Luciano Benetti Timm

Paula Abi-Chahine Yunes Perim

<a href="#_ftn2" name="_ftnref2"></a>
A discussão sobre a interpretação e pretensão revisional dos contratos futuros de grãos, com preços pré-fixados, voltou ao cenário judicial. A crise causada pela Covid-19 trouxe instabilidade econômica, provocando desarranjos em algumas cadeias produtivas e questionamentos sobre a obrigatoriedade de cumprimento dos termos contratuais inicialmente pactuados entre as partes.
Embora o setor do agronegócio tenha sido pouco impactado pela pandemia da Covd-19, em comparação a outros setores da economia (como turismo e aviação), já se nota uma movimentação oportunista (no jargão econômico) para que os contratos futuros de soja, com preços pré-fixados, sejam revisados em prol do produtor, sob justificativa equivocada da alta do dólar, onerosidade excessiva e boa-fé contratual.
<a href="https://conteudo.jota.info/jota-pro-tributos" rel="attachment wp-att-291213"><img class="size-medium wp-image-291213 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-tributos-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>
Nesse cenário, já vivenciando uma situação de “exceção”, foi proferida decisão, em dezembro de 2020, em que o magistrado determinou, liminarmente, a revisão de contratos futuros de soja, com preço fixado em dólar norte-americano, tendo como fundamentação justamente a forte oscilação da moeda norte-americana em razão da pandemia da Covid-19, que levou a excessivo prejuízo dos produtores, visto que o contrato previa dólar fixado em cerca de 20% menos do que ele vale atualmente<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
Em sentido contrário, três outras decisões de primeiro grau foram proferidas nos Estados do Rio Grande do Sul<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a> e São Paulo<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>, entendendo, basicamente, que não haveria justificativa para revisão dos contratos em razão da pandemia. Na linha que se atende ser a mais apropriada para situações desse porte, essas decisões afastaram a possibilidade de aplicação da teoria da imprevisão aos contratos aleatórios, já o risco da oscilação de preços é inerente a esse tipo de contrato, sendo da essência do acordo de vontades das partes.
Na esteira desses primeiros julgados e pelo volume de notícias que chegam de alguns advogados estimulando a litigância entre os produtores – por motivos que não vem ao caso tratar aqui –, entendemos que pode haver uma corrida oportunista por produtores na Justiça buscando revisar os termos contratuais, inclusive com obtenção de liminares isoladas.
Todavia, não vemos como tal entendimento possa ser mantido à luz da legislação vigente e da própria jurisprudência já consolidada do STJ.  A uma, porque a Lei de Liberdade Econômica<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a> e a Lei que tratou do Regime Legal Excepcional das relações jurídicas durante a pandemia<a href="#_ftn7" name="_ftnref7">[7]</a> não admitem essa hipótese. A duas porque a jurisprudência consolidada do STJ inadmite a aplicação do instituto da onerosidade excessiva para casos de variação de preço em contratos empresariais futuros.<a href="#_ftn8" name="_ftnref8">[8]</a>
<blockquote class="jota-article__eye">Ora, o setor do agronegócio foi o que menos sofreu durante a crise sanitária do covid e não há justificativas econômicas e nem mesmo jurídica para intervenção nesses contratos, até porque a variação de preços da soja não guarda estrita causalidade com a pandemia.</blockquote>
Não há reequilíbrio a ser feito nesse tipo de negócio jurídico em que todas as posições foram “travadas” no passado, justamente para ambas as partes obterem um mínimo de resultado, sem correr risco de oscilação de preços. Assim, o melhor que o Poder Judiciário pode fazer – como já fez na maioria dos casos que lhe foram trazidos até o momento, como se demonstrou acima –, se levarmos as consequências decisórias a sério, é manter a estabilidade e a segurança jurídica dos pactos e evitar um excesso de judicialização.
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O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
https://youtu.be/-hMj5lwWXEE
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Professor da FGVSP, Doutor em Direito e Sócio de Carvalho, Machado e Timm Advogados.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Doutoranda em Direito na USP e Sócia de Carvalho, Machado e Timm Advogados.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Procedimento Comum Cível nº 5001941-87.2020.8.24.0022/SC, 1a. Vara Cível da Comarca de Curitibanos, TJSC.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Procedimento Comum Cível nº 500008-24.2021.8.21.0153/RS, Vara Judicial da Comarca de Tucunduva – RS.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> Processo n. 1044904-84.2020.8.26.0100, 38ª Vara Cível Foro Central – SP e Processo n. 1121712-33.2020.8.26.0100, 1ª Vara Cível de São Bernardo do Campo.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a> Código Civil conforme redação da Lei 13874/19. “Art. 421.  A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato. Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.” (NR)
Art. 421-A. Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido também que: I - as partes negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução; II - a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e III - a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.”
<a href="#_ftnref7" name="_ftn7">[7]</a> Lei 14010/20. “Art. 7. Não se consideram fatos imprevisíveis, para os fins exclusivos dos arts. 317, 478, 479 e 480 do Código Civil, o aumento da inflação, a variação cambial, a desvalorização ou a substituição do padrão monetário.”
<a href="#_ftnref8" name="_ftn8">[8]</a> REsp 803.481/GO, relatora Nancy Andrighi (julgado em 28/06/2007); REsp 809.464/GO, relator Fernando Gonçalves (julgado em 10/06/2008); REsp 964060/GO, decisão monocrática do Ministro Sidnei Beneti (julgado em 28/10/2010); REsp 849.228/GO (julgado em 03/08/2010), REsp 945.166/GO (julgado em 28/02/2012) e REsp 1.009.723/GO (julgado em 25/05/2012), esses três últimos de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão
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JOTA

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