Ricardo Fenelon Junior

Durante a votação da <a href="https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/mpv/151449">MP 1089/2021</a>, na última terça-feira (26), que trata sobre alterações importantes e necessárias na legislação do setor aéreo, em especial no ultrapassado Código Brasileiro de Aeronáutica de 1986, a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/camara-dos-deputados">Câmara dos Deputados</a> aprovou uma emenda da deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) alterando o Código de Defesa do Consumidor e incluindo uma obrigação de que as companhias aéreas ofereçam a qualquer passageiro uma franquia de bagagem de 23 kg em voos nacionais e de 32 kg em voos internacionais.
Infelizmente, essa emenda aprovada é extremamente danosa para o setor aéreo brasileiro em todos os sentidos, do ponto de vista dos passageiros, das companhias aéreas, mas principalmente pela ótica da possibilidade de aumento da concorrência. Como já amplamente divulgado por especialistas nos últimos anos, tal medida dificulta bastante a entrada ou criação no país de empresas que vendem passagens mais baratas porque são altamente agressivas no controle de custos.
Há uma frase comum de que “na Europa é possível viajar por 15 euros”. A questão é que na Europa não existem os mesmos custos que no Brasil. Regras ultrapassadas como essa da bagagem, caso confirmada pelo Senado Federal e sancionada pelo presidente da República, criam uma barreira significativa para que esse contexto europeu um dia se torne possível no Brasil. Além disso, e pior, tendem desde já a tornar a passagem mais cara para todas as pessoas, pois obviamente não existe franquia de bagagem gratuita.
Não há dúvidas de que há uma boa intenção por trás da medida, a de baratear as passagens no Brasil. O problema é que a premissa está completamente equivocada do ponto de vista da regulação econômica. Quando se cria uma norma obrigando as companhias aéreas a disponibilizar uma franquia de bagagem a todo e qualquer passageiro, independente de sua vontade e necessidade, ao contrário do que se pretende, não se cria uma franquia de bagagem gratuita. Na prática, o resultado é que as empresas deixam de cobrar apenas dos passageiros que optam por ter franquia de bagagem, para cobrar de todos.
Apesar da aura em torno do transporte aéreo, pela forma fascinante como um avião pesando toneladas decola, voa nas nuvens a mais de 10 mil pés, com velocidade acima de 800 km/h e pousa a milhares de quilômetros de distância em algumas horas, ou pelo glamour que existia no início do transporte aéreo há menos de 100 anos, com caviar e champanhe a bordo, a verdade é que uma empresa aérea é um negócio como qualquer outro.
Não existe direito à franquia de bagagem, da mesma forma que não existe direito à uma lata de refrigerante em um restaurante. A questão não é de direito, mas sim de quem vai pagar por aquele custo. O que será que aconteceria se fosse criada uma norma no sentido de que todos os restaurantes do Brasil, a partir de amanhã, tivessem obrigatoriamente que oferecer uma bebida junto com o prato de comida a todos os clientes, independentemente de suas vontades e escolhas? É difícil imaginar que o prato de comida ficaria mais barato, não é? Na aviação civil não é diferente.
Além da questão de mérito, o pior de todo esse debate é que o setor passa por um momento extremamente crítico, tentando se recuperar após a maior crise da história nos últimos dois anos e lidar com os impactos atuais do aumento do preço do combustível, gerado pela guerra na Ucrânia. No momento em que os tomadores de decisão deveriam estar discutindo os custos estruturais do setor, que só existem no Brasil, que tornam mais caro voar e impedem que milhões de pessoas tenham acesso ao transporte aéreo, decide-se retornar à discussão de um tema extremamente ultrapassado, que nos países desenvolvidos já se resolveu há décadas.
Com as devidas vênias, parece até uma tentativa de desviar o foco e de não enfrentar os problemas que realmente importam e que, caso solucionados, poderiam verdadeiramente gerar efeitos benéficos ao consumidor. Sem qualquer tentativa de prever o futuro, mas pela lógica da regulação econômica – considerando que variáveis importantes como petróleo e dólar não sofram variações significativas –, a maior probabilidade é de aumento dos preços caso o Congresso Nacional volte a obrigar que todos os passageiros paguem por bagagem despachada.
Depois disso, com as passagens ainda mais caras, a tendência, partindo da mesma premissa equivocada, é que se volte a discutir a regulação de tarifas aéreas no Brasil, algo já consolidado há anos e que permitiu que o número de passageiros triplicasse e a tarifa média caísse pela metade. Ou seja, sempre na busca de soluções fáceis e equivocadas, quando a real solução deveria focar medidas que permitam a redução de custos estruturais, para que haja o aumento da concorrência no setor. Não há outro caminho para reduzir os preços das passagens aéreas.

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JOTA

Solução deveria focar medidas que permitam a redução de custos estruturais do setor


Obrigar aéreas a cobrar bagagem de todos é desviar foco dos problemas reais

Quando se deveria discutir os custos estruturais do setor aéreo no Brasil, decide-se retornar ao tema ultrapassado da cobrança de bagagem