David Simon Naslavsky Aguiar

Passa Sisu, sai Sisu e o elefante continua na sala: o argumento de inclusão regional.
O elefante é a política de acréscimo na nota dos candidatos no Sisu, realizada por universidades federais e estaduais do Norte e Nordeste<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote1sym" name="sdfootnote1anc">[1]</a>, para garantir as vagas das universidades aos candidatos da região.
Para acessar o benefício, não é necessário ter estudado em escola pública, comprovar renda e ser preto, pardo ou indígena. Basta ser do local – o que pode se dar pela realização do ensino médio naquele lugar ou até mesmo com um comprovante de residência. É a "cota CEP".
É evidente que a "cota CEP" não foi prevista na Lei de Cotas, que criou política de ação afirmativa séria, baseada em critérios objetivos. Afinal, só uma razão irresistível, como anos de pobreza e discriminação negligenciadas, para justificar o tratamento desigual.
A astúcia das universidades – com chancela do Ministério Público – diz respeito a argumentar que: i. tais medidas visam a evitar a evasão escolar; ii. estariam amparadas pelo objetivo de desenvolvimento regional do art. 3º, III, CF; e iii. estariam previstas no art. 5º, §3º, do <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/decreto/d7824.htm">Decreto 7.824/12</a>, que regulamenta a Lei de Cotas.
Acontece que: i) não há prova da evasão escolar, muito menos causada por alunos de outros estados e nos cursos de medicina, onde a política costuma ser criada; ii) a persecução do desenvolvimento regional não é justificativa para entes federativos discriminarem brasileiros, o que viola o art. 19, III, CF; e iii) um decreto regulamentar não pode inovar a ordem jurídica e extrapolar o alcance da lei regulamentada, muito menos para se admitir a possibilidade de conselhos universitários legislar, com base numa suposta “autonomia universitária”, em afronta ao art. 84, IV, da CF.
A matéria tem chegado aos tribunais. O Supremo Tribunal Federal (<a href="https://www.jota.info/stf">STF</a>) já repudiou o critério regional para ação afirmativa, no julgamento da <a href="https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&amp;docID=752454083">ADI 4.868/DF</a>, que decidiu pela impossibilidade de conjugação do critério regional ao critério socioeconômico para a instituição de cotas. O que se dirá, então, apenas do critério regional – a "cota CEP" – como as universidades estão fazendo.
Nos Tribunais Regionais Federais, o entendimento majoritário é pela ilegalidade e inconstitucionalidade das políticas. Na maior parte das demandas, uma verdadeira chuva de mandados de segurança, tem-se impedido a discriminação perpetrada pelas universidades. Mas, como é natural ao mandado de segurança, só para os atentos e corajosos, dispostos a brigar no Judiciário.
A bola da vez é o Tema 474, que tem como leading case o RE 614.873/AM. Neste caso, decidiu-se pela inconstitucionalidade de lei do Amazonas que instituiu cotas regionais. Ainda não se fixou tese de repercussão geral, mas se anteveem duas posições: a do ministro Alexandre de Moraes, que entende medidas com base em critério regional discriminatórias, e a do ministro Luís Roberto Barroso, que admite a criação dessas políticas, desde que justificadas no caso concreto.
Resta esperar o Tema 474 para tirar o elefante da sala. Mas para isso é preciso torcer para que não seja “esquecido” como a ADI 4.868/DF. Ou que a tal da autonomia universitária não tenha, por acaso, revogado os artigos da Constituição Federal que tratam da vinculatividade das decisões do STF, pois os da igualdade já foram passados por cima.
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As opiniões contidas neste artigo são pessoais e não necessariamente representam a percepção das instituições às quais o autor esteja vinculado.
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<a class="sdfootnotesym" style="font-family: inherit; font-style: inherit; font-variant-ligatures: inherit; font-variant-caps: inherit;" href="#sdfootnote1anc" name="sdfootnote1sym">[1]</a> Algumas das universidades que aplicam o argumento de inclusão regional, inclusive discriminando alunos de estados ainda mais pobres, são UFAC, UFAM, UFPA, UPE, UFPE, UFPB, UFRN; e Univasf.

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JOTA

'Cota CEP' não foi prevista na Lei de Cotas, mas universidades continuam utilizando argumento da inclusão regional

O Sisu e o elefante na sala

'Cota CEP' não foi prevista na Lei de Cotas, mas universidades continuam utilizando argumento da inclusão regional no Sisu