Thúlio Guilherme Nogueira

João Pedro Drummond

O <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/STF">STF</a> decidiu que a soberania do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/tribunal-do-juri">Tribunal do Júri</a> permite a prisão imediata após a condenação, independentemente da pena aplicada ao réu, considerando inconstitucional a regra que limitava essa prisão a penas de 15 anos ou mais (art. 492, CPP).
A decisão, tomada no último dia 13 de setembro, levanta três preocupações principais: a volatilidade na interpretação da presunção de inocência pelo STF em diferentes momentos; a contradição entre o tratamento mais severo conferido ao Tribunal do Júri e seu status de garantia fundamental; e o desequilíbrio entre os poderes da República – neste caso entre Congresso e STF.
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A presunção de inocência, prevista no rol de direitos e garantias da Constituição de 1988, afirma que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado". Embora seja um dos pilares do direito processual penal, a interpretação desse princípio tem oscilado ao longo do tempo, dependendo da composição do STF e das circunstâncias sociais e políticas de cada período.
Nos anos 1990, o STF permitiu que uma pessoa pudesse começar a cumprir pena de prisão logo após ser condenada em segunda instância, mesmo que ainda pudesse recorrer. Em 2009, o STF mudou essa posição, estabelecendo que a prisão só poderia acontecer depois de esgotados todos os recursos, ou seja, após o chamado "trânsito em julgado".
Essa mudança foi incorporada na lei com a criação do artigo 283 do Código de Processo Penal (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/CPP">CPP</a>), em 2011. Porém, em 2016, no auge da Lava Jato, o STF voltou a permitir a prisão após a condenação em segunda instância. Em 2019, mais uma vez, o Tribunal reviu sua posição e restabeleceu a exigência de trânsito em julgado, reafirmando a validade do artigo 283 do CPP.
Ainda em 2019, o Congresso, como resposta ao STF, aprovou a Lei Anticrime, reacendendo o debate com uma regra que permitia a execução imediata de condenações do Tribunal do Júri a penas de 15 anos ou mais, mesmo que houvesse recursos pendentes. Contudo, no julgamento ocorrido no último dia 13/09, apesar das divergências internas no STF, prevaleceu o entendimento de que condenados por crimes contra a vida podem ser presos logo após a decisão do júri, independentemente da quantidade pena aplicada, mesmo que ainda possam recorrer. 
O voto vencedor, do ministro <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/luis-roberto-barroso">Luís Roberto Barroso</a>, adota um viés pragmático e consequencialista, posicionando o Judiciário como agente de segurança pública para justificar a reinterpretação da presunção de inocência. A interpretação judicial, no entanto, não pode desvirtuar o texto constitucional ou adaptá-lo às convicções pessoais, por mais nobres que sejam. A decisão deve se basear na melhor interpretação do direito, "pautada pela Constituição, leis e tradições jurídicas", como afirmou a ministra <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/rosa-weber">Rosa Weber</a> em seu voto de divergência.
A constante oscilação do STF na interpretação da presunção de inocência expõe uma fragilidade jurídica, refletindo as pressões sociais e políticas do momento. É emblemático que a decisão tenha ocorrido logo após o ministro <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/dias-toffoli">Dias Toffoli</a> restabelecer a condenação dos réus da boate Kiss, determinando a imediata prisão deles.
O voto vencedor também incorre em contradição ao basear a nova interpretação com base na chamada “soberania dos veredictos”. Contudo, esse princípio, segundo o qual as sentença dos jurados não podem ser alteradas pelo juiz presidente ou outro magistrado que aprecie o caso, não impede, por exemplo, o manejo de recursos para determinar novo júri quando o resultado do processo contrariar as provas dos autos ou que para apontar alguma ilegalidade ocorrida no julgamento. 
A situação piora quando tal soberania é utilizada para flexibilizar a presunção de inocência, reduzindo o peso de uma das principais garantias do direito em prol de uma alegada efetividade da lei penal e da proteção de bens jurídicos específicos, o que compromete seu caráter universal concedido pela Constituição.
No que tange ao duplo grau de jurisdição, argumentou-se que a execução imediata da pena pelo Tribunal do Júri não viola o Pacto de San José da Costa Rica, uma vez que a soberania dos veredictos, por ter caráter constitucional, prevaleceria sobre o tratado. No entanto, essa interpretação falha ao ignorar que o direito ao recurso inclui tanto a análise dos fatos quanto questões processuais, que podem alterar o resultado do julgamento. 
Embora a decisão tenha vários problemas, o mais preocupante é que os ministros impõem limitações aos direitos dos acusados por crimes contra a vida com base em algo que, paradoxalmente, deveria protegê-los: o Tribunal do Júri, que é previsto como uma garantia fundamental na Constituição Federal.
Ao declarar inconstitucional o limite de 15 anos para a execução imediata das penas, o tribunal interferiu diretamente na decisão legislativa, que pretendia restringir a execução imediata a crimes de maior gravidade. Além de expor um novo impasse entre os Poderes da República, isso cria um cenário de quebra de proporcionalidade, no qual crimes com penas menores, como o infanticídio ou tentativa de homicídio, resultam em prisão imediata, enquanto outros crimes mais graves, como o latrocínio — fora da competência do júri —, permitem que o réu recorra em liberdade.
No fim, o que mais preocupa é o enfraquecimento das garantias fundamentais, que estão cada vez mais vulneráveis a interpretações instáveis e pressões políticas. O ativismo judicial, sem diretrizes claras, gera insegurança jurídica, desestabiliza o equilíbrio entre os poderes e enfraquece a confiança no sistema de justiça e no Estado de Direito.

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JOTA

Sem diretrizes claras, ativismo judicial enfraquece a confiança no sistema de justiça e no Estado de Direito

O Tribunal do Júri não deveria ser, por definição, uma garantia?

O ativismo judicial, sem diretrizes claras, gera insegurança jurídica entre os Poderes e enfraquece a confiança no sistema de justiça