Hodekirichardson Cunha

Andre Bogossian

Mariana Saragoça

Dentre as disposições da <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc113.htm">Emenda Constitucional 113/2021</a> chama atenção a alteração do III do §11 do artigo 100, que permite aos licitantes a oferta de créditos líquidos e certos que lhe são próprios ou adquiridos de terceiros reconhecidos pelo ente ou por decisão judicial transitada em julgado no pagamento de outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial.
Considerando a autoaplicabilidade do disposto no §11 do artigo 100 da Constituição Federal na redação que lhe foi conferida pela EC 113/21, a partir do novo dispositivo constitucional, temos previsto o direito de pagamento de outorga com uso de precatórios, sem que tenha havido qualquer limitação pela EC 113/21 à sua utilização em licitações em âmbito federal – ou mesmo em relicitações.
As relicitações de concessões federais nos setores aeroportuário, rodoviário e ferroviário foram instituídas pela <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13448.htm">Lei 13.448/17</a>, fruto da conversão da MP 756, para assegurar a continuidade dos serviços públicos ao permitir a devolução do objeto licitado pelas concessionárias que 1) não estivessem atendendo dispositivos contratuais; ou 2) demonstrem incapacidade contratual ou financeira para cumprir as obrigações assumidas originalmente, suscitando a necessidade de um novo processo de licitação.
A Lei 13.448/17 também prevê o direito do concessionário que pretende devolver sua concessão à relicitação (“relicitado”) de ser indenizado pela parcela não amortizada de investimentos em bens reversíveis, direito esse garantido de uma forma ou outra desde a própria lei geral de concessões – Lei 8.987/95.
O objetivo da indenização não é outro a não ser evitar, quando da reversão dos bens afetados à prestação do serviço, um enriquecimento do Poder Concedente, que terá se beneficiado dos investimentos privados, às custas do relicitado.
Tendo em vista o cenário de restrição fiscal e os entraves orçamentários, em busca de uma maior eficiência no procedimento da relicitação o §1º do artigo 15 da Lei 13.448/17 faculta ao edital de relicitação prever que o pagamento da parcela não amortizada dos investimentos que tenham sido realizados pelo concessionário relicitado sejam pagas pelo novo concessionário (“relicitante”), ainda que, na origem, esse crédito seja devido pelo Poder Concedente em virtude dos investimentos realizados na vigência do seu vínculo contratual com o concessionário relicitado.
Diante desse cenário, a dúvida que surge é: poderia o relicitante pagar os valores relativos à indenização diretamente ao relicitado utilizando-se de precatórios federais?
Algumas questões devem ser ponderadas.
Primeiramente, é preciso esclarecer se o valor devido a título de indenização integraria de alguma forma a outorga. Isso porque a autorização dada pela EC 113/21 para utilização de precatórios limita-se ao pagamento de “outorga”, que nada mais é que o preço pago por um licitante para obtenção do direito de exploração de dado objeto concessional, e, portanto, é crédito detido pelo próprio titular do serviço público.
Por um lado, é intuitivo pensar que a indenização não integra o valor da outorga. Afinal, os editais podem prever pagamentos a terceiros que não se confundiriam com a outorga, como é o caso do ressarcimento dos dispêndios correspondentes a elaboração dos estudos de que tratam o artigo 21 da Lei 8.987/95.
Por outro lado, o §5º acrescido ao artigo 15 da Lei 13.448/17 pela recente Lei 14.368/22 afirma que “caso o valor inicial ofertado a título de outorga seja menor que o valor do pagamento da indenização referente a bens reversíveis não amortizados, a União custeará a diferença”. Esse artigo corrobora a ideia de que a indenização ao relicitado seria dívida de titularidade do Poder Concedente, o que seria um argumento favorável à utilização dos precatórios para o seu pagamento.
Outro ponto a ser considerado é a possível diferenciação entre os casos de relicitações solicitadas previamente à edição da EC 113/21 e da Lei 14.368/22 daquelas relicitações que venham a ser solicitadas e acordadas na vigência das novas normas.
Para novos casos, visto tratar-se de questão afeta a direito patrimonial disponível, os concessionários que pretendem aderir ao regime de relicitação podem voluntariamente acordar sobre tais condições de pagamento no termo aditivo a que se refere o artigo 15 da Lei 13.448/17, na forma de seu §1º, I.
Para aqueles contratos cuja adesão à relicitação já foi pactuada, seria o concessionário relicitado obrigado a aceitar pagamento em precatório?
Em primeiro lugar, como compatibilizar o fato de a indenização ser paga previamente ao início da prestação de serviços pelo relicitante com o regime de precatórios? Em segundo lugar, caso tal pagamento com precatórios fosse possível de ser imposto ao relicitado, a previsão de que o pagamento ao relicitado pode ser feito pelo relicitante não perderia sua efetividade, considerando que, no fim, tudo acabaria em precatório?
Ironicamente, de duas medidas objetivando uma maior eficiência (permitir o pagamento direto do relicitante ao relicitado e o uso de precatórios no pagamento pelos licitantes pela outorga de delegações de serviços públicos federais) não resultaria o retorno ao estado de coisas anterior em que o concessionário relicitado ficaria sujeito ao risco de pagamento do governo federal, agora em um regime de precatórios?
Essas questões devem ser respondidas com a publicação dos editais de relicitação, o que se espera que ocorra em breve, considerando que a <a href="https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.368-de-14-de-junho-de-2022-408485274">Lei 14.368/22</a> surge como uma <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/um-jabuti-voador-regras-sobre-relicitacoes-na-conversao-da-mp-do-voo-simples-15062022">tentativa pontual de destravar os processos de devolução e relicitação</a>.

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JOTA

O uso de precatórios federais no pagamento de indenizações em relicitações

Poderia o relicitante pagar os valores relativos à indenização diretamente ao relicitado utilizando-se de precatórios federais?

O uso de precatórios federais no pagamento de indenizações em relicitações

No fim tudo acaba em pizza?