Thiago R. Maia

Izabella Reis

A discussão envolvendo a segurança das barragens de mineração ganhou destaque na pauta nacional e internacional do setor mineral. À medida em que a demanda global por minerais cresce, há também o consequente aumento no volume dos rejeitos e estéreis gerados. Como resultado, a gestão dos rejeitos e estéreis se tornou um dos maiores desafios do setor mineral nos últimos tempos.
Recentes pesquisas demonstram que embora o número de acidentes envolvendo barragens de mineração tenha diminuído nos últimos anos, analisando mais de perto essas estatísticas é possível notar que as consequências desses eventos têm se tornado cada vez mais graves.<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> Tal fato revela a importância de que o foco do assunto seja voltado para a prevenção e não para a remediação.
<a href="https://conteudo.jota.info/risco-politico"><img class="aligncenter wp-image-244336 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/04/cta-risco-politico.png" alt="" width="1080" height="1080" /></a>
Um outro estudo baseado em 147 acidentes ao redor do mundo revelou que não há uma única, mas sim várias causas que podem levar à ruptura de uma barragem, para citar algumas, overtopping, liquefação, má-gestão, condições climáticas extremas, pipping e design inadequado para o local de implantação.
O referido estudo apontou como causa mais comum correspondente a 26% do número total de acidentes as mudanças climáticas, sendo a segunda mais comum a má-gestão das estruturas. Fato interessante é que a pesquisa apontou que a liquefação – principal causa identificada nos últimos acidentes ocorridos no Brasil – foi responsável por 14% dos acidentes analisados.
Considerando as relevantes consequências dos recentes eventos envolvendo o rompimento de barragens de mineração, especialmente Mount Polley em 2014 no Canadá, Mariana 2015 e Brumadinho 2019 no Brasil, as discussões sobre as medidas necessárias para evitar novos acidentes ganharam um caráter ainda mais urgente.
Dando seguimento a essas discussões, foi lançado no último dia 05 de agosto o tão aguardado Padrão Global da Indústria para a Gestão de Rejeitos (Global Tailings Review), após 18 meses de um trabalho independente desenvolvido por um painel de especialistas multidisciplinar.
A iniciativa internacional foi iniciada após o acidente em Brumadinho, resultado de uma parceria entre o International Council on Mining and Metals (ICMM), United Nations Environment Programme (UNEP) e Principles for Responsible Investment (PRI).
<blockquote class="jota-article__eye">Seu objetivo foi o de estabelecer parâmetros globais para garantir a segurança na gestão das barragens de mineração rumo à meta de zero dano, ou seja, visando o banimento total de falhas catastróficas e, consequentemente, de novos danos ao meio ambiente e perdas de vidas.</blockquote>
A fase inicial de elaboração do Padrão Global incluiu a participação de comunidades afetadas pela implantação e operação de barragens de rejeitos, dentre outras, as comunidades afetadas pelos acidentes ocorridos em Mariana e Brumadinho (Brasil) e Columbia Britânica (Canadá).
Conforme constou nos relatórios, durante os trabalhos surgiram questões que vão além do desenvolvimento dos padrões auditáveis e que reforçam o importante papel a ser desempenhado pelas autoridades reguladoras, especialmente em relação às barragens abandonadas ou cujo responsável não possa ser identificado.
Tal fato reforça o caráter multidisciplinar e complexidade que envolve o atingimento da almejada meta de zero dano. No Brasil, a Agência Nacional de Mineração (ANM) tem desenvolvido um importante papel nesse cenário incluindo a intervenção em barragens com risco de rompimento, cujos casos recentes foram identificados através do Sistema Integrado de Gestão de Barragens de Mineração (SIGBM) no Mato Grosso, além de manter uma contínua atualização e aperfeiçoamento da legislação aplicável.
Adentro no conteúdo do Padrão Global, o documento é composto por 15 Princípios divididos em seis áreas estratégicas que compreendem, dentre outras medidas, a necessária transparência das informações, o respeito e inclusão das comunidades afetadas em todas as fases do empreendimento, necessária obtenção de consentimento livre, prévio e informado quando afetadas comunidades indígenas, definição de critérios para processos de auditorias que incluem diligências em direitos humanos, estas cada vez mais disseminadas no âmbito das operações de fusões e aquisições do setor, necessidade de gerenciamento multidisciplinar em todas as fases da barragem, inclusive pós-fechamento, sempre alinhados com as melhores práticas internacionais.
Por um  outro enfoque, pesquisas recentes também demonstraram que o sistema de bônus pode influenciar e até incentivar a gerência intermediária a assumir maiores riscos em prol de benefícios financeiros a curto-prazo.<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> Nessa linha, o Princípio 8 do Padrão Global reforçou a necessidade de que as métricas de remuneração sejam vinculadas, pelo menos em parte, à critérios de segurança pública e integridade das estruturas.
Ademais, o mesmo Princípio reforça a necessidade de que sejam definidas de políticas e sistemas de responsabilidades claras, incluindo a designação de um Executivo Responsável (podendo ser mais de um) que responderá pela segurança da estrutura e terá como responsabilidade evitar ou minimizar consequências de uma falha.
Ressalta-se que o Executivo Responsável deverá estar sempre em contato com o Conselho de Administração da empresa responsável pela barragem. Faz-se necessária ainda a indicação do Engenheiro Responsável que, além de garantir as condições de segurança da estrutura, deve fazer a ponte com o Executivo Responsável.
O Padrão Global incorporou ainda temas mais recentes e que têm influenciado a implantação, operação e fechamento dessas estruturas como o necessário aumento de sua resiliência às mudanças climáticas, como visto acima, uma das principais causas de acidentes.
Após o Padrão Global ter sido endossado pelos três coautores, caberá: i) à UNEP auxiliar governos que desejam incorpora-los em sua legislação e políticas; ii) ao PRI atuar junto aos investidores para apoiar empresas de mineração na implementação dos Padrões e; iii) às empresas membro da ICMM implementar os Padrões como compromisso de associação.
Vale frisar que o objetivo final é que o Padrão seja adotado em escala global e que seu cumprimento não deverá conflitar com os requisitos legais pelos países em que estejam localizadas as barragens. Por fim, o setor aguarda ansioso o lançamento dos protocolos para implementação.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Lindsay Newland Bowker and David M. Chambers. Chambers (2015). ‘The risk, public liability and economics of tailings storage facility failures’ Disponível em  &lt;https://www.earthworksaction.org/files/pubsothers/BowkerChambers-RiskPublicLiability_EconomicsOfTailingsStorageFacilityFailures-23Jul15.pdf.&gt; Acesso em 05 de Agosto 2020.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Armstrong, M., et al. (2019). "Why have so many tailings dams failed in recent years?" Resources Policy 63.

Fotos produzidas pelo Senado

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JOTA

Padrão global de segurança para a gestão das barragens de mineração

O tão aguardado lançamento do Global Tailings Review

Padrão global de segurança para a gestão das barragens de mineração