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Contratos

Os usos setoriais na interpretação do contrato

Com a vigência da Lei de Liberdade Econômica, a interpretação dos negócios jurídicos deve ir além do campo contratual

José Augusto Fontoura Costa, Vivian Rocha
23/06/2021|11:49
Atualizado em 12/04/2022 às 17:47
Crédito: Pixabay

Muito se tem discutido sobre as alterações feitas pela Lei n°13.874/2019 (Lei de Liberdade Econômica) no Código Civil, dentre as quais os critérios para a interpretação dos negócios jurídicos, que levantaram consideráveis polêmicas. Nesse breve artigo, com destaque para o inciso II do § 1º do Artigo 113, discute-se a necessidade de interpretação legal cuidadosa para a correta identificação do alcance e sentido da norma, bem como da compreensão de seus limites objetivos.

A norma ora analisada tem a seguinte redação: “A interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que corresponder aos usos, costumes e práticas do mercado relativas ao tipo de negócio”.

Desde logo, observa-se tratar-se de regra voltada à “interpretação do negócio jurídico”, de modo consistente com sua localização no Código Civil: o conjunto de regras referente ao negócio jurídico (Título I) em termos de disposições gerais (Capítulo I). O emprego desse critério interpretativo não se restringe ao campo contratual, pois a noção de “negócio jurídico” é bem mais ampla do que a de “contrato” e pode abranger, por exemplo, casamentos e termos de consentimento para pesquisas clínicas.

A circunstância de ser um critério estabelecido para um grande campo de relações jurídicas, muitas das quais fora do campo das operações econômicas, impõe, desde logo, dificuldades para a utilização de um critério cuja referência externa de atribuição de sentido são “usos, costumes e práticas do mercado”. Só que inúmeros negócios jurídicos têm pouca ou nenhuma vocação econômica. Não fica muito claro, por exemplo, qual seria o mercado nupcial... Será possível, por exemplo, interpretar extensivamente a regra sobre interpretação e buscar esteio para a compreensão de uma cláusula em pacto antenupcial conforme as práticas do local e período em que se celebrou? Ou a leitura deve ser restritiva?

A essa questão se agrega um outro problema a respeito da clareza do texto legal. O que, exatamente, significa “mercado”? Quais são seus limites? O termo se refere a uma entidade abstrata, uma espécie de mercado ideal (hipoteticamente oposto ao governo, por exemplo)? Pressupõe a existência de um mercado global? Admite seccionamento geográfico: mercado de São Paulo, mercado da China? Delimita seu escopo objetiva ou setorialmente (mercado de soja, mercado de serviços)?

A opção do Legislador pela expressão “tipo de negócio” não ajuda a esclarecer a situação. Em termos gramaticais e sistemáticos parece razoável excluir, desde logo, a equivalência entre “tipo de negócio” e “tipo contratual”, pois sendo a segunda expressão consagrada e com sentido técnico muito claro, apenas o desejo de dizer outra coisa justificaria a opção do Legislador. Isso, porém, ainda é muito pouco para delimitar o terreno com algum grau de precisão.

Uma das possibilidades seria a de compreender “tipo de negócio” como uma referência a práticas setoriais, juridicamente reiteradas; por exemplo: o contrato de compra e venda de soja ou de empreitada por preço certo. É, certamente, a aplicação mais coerente e ajustada para os usos, costumes e práticas; não “de mercado”, mas de um mercado setorial delimitado, do qual participam comerciantes, ou seja, profissionais da mercancia para os quais esses padrões são claros e se relacionam com a consciência de sua exigibilidade jurídica.

Nesse sentido, a busca de uma interpretação conforme os usos e práticas do setor comercial relevante tenderia a evitar uma modalidade paradigmática da construção falaciosa e maliciosa de sentidos: a da compreensão idiossincrática da parte em relação a padrões comportamentais e econômicos que lhe são conhecidos, pois socialmente compartilhados de modo a compor o ethos da comunidade da qual participa. Em outros termos, não é possível alegar um sentido diverso daquele corrente para os participantes de uma comunidade, ainda que fora dela este não corresponda às compreensões mais usuais.

Assim, do ponto de vista da construção argumentativa, a norma ora em análise pode e deve ser empregada para consagrar a preponderância dos usos e costumes de um setor para aqueles que participam regular e profissionalmente das atividades comerciais a ele circunscritas. É uma contribuição importante para a sistemática de interpretação dos contratos comerciais, sobretudo em uma tradição jurídica em que se dá muito valor às percepções subjetivas, pois estabelece um padrão externo e objetivo de compreensão do sentido efetivo de regras sobre operações comerciais em tela.

