Murilo Meneghetti Nassif

De constitucionalidade duvidosa, o artigo 55 da <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5764.htm" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Lei nº 5.764/71</a> estabeleceu que empregados de empresas eleitos diretores de sociedades cooperativas, formada pelos trabalhadores da empresa, gozarão da mesma garantia provisória de estabilidade de emprego assegurada aos dirigentes sindicais pela lei trabalhista (<a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm" target="_blank" rel="noopener noreferrer">art. 543 da CLT</a>).
Não é objetivo deste artigo debater a não recepção do dispositivo em questão pela Constituição Federal. Também não é objetivo, aqui, discutir as teses e interpretações que controvertem o tema no Poder Judiciário. Muito menos avaliar a qualidade das decisões judiciais proferidas em casos concretos, que ora reconhecem a estabilidade em questão e ora a negam. Deixo esses pontos para outros colegas que, certamente, os abordarão com mais brilhantismo<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
<a href="https://conteudo.jota.info/poder-contato"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>O objetivo deste artigo é o de continuar fomentando o debate<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> deste dispositivo de lei. E o motivo é simples: Deste debate é possível extrair questionamentos relevantes sobre o que buscamos para o futuro do cooperativismo no Brasil<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>. Um segmento que, segundo dados da Organização das Cooperativas Brasileiras – OCB, abrange 5.314 cooperativas no país e injeta mais de R$ 11 bilhões em tributos nos cofres públicos<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>.
Com este espírito realizei um exercício empírico perante os Tribunais Regionais do Trabalho e Tribunal Superior do Trabalho, no final de 2020, em busca dos segmentos econômicos que têm enfrentado a controversa discussão da estabilidade provisória de emprego inserida na lei do cooperativismo. Logrei êxito em encontrar a judicialização do tema nos segmentos financeiro (bancário) e da indústria farmacêutica.
Durante a pesquisa observei a existência de várias cooperativas com nomes distintos nas ações judiciais, o que me motivou a realizar um segundo exercício, ao longo do mês de janeiro de 2021, para tentar localizar a quantidade de cooperativas que estariam ligadas, de alguma forma, ao segmento da indústria farmacêutica.
Como a busca da informação demanda tempo e é árdua, tomei a liberdade de encerrar a pesquisa ao encontrar 50 cooperativas diversas no âmbito deste segmento econômico. Certamente existem mais!
Dos achados pude observar que são cooperativas majoritariamente de consumo e habitacionais. A totalidade dos achados é de cooperativas que, de alguma forma, estão vinculados à categoria profissional diferenciada (propagandista de produtos farmacêuticos)<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>. Categoria que gera aproximadamente 20 mil empregos no Brasil<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a>.
O maior volume dos achados (50%) está na região Nordeste do país. Seguido pelo estado do Rio de Janeiro (14%). Essa amostra representa quase 4% do total de cooperativas existentes no Nordeste e, também, quase 4% do total de cooperativas existentes no estado do Rio de Janeiro. Destaque para o estado do Maranhão, na região Nordeste do país: 7% do total de cooperativas desse estado possuem relação com a categoria profissional acima citada.
<blockquote class="jota-article__eye">Um ponto que chama a atenção na pesquisa é que não foi possível encontrar uma correlação direta das atividades das cooperativas com a atividade setorial farmacêutica.</blockquote>
Ao contrário. A grande maioria dos achados são de cooperativas sem qualquer relação com o segmento industrial em questão, ou seja, fabricação, distribuição e comercialização de produto farmacêuticos em geral.
O que faz sentido, já que estamos diante de um segmento industrial que não tem, na história brasileira, uma correlação direta de atuação com o sistema cooperativista.
Outros pontos que chamam a atenção foram: O fato de existir parcas informações públicas disponíveis sobre tais cooperativas, que não sejam em ações judiciais de natureza trabalhista discutindo a temática da estabilidade de emprego ou uma pequena menção na internet.
E, que as cooperativas estão localizadas em bases territoriais que já possuem sindicatos representativos da categoria profissional diferenciada a qual possuem uma correlação. Há casos em que ambos (Sindicato e Cooperativa) estão, aparentemente, localizados no mesmo endereço.
Enfim, deste exercício empírico trago mais dúvidas do que respostas. Dúvidas como: para que(m) serve a estabilidade do diretor de cooperativa? Para que(m) interessa essa estabilidade provisória de emprego? O que queremos para o futuro do cooperativismo no Brasil?
O que a sociedade brasileira deseja com os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, IV CF)? E, principalmente, quais são as consequências práticas que o privilégio desta estabilidade provisória de emprego traz para a economia e para a geração de emprego e renda no país?
São dúvidas que precisam ser debatidas. Pontos que precisam ser enfrentados em nossa democracia. Especialmente pelos Poderes Legislativo e Executivo. E, na ausência de ambos, pelo Poder Judiciário que precisa uniformizar os entendimentos em torno do tema, avaliando as consequências práticas de suas decisões para a coletividade e o Brasil, mas, não apenas para o indivíduo que busca um privilégio de estabilidade provisória de emprego.
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O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
https://youtu.be/-hMj5lwWXEE
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Faço referência ao cirúrgico artigo publicado no jornal Valor Econômico, em 15 de dezembro de 2020, de autoria do ministro do TST Douglas Alencar Rodrigues: “Cooperativismo, ética e inclusão social”.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Em 24 de junho de 2020 fiz considerações públicas iniciais sobre o tema, no artigo intitulado “O cooperativismo e a estabilidade de emprego”. Disponível em: &lt;<a href="https://migalhas.uol.com.br/depeso/329575/o-cooperativismo-e-a-estabilidade-de-emprego" target="_blank" rel="noopener noreferrer">https://migalhas.uol.com.br/depeso/329575/o-cooperativismo-e-a-estabilidade-de-emprego</a>&gt;.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Referencio os Projetos de Lei <a href="https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=953932" target="_blank" rel="noopener noreferrer">519/2015</a> e <a href="https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1819586&amp;filename=PL+5493/2019" target="_blank" rel="noopener noreferrer">5493/2019</a>. O primeiro tem por objetivo revisar o marco do cooperativismo brasileiro. O segundo, apensado ao primeiro, propõe a alteração legislativa do artigo 55 da lei do cooperativismo.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Fonte: Anuário 2020 da OCB – Organização das Cooperativas Brasileiras. Disponível em: &lt;<a href="https://www.ocb.org.br/" target="_blank" rel="noopener noreferrer">https://www.ocb.org.br/</a>&gt;.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> Lei Federal n.º 6.224, de 14 de julho de 1975 | CBO 354150.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a> Fonte: RAIS 2019. Quantidade de vínculos ativos por ocupação CBO (354150) e unidade da Federação. Total: 20.869.

Carteira de trabalho

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JOTA

O privilégio da estabilidade provisória de emprego

Para que(m) serve a estabilidade do diretor de cooperativa?

O privilégio da estabilidade provisória de emprego