Jardes Costa de Oliveira

Carolina Sposito

Mariana Cardoso Martins

A utilização de precatórios ou de direitos creditórios em desfavor da União, oriundos de decisão transitada em julgado para quitação ou amortização do crédito tributário federal, se tornou uma possibilidade bastante atrativa para os contribuintes, em especial, para aqueles que buscam a transação tributária como forma de liquidar seu passivo tributário federal, sobretudo no que se refere à parcela dos débitos inscritos em Dívida Ativa da União (DAU).  
Em sua concepção, os <a href="https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/precatorios/#:~:text=Precat%C3%B3rios%20s%C3%A3o%20requisi%C3%A7%C3%B5es%20de%20pagamento,est%C3%A1%20previsto%20na%20Constitui%C3%A7%C3%A3o%20Federal.">precatórios</a> nada mais são do que requisições de pagamento expedidas pelo Judiciário para cobrar de municípios, estados ou da União, assim como de autarquias e fundações, valores devidos após condenação judicial definitiva, cujo pagamento aos credores é historicamente moroso por conta das travas orçamentárias públicas. A esperança de liquidação dos precatórios surgiu com as Emendas Constitucionais 113 e 114/2021, que alteraram significativamente o artigo 100 da CFRB/88. 
Chamamos atenção para o §11 do artigo 100, que conferiu ao credor a opção de realizar um encontro de contas com o poder público, especialmente para a hipótese a seguir transcrita: I - quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa do ente federativo devedor, inclusive em transação resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com a administração autárquica e fundacional do mesmo ente. 
Assim é que, em novembro de 2022 foi publicado o <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Decreto/D11249.htm">Decreto 11.249/22</a>, para colocar em prática o que foi alterado na Constituição Federal. Este Decreto, além de dispor sobre a oferta de créditos líquidos e certos decorrentes de decisão judicial transitada em julgado, também outorgou, ao procurador-geral da Fazenda Nacional (PGFN), por meio de seu artigo 6º, a competência para dispor sobre esse uso, inclusive nas transações.  
A utilização desses creditórios, sejam eles de titularidade própria ou de terceiros, geralmente ocorre por meio da lavratura de escritura pública que convalida a cessão dos direitos desse título em desfavor da União. Esse uso, destacamos, não prejudica ou mitiga eventual entrada, o famoso “pedágio”, cuja porcentagem é prevista no Edital de transação.  
E, ao falarmos de terceiros, estamos também diante da possibilidade de aquisição desses títulos no mercado, geralmente adquiridos com deságio em seu valor de face, após um rigoroso e bastante desgastante processo de due diligence para captura e eleição do melhor título que se adeque aos interesses daquela operação. 
Aliás, eventual saldo remanescente após a ocorrência do efeito liberatório na transação, nos termos da Portaria PGFN 10.826/2022, será devolvido ao cedente ou utilizado para pagamento de eventuais outros débitos em aberto que não estavam inicialmente incluídos no acordo.  
Tais considerações, revelam, sem dúvidas, a forte atratividade do uso desses créditos.  
Contudo, recentemente, tomamos conhecimento do <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Decreto/D11526.htm">Decreto 11.526/23</a>, publicado em 12 de maio deste ano, que alterou significativamente o Decreto 11.249/22, com impacto direto na operacionalização desta forma de liquidação, visto que vinculou o procedimento de utilização dos precatórios à edição de Ato Conjunto do Advogado-Geral da União e do Ministro de Estado da Fazenda, ouvidos os Ministérios do Planejamento e Orçamento e da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos na forma de seu artigo 1º, que conferiu nova redação ao artigo 5º do mencionado Decreto 11.249/22, mas ainda assim preservando a aplicação das regulamentações até então existentes sobre o assunto, como forma de evitar prejuízos aos credores por demora na definição destas regras. 
A modificação, <a href="https://www.gov.br/agu/pt-br/comunicacao/noticias/agu-e-ministerio-da-fazenda-irao-elaborar-novo-ato-para-dar-mais-seguranca-ao-uso-de-precatorios">segundo divulgado pela própria AGU</a>, foi necessária "a partir do diagnóstico de que o atual regramento não fixou parâmetros claros que permitam à administração pública adotar procedimentos uniformes em todos os pedidos de utilização dos créditos. A ideia é dar mais segurança jurídica e previsibilidade à aplicação da regra constitucional que permite o uso dos precatórios em determinadas hipóteses, garantindo que o procedimento seja submetido a análise criteriosa dos requisitos necessários para a aceitação dos créditos de modo a evitar que, posteriormente, tais operações sejam objeto de litígios judiciais ou administrativos". 