Não obstante, um ajuste tão bom para um conjunto de negócios jurídicos – aqueles relativos a operações comerciais em setores onde há modelos de negócio consolidados pela prática e perspectivas firmes sobre o comportamento das partes – é prenúncio das dificuldades que a norma enfrenta ao se afastar de seu núcleo duro de significação.

Já se mencionou, por exemplo, eventuais dificuldades para estender uma interpretação “de mercado” para operações que ocorrem fora do mercado. Como na confecção de roupas de tamanho único, o resultando tenderá a ser um amplo conjunto de indivíduos mal-ajambrados, seja pelas mangas cobrindo as mãos dos de menor estatura, seja pelos botões a ponto de explodir naqueles com maior estrutura. O que cabe bem em um amplo conjunto de contratos comerciais não caberá em muitas outras aplicações.

Um dos limites mais claros é o dos vulneráveis ou hipossuficientes. Consumidores, trabalhadores, pacientes médicos, clientes de advogados e tantos outros sujeitos encontram-se, pelo menos a princípio, em posição de desvantagem na negociação dos acordos pelos quais se vinculam. Há pelo menos duas fontes das fragilidades desses sujeitos: a existência de assimetrias de informação e a força econômica dos sujeitos com os quais se relacionam. Não é o caso, aqui, de discutir a vulnerabilidade e seus reflexos jurídicos. Para a finalidade desse artigo basta deixar claro que o emprego de usos, costumes e práticas de um mercado ou setor não pode ser aceito como parâmetro interpretativo nessas relações, inclusive em relação ao desconhecimento de hábitos setoriais por participantes eventuais, como os consumidores, pacientes e clientes, ou sem alternativa econômica real, como muitos dos trabalhadores.

Outro limite, menos evidente, é o da participação não profissional e pontual de particulares interessados em mercados específicos, onde a contratação tende a ser padronizada ou, ao menos, bastante convergente. É o caso, por exemplo, dos proprietários de um ou um punhado de imóveis para aluguel e especulação; também é o caso dos contratantes de serviços para aplicação em mercados financeiros e de bolsas. É certa, aqui, a presença de algum grau de assimetria de informação, às vezes bastante elevado, e de falta de condições para negociar em condições de igualdade.

Nossa tendência, nesses casos, é de optar pela prevalência dos usos setoriais, exceto por aquelas cláusulas que resultem em abusividade decorrente da posição privilegiada de uma das partes. Embora não seja o caso, aqui, de aprofundar essa discussão, é importante deixar clara nossa opinião de que tal análise apenas pode ser feita caso a caso; é mais um problema sem soluções no atacado.

De fato, o ponto que se pretende deixar claro aqui é o seguinte: a regra do Artigo 113, § 1º, II do Código Civil é de fácil compreensão e aplicação muito benéfica nas operações usualmente realizadas em um setor específico. Sua extensão a todos os demais negócios jurídicos é, porém, muito mais complicada.

Em termos interpretativos, porém, é possível realizar a redução do âmbito material de eficácia da regra a partir de dois argumentos principais. O primeiro é de caráter sistemático e histórico: a regra nasce de uma lei denominada “da Liberdade Econômica” e voltada a favorecer as atividades empresariais e comerciais. Claramente não foi feita para casamentos ou para relações de trabalho.

Assim, sua origem identifica a necessidade de restringir o emprego desse critério interpretativo ao campo das atividades empresariais. Em termos teleológicos, o argumento aponta exatamente no sentido da discussão ora apresentada: a função de evitar, por meio de interpretações desviadas, a fuga das partes das concepções e deveres próprios do setor em que atua deve ser levada em conta e, portanto, mitigar a aplicabilidade do critério quando não se tratar de contrato relativo a atividade comercial ou empresarial.


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José Augusto Fontoura Costa

Professor titular de Comércio Internacional da Faculdade de Direito da USP

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Vivian Rocha

Doutora e Mestre em Direito Internacional e Comparado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Foi Michigan Grotius Research Scholar (2018-2019) na Universidade de Michigan (EUA). Advogada em Comércio Internacional

Tags ContratosDireito CivilLei da Liberdade EconômicaNegócios jurídicos
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