Thiago Gomes Anastácio

Cabeças rolam e os hipócritas de plantão tentam um pouco de sucesso, regozijando-se em suas falsas intelectualidades instigadas pelo jorro das artérias alheias. 
Está revelado: imbecis de todas as espécies fazem parte de nossa fauna jurídico social e diante do caos se revelam de uma mediocridade de dar medo. Trata-se de um problema originado, fundamentalmente, por nossos ancestrais italianos, portugueses e espanhóis, os pais desse amontoado chamado América Latina que caminha para dois palmos abaixo do fundo do poço. 
“Tadinhos dos presos”? Em um país minimamente sério a questão não é de humanismo - pois essa questão já é sedimentada - mas de Lei. 
Lei com letra maiúscula e não minúscula como a nossa, que vai encolhendo a cada passo em que a desrespeitamos.
Supremo Tribunal Federal, Ministério da Justiça e a população perdem-se nessa grande novidade que já tem uns 300 anos ou, ao menos, desde o iluminismo penal de Beccaria, Gramattica e Verri. 
O assunto sistema penitenciário é um “museu de grandes novidades”.
Os cárceres brasileiros sempre foram um antro. Um nojo. A maior parte dos doutores que falam sobre ele nunca colocaram seus Ferragamos e Labotains neles. Nem mesmos os criminalistas de boutique, essa geração (a minha) que pensa ser a advocacia criminal uma miscigenação de lobbys em Brasília, reuniões com poderosos de segundo e terceiro escalão e milhões de reais em honorários. 
A sensação de insegurança e o alarma criado pelas facções têm em comum sua relação (doloso ou culposa) com a maior estrutura criminosa que já se teve notícia: o Estado brasileiro.
Ele e suas instituições são os criadores do crime organizado. Quando colocaram os traficantes dos anos 70, um bando de pé rapados desorganizados, com os meio intelectuais da resistência, a ideia da união para se fortalecer, fez o ladrão. E os brasileiros aplaudiram extasiados a prisão dos criminosos políticos e o milagre brasileiro!
Década e meia depois o Massacre do Carandiru – que é de culpa dos políticos, não dos policiais militares – a situação piorou e muito.
O PCC se organizou, virou o estado de São Paulo de cabeça para baixo e o que fez o governo de São Paulo? Um acordo com seus líderes. Isso foi confessado pelo Secretário Penitenciário à época. Fazer acordo com criminosos é crime. 
E capitaneado por mentes tão brilhantes (isso é uma ironia), pegaram o câncer nascido da inação estatal e lançaram metástases para todo o Brasil. Sim, ao tirar do estado os líderes do PCC, nossos gênios de plantão espalharam essa facção para todo o país.
Agora, o Ministro da Justiça, ex- promotor de Justiça paulista, propõe em sua sanha de ser governador paulista mais um milagre: criar um conselho com membros da sociedade civil, promotores e juízes. 
Mas esse conselho já existe, é qualificado, o alertou para todos os problemas de hoje (como alertara os Ministros anteriores), mas ele, como os anteriores, não ouviu o Conselho.
Trata-se do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, presidido pelo livre docente em Direito Penal, Profº Alamiro Velludo Salvador Neto. Os tivessem ouvido, não estaríamos nessa situação. 
1. Um antigo aviso e a cólica penitenciária: um dia daria merda.
O livro mais importante sobre as prisões brasileiras foi escrito por Roberto Lyra, ministro da cultura do governo parlamentarista de João Goulart e, sem favor, o mais brilhante dos promotores de justiça brasileiros. Nenhum, depois dele, tocou seus calcanhares.[1]
Em “O que virá depois das prisões – Penitência de um penitenciarista”, Lyra revelou seu sincero arrependimento por ter enviado ao cárcere centenas de pessoas, acreditando e pedindo para que todos acreditassem (juízes e jurados) que os encarcerados voltariam à sociedade penitenciados e aptos ao convívio comum.
A obra, imortal, é o mais perfeito libelo contra a prisão como método penal. E repita-se: não foi escrita por um advogado, mas pelo maior símbolo do ministério público brasileiro.
Lyra, evidentemente, não foi ouvido. Um país que exilou Rui Barbosa não daria ouvidos à Roberto Lyra. O discurso de mais e mais prisões sempre foi mais sedutor, como todo e qualquer discurso simplista proferido para ouvidos ignorantes.
Dizia Lyra: “os cárceres são as escolas do crime”. Não se prestou atenção, e trinta anos depois surgiria o CV, e pouco depois o PCC, aliciando os condenados por crimes sem violência a se tornarem traficantes e ladrões de banco.
Dizia Lyra: “Querem resolver os problemas da prisão? Ouçam os presos”. Não os ouvimos e, para piorar, tratamo-los como animais. 
Resultado: vez por outra, eles irrompem nossas consciências com rebeliões e atentados criminosos espalhados pelas cidades, como em 2004. Hoje é notório que o PCC nasceu de uma necessidade humana dos presos: acabarem com as torturas e os maus tratos que sofriam.
Mas as ilegalidades não findaram. E o massacre do Carandiru, só colocaria fogo naquele barril de pólvora. E hoje a situação não parece ter mais controle. A exemplo dessas primeiras organizações, vieram mais dezenas de outras controlando o tráfico de drogas, armas e crimes patrimoniais de dentro dos presídios.
O assunto é tão batido que nem parece ter muita importância o que, em verdade, é assustador: “de dentro dos presídios”. 
O estado e seus impostos sustentam os QG’s do crime. Os celulares entram por conta da corrupção de agentes do estado. Pessoas desnecessariamente presas (furtos de shampoos, sabonetes etc.) ficavam meses e meses presas em contato com essas organizações por culpa de um judiciário retrógrado (embora informatizado) e sacerdotal.  
O exemplo do Rio de Janeiro é ainda mais assustador: até a Polícia aprendeu com essas organizações criminosas e vários de seus integrantes criaram milícias. Parece piada, mas não é: a pretexto de combater organizações criminosas existentes, policiais criaram outras organizações criminosas.
2. Tentativas de soluções racionais, discursos vazios e a hipocrisia dos livres
De lá para hoje excelentes iniciativas foram tomadas, como a fomentação de entidades privadas e pelo Estado brasileiro de departamentos (DEPEN) e conselhos (CNPCP). Mas qualquer bom conselho dessas entidades, ligadas ao Ministério da Justiça, é logo rechaçado pelo político “em chefe”. 
São verdadeiros “espantalhos de legalidade” na plantação dos interesses políticos; sem vida, mas lembrando os abutres que não devem surrupiar os bons milhos.  
Em contrapartida, surgem os messias. A presidente do Supremo Tribunal Federal foi uma das maiores incentivadoras das restrições ao Habeas Corpus; mas agora, diante de cabeças e membros cortados, sinaliza para a necessidade de esvaziar presídios. 
Talvez o STF envie aos presos algumas centenas de pás e britadeiras, pois sem o habeas corpus só mesmo com túneis e buracos se seria capaz de tirar, com celeridade, inocentes (de fato, ou presumidamente) de dentro dos presídios. Ou tirar os presos que não deveriam estar lá. 
Advogados também apresentam propostas intergalácticas como a criação de habeas corpus coletivos (quase não se tem mais nem o individual e querem os coletivos?), a soltura de condenados antes do tempo previsto da condenação etc.
Haja sardinha para todo mundo puxar. Em realidade, a sociedade brasileira não se importa com isso, porque temos a cultura do lixo humano. 
O preso nada mais é do que um ser humano carimbado e descartável, pois que é, invariavelmente, de cores e status sociais diferentes dos que escrevem nos blogs dos jornais e revistas, dos apresentadores de telejornais e dos nossos correspondentes internacionais. 
Não tem a mesma educação, podem até torcer para o mesmo time - no caso dos flamenguistas e corintianos – mas não seriam capazes de se comunicar, ao menos por mais de 5 minutos, com um formador de opinião social ou com uma moradora do 6º andar de um prédio no bairro dos Jardins. As mortes nos presídios não diferem muita as dos cachorros atropelados nas estradas para essas pessoas.
Isso não é escrito por forças marxistas. Longe disso! Mas apenas para deixar claro a absoluta ausência de identificação que têm-se com os encarcerados. Se humanos, são sub humanos e olhe lá.  
Dois exemplos da parafernália hipócrita que vivemos em pleno ano de 2017. Exemplos humanos talvez reforcem a hipótese que levanto.
Um moça, de cultura judaica, apaixonou-se por um homem preto, servidor público. Paixões da carne e coração andavam juntos. Ela estava no terceiro casamento. Um dia lhe perguntei: “- Mas porque você não larga seu marido e fica com ele, para viver esse amor?”. Ela disse: “- Minha família jamais aceitaria um preto pobre”.
Outro caso.
Advogado de primeira água no assunto liberdade de expressão, descobriu que a mulher da sua vida (que não era a sua esposa) estava em um momento especial. E mesmo assim virou sua vida de cabeça para baixo. Ambos sempre souberam que o amor era entre eles. Ele, mestre da liberdade de expressão, não se divorciou para ficar com seu amor por medo de falar para seus pais sobre o divórcio e pelo julgamento social que recairia sobre seus ombros; ou pela tristeza dos pais em ter um filho divorciado. Nem se diga que obrigou a própria esposa a fazer um aborto para poder viver seu amor por outra. O garantidor das liberdades de expressão, por medo de falar e ser julgado por falar, voltou com a esposa e hoje finge ser feliz.
Racismo, discriminação social, hipocrisia entre as condutas pessoais e o próprio trabalho, falsos status na busca por nobreza. Essa é a geração dos trinta e poucos. E para ficar claro, apenas dois exemplos foram expostos. Quantos mais conhecemos? E quantos desconhecemos? Qual será a extensão disso?
E se tantos os que conhecemos são assim, imaginem como votam, como se manifestam sobre os rumos do país. Quiséramos