Em paralelo, tivemos acesso a íntegra do Despacho 00339/2023/GAB/CGU/AGU, assinado em 5 de maio, na qual o Consultor-Geral da União sugere ao Advogado-Geral da União que, "cautelarmente, determine as Procuradorias que sobrestem e não deem andamento a qualquer processo de análise de precatório para fins do §11º do artigo 100 da CRFB/88, bem como aos atos relativos à sua quitação até posterior deliberação da AGU com os resultados do grupo de trabalho criado" – grifos aditados.  
Como se nota, apesar do artigo 2º do Decreto 11.526/23 reforçar que, enquanto não ocorra a edição do Ato Conjunto Interministerial, as regulamentações editadas para a utilização desses créditos permanecerão em vigor, na prática o que temos é a suspensão de qualquer negociação com os precatórios.
Nos atentemos às datas: O Decreto 11.526/23, que revogou o artigo 6º do Decreto 11.249/22, foi publicado posteriormente ao Despacho, de modo que nos parece que há uma certa convalidação dos atos praticados pela PGFN, sem que sejam eivados de legalidade, com a ressalva da preservação dos efeitos destacados acima. 
Não nos esqueçamos: A <a href="https://www.gov.br/pgfn/pt-br/acesso-a-informacao/institucional/competencia">competência institucional</a> para apurar a liquidez e certeza da dívida ativa da União de natureza tributária e não tributária, inclusive para proceder com a sua inscrição para fins de cobrança, amigável ou judicial, e dos demais atos que dela decorrem, é da PGFN. 
Logo, nos parece que, até que seja editada Portaria Interministerial estabelecendo os procedimentos e requisitos à luz do quanto determinado pelo novo Decreto, a PGFN deverá aceitar normalmente as proposições desse uso com base na norma vigente. 
Essa suposição, inclusive, <a href="https://www.gov.br/agu/pt-br/comunicacao/noticias/agu-e-ministerio-da-fazenda-irao-elaborar-novo-ato-para-dar-mais-seguranca-ao-uso-de-precatorios">veio a ser reforçada no site da AGU</a>, ao destacar que "os despachos esclarecem ainda que o sobrestamento não atinge o uso de precatórios para liquidação ou amortização de créditos inscritos em dívida ativa da União, conforme regulamentado pela Portaria PGFN 10.826/2022". Até o momento, apesar das nossas buscas, não tivemos acesso a íntegra desses despachos que asseguram essa preservação. 
Contudo, reforçam, <a href="https://www.gov.br/agu/pt-br/comunicacao/noticias/agu-revoga-portaria-que-regulamentava-uso-de-precatorios-para-pagamentos-a-entidades-e-orgaos-federais">em outra matéria divulgada</a>, que o uso de precatórios utilizados especificamente para o pagamento de tributos está regulamentado pela Portaria PGFN 10.826/2022, e não pela Portaria Normativa AGU 73/2022, de modo que não haveria, em uma primeira análise, um choque normativo, nem aplicabilidade das novas disposições à cobrança Dívida Ativa da União, diante da revogação da última Portaria pela <a href="https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-normativa-n-87-de-14-de-marco-de-2023-469975588">Portaria Normativa AGU 87/2023</a> – publicada em março último. 
Diante dessa celeuma, a pergunta que paira é a seguinte: Será, a autonomia da PGFN, mitigada ou reforçada com a edição desse novo ato?  
Para também não perdermos do radar: a recomendação da AGU para utilização de precatórios para pagamento de débitos de outra natureza, a exemplo das outorgas de concessões, é a de que se aguarde a regulamentação a ser realizada por meio da nova Portaria, a fim de garantir maior conforto jurídico para a decisão do gestor.  
Assim, prevista para ser divulgada em 120 dias a contar da data da publicação que revogou a Portaria da AGU em questão (15/3/2023), só nos resta, então, aguardar até o próximo dia 13 de julho para entendermos as cenas dos próximos capítulos.

precatório

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JOTA

As modificações na forma do uso podem impactar as transações tributárias? 

O uso de precatórios para amortizar créditos tributários

Precatórios para amortização de créditos tributários: modificações na forma do uso podem impactar as transações tributárias?