Guilherme Freitas

Andréia Avelar Viana

Após 25 anos de discussão, o Supremo Tribunal Federal (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stf">STF</a>) irá concluir o julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade 39 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.625, ambas discutindo se a Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/oit">OIT</a>) estaria vigente no Brasil.
O julgamento está programado para ocorrer no plenário virtual entre os dias 19 e 26 de maio e algumas questões precisam ser esclarecidas, especialmente (i) o que realmente está sendo discutido, (ii) as consequências das possíveis decisões dos ministros do Supremo nos dois processos e (iii) as características do formato utilizado para o julgamento.
Inicialmente, é fundamental destacar que o pano de fundo do julgamento é exclusivamente de Direito Internacional, ou seja, os requisitos legais para que uma norma internacional seja válida no Brasil, mais especificamente se um Decreto Presidencial (<a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/d2100.htm">Decreto 2.100/96</a>) seria capaz, por si só, de denunciar a adesão do Brasil à <a href="https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236164/lang--pt/index.htm">Convenção 158 da OIT</a>, que versa sobre o “Término da Relação de Trabalho por Iniciativa do Empregador”.
Portanto, diferentemente do que está sendo veiculado em alguns meios de comunicação, é importante reforçar que o STF não está discutindo a legalidade/constitucionalidade da dispensa por justa causa sob o prisma de Direito do Trabalho e da interpretação que envolve a ingerência direta na ordem econômica, livre iniciativa, propriedade privada ou livre concorrência.
O papel dos ministros nos dois casos será exclusivamente de interpretar a Constituição Federal de 1988 em relação aos requisitos de denúncia de uma Convenção Internacional assinada pelo Brasil, interpretação que passará a ser adotada para todos os preceitos normativos decorrentes de acordos internacionais, inclusive a Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho.
É importante lembrar que as Convenções Internacionais são elaboradas para estabelecer regras e princípios da ordem jurídica internacional a partir de padrões mínimos que deverão ser observados pelos países que as ratificam, sendo quase sempre necessário que os países signatários criem leis internas para definir os requisitos e os efeitos das regras instituídas por referidas normas internacionais.
E o que estabelece a Convenção 158 e quais seriam as consequências das possíveis decisões do Supremo na ADC 39 e na ADI 1625?
O art. 4º da Convenção estabelece que “não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço”.
A norma cria para o ordenamento jurídico brasileiro a figura da “dispensa justificada”, que é diferente de dispensa por justa causa, que pode ocorrer exclusivamente por falta grave do empregado (art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho).
Tratando-se da validade da Convenção 158 da OIT, caso o Supremo considere que a norma não foi denunciada pelo Decreto Presidencial 2.100/96, considerando seu caráter programático, os requisitos e os efeitos da chamada “dispensa justificada” precisam ser definidos em Lei Complementar, nos termos do art. 7º, inciso I, da Constituição Federal, bem como da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST)<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Portanto, ainda que os ministros do STF entendam que a Convenção não foi denunciada pelo mencionado Decreto presidencial, não teria aplicação imediata no Brasil, dependendo ainda de um longo e necessário processo legislativo para a edição de uma Lei Complementar regulamentando as consequências da dispensa motivada. Até lá as empresas poderão continuar dispensando normalmente trabalhadores sem justa causa, desde que paguem a indenização estabelecida na legislação em vigor.
Finalmente, é interessante notar que os processos foram incluídos na pauta de julgamento do plenário virtual. De acordo com o sítio do próprio STF<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>, “trata-se de um espaço deliberativo remoto por meio do qual os ministros podem interagir de maneira assíncrona, e registrar seus votos e manifestações durante o período de tempo da sessão virtual”.
Na prática, o plenário virtual não é uma sessão de julgamento com discussões e deliberações em tempo real, sendo que as sustentações orais são gravadas e disponibilizadas pelos advogados antes do início do julgamento.
Inicialmente pensado para votação de casos em repercussão geral, a escolha do formato de plenário virtual para o julgamento da ADC 39 e da ADI 1625 pode ter sido acertada, especialmente para incentivar uma análise ainda mais técnica (e reservada) sobre um tema tão relevante (e polêmico).
Espera-se que o Supremo coloque um fim à discussão envolvendo a Convenção 158 da OIT com foco em segurança jurídica e, principalmente, sem criar uma onda de judicialização em relação aos contratos de trabalho encerrados anteriormente.
Portanto, o caminho mais seguro seria a modulação de efeitos para que a eficácia do julgamento seja prospectiva, solução proposta por Teori Zavascki durante a apresentação do seu voto-vista na ADI 1625. Afinal, como ressaltado pelo próprio ministro, “esse é um caso daqueles precedentes cuja decisão do Supremo fica como marca na história do constitucionalismo brasileiro”.
<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> AIRR-1430-79.2014.5.17.0007
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> <a href="https://portal.stf.jus.br/hotsites/plenariovirtual">https://portal.stf.jus.br/hotsites/plenariovirtual</a>

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

STF julga no plenário virtual entre os dias 19 e 26 se norma internacional está vigente no Brasil

O que realmente importa sobre a Convenção OIT 158

STF julga no plenário virtual entre os dias 19 e 26 se norma internacional da Convenção OIT 158 está vigente no Brasil