José Reinaldo Guimarães Carneiro

<p>Nos últimos dez dias fomos tomados por um debate inusitado. As coisas foram rápidas, na proposta de modificação do controle sobre Promotores e Procuradores: a tramitação da PEC 05/21, trazendo modificações na composição e atividade do CNMP.</p>
<p>Quando mal havíamos digerido as mudanças propostas sobre a lei da improbidade, o tema passou a ser diferente. Por que não aumentar o controle sobre Procuradores e Promotores? Compreende-se a boa intenção por trás da modernização das instituições. De todas, é evidente. O Ministério Público não se coloca à margem da necessidade. Porém, há perigos ocultos na pretensão traduzida na PEC 05.</p>
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<p>É preciso refletir sobre eles. Sou promotor há trinta e três anos. Vi a modernização do processo penal das últimas três décadas. Começando pela própria Constituição, em 1988, um marco histórico em favor do nosso povo. Vi a chegada da mencionada lei de improbidade (1993), que permitiu o enfrentamento competente  do gestor público corrompido. Vi, também, o surgimento da primeira lei do crime organizado (1995), com ferramentas de excelência para o enfrentamento da corrupção. Hoje, ao menos desde 1998, temos instrumento poderoso para combater a lavagem de capitais, que antes sequer existia no país.</p>
<p>Em 2013, tivemos consolidada a modernização de enfrentamento às organizações criminosas e a possibilidade de, com ela, infiltrar agentes do estado nos focos das corporações destruídas pela corrupção. Embora não seja uma novidade, porque já constava da legislação especial anterior, fortalecemos os mecanismos de delação premiada, viabilizando acordos de repatriação de dinheiro desviado da população brasileira. Milhões de reais, em recursos públicos desviados, vêm sendo sistematicamente recuperados em seguidas operações realizadas pelo Ministério Público e pelas polícias, no país inteiro.</p>
<p>A PEC 05, que pretende aumentar o controle de políticos sobre Promotores, viabiliza, a pretexto de minguar iniciativas corporativas, o aniquilamento dessas conquistas do direito penal moderno. Se ela prosperar, nos termos propostos, em última análise Promotores serão julgados pela sua iniciativa contra a corrupção. Não por omissão no seu enfrentamento. Serão punidos pela ousadia do poder de investigação. Não pelo silêncio obsequioso e servil.</p>
<p>No fundo, está em jogo, mais uma vez, o poder de investigação (em inquéritos civis e criminais). A PEC, como gestada, atingirá de morte a grande conquista do povo brasileiro, consolidada pelo STF ao menos desde 2014, traduzida na prerrogativa de ver escândalos investigados e punidos. Que o leitor não se engane. Ninguém está minimamente preocupado com o “ranço corporativo” da Instituição do Ministério Público. Nada disso. O foco é outro muito diferente. Querem o aniquilamento completo das conquistas da população nas últimas três décadas de avanço do direito penal. Os da presente reflexão são apenas exemplos.</p>
<p>Querem um Ministério Público dócil, afável, domesticado, controlado pela caneta de governadores e presidente da república. De preferência, um que se preocupe exclusivamente com a escalada de delitos patrimoniais sem repercussão (o furto e as pequenas apropriações, por exemplo), de pequeno ou nenhum potencial ofensivo.</p>
<p>Querem Promotores dominados pelo temor de olhar de cara feia para o político responsável por desvios de recursos públicos. Aniquilados pela minimização de garantias constitucionais construídas para a defesa da população. Subjugados pela força e pelo medo. Se vingar no Congresso, a PEC 05 será instrumento pronto para caçada voraz de Promotores responsáveis por iniciativas corajosas e independentes contra o crime. Contra a corrupção.</p>
<p>Contra o desmando na gestão de recursos públicos, que engrossam contas bancárias privadas e, na mesma proporção, faltam ao povo brasileiro, combalido na saúde, na educação e na expressão de uma vida digna. É só o que está em jogo na pretensa atualidade do debate. Não é que que não existam abusos e excessos praticados por Promotores. Há, como também há em todas as demais instituições humanas. Contra eles, entretanto, erros e abusos de membros do Ministério Público, já há mecanismos próprios e sérios, manejados pelo Poder Judiciário. Debatidos nos Tribunais.</p>
<p>Há décadas, são esgotados em centenas de milhares de recursos, aptos à correção daquilo que saiu do caminho. Para punição do malfeito. Não há a mínima necessidade de se sobrepor a eles, o controle fiscalizatório e punitivo de quem deveria ser, pelo contrário, fiscalizado. É a inversão da lógica. A subversão do bom senso. É verdade que as propostas de modificação do Ministério Público passaram a ser uma constante desde a emancipação da Instituição, em 1988. Porém – creia, prezado leitor – o fenômeno tem muito mais a ver com os acertos de seus integrantes. Não com seus erros.</p>
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Vamos conversar sobre o Ministério Público?

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JOTA

Propostas de modificação do MP têm muito mais a ver com os acertos de seus integrantes. Não com seus erros

Propostas de modificação do MP, como a PEC 05, têm muito mais a ver com os acertos de seus integrantes. Não com seus erros