasse tal exigência, conforme reconhecido pelo próprio STF.
Isso porque a Lei nº 9.718/98, que pretendeu ampliar a base de incidência do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/piscofins">PIS/COFINS</a> para a totalidade das receitas, foi publicada anteriormente à Emenda Constitucional nº 20/98, justamente a norma que atribuiu à União competência para tributar o total de receitas aferidas. Antes dela, somente o faturamento – definido como o resultado da prestação de serviços, da circulação de mercadorias ou da combinação de ambas – se encontrava no âmbito de tributação da União. O Supremo Tribunal Federal, reitere-se, reconheceu a inconstitucionalidade da ampliação das bases de cálculo, pela Lei nº 9.718/98, anteriormente à Emenda Constitucional nº 20/98.
Diante desse claríssimo sinal, tivesse a União se atentado aos princípios constitucionais que regem o direito tributário e às orientações do STF em casos semelhantes, teria editado uma nova lei ordinária, pós EC nº 20/98, prevendo tal exigência. Se assim tivesse feito, sequer estaríamos tratando do tema cerca de vinte anos depois.
Ocorre que a publicação de lei posterior, embora uma alternativa lógica e juridicamente adequada da qual dispunha a União, significaria o reconhecimento da impossibilidade da exigência dos tributos até então, sobre fatos geradores passados, algo que em nada interessava às nossas autoridades. Com o passar dos anos, os valores foram se acumulando, sem que solução juridicamente possível viesse a ser implementada.
Somente quando constatou a adesão “em massa” ao “Refis dos bancos”, antecedida pela desistência dos respectivos processos, é que a União decidiu editar a <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12973.htm">Lei nº 12.973/2014</a> que, finalmente, alterou o conceito de receita bruta, para nele incluir o resultado da atividade principal do contribuinte.
Como se vê, mais uma vez, a União se utiliza da própria torpeza para trazer à tona argumentos meramente econômicos, não jurídicos, que supostamente sensibilizariam julgadores e a própria sociedade civil.
De acordo com a Constituição, entretanto, não há como prevalecer a exigência dos PIS/COFINS, anteriormente à edição da Lei nº 12.973/2014, sobre valores que não correspondam à prestação de serviços e/ou à circulação de mercadorias.
Que o país enfrenta dificuldades orçamentárias, que necessitamos de um sistema tributário mais claro e justo, que almejamos o crescimento e a criação de empregos, afastando-se os óbices que os tributos representam, e que o novo governo enfrentará enormes desafios todos nós sabemos. 
Porém, absolutamente nada justifica que a Constituição seja deixada de lado porque a União optou por seguir o caminho errado, quando poderia ter seguido o certo. O direito constitucional do contribuinte, seja ele quem for, não pode ser ignorado ou deixar de ser reconhecido. A balança não pode ter pesos e medidas distintos a depender de quem pleiteia o reconhecimento do seu direito. Hoje, o contribuinte que litiga é um banco; amanhã, o litigante pode ser qualquer um de nós.

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JOTA

Os pesos e as medidas têm que ser um só: o que determina a Constituição

PIS/COFINS das instituições financeiras em pauta no STF

Os pesos e as medidas das instituições financeiras a respeito do PIS/COFINS têm que ser um só: o que determina a Constituição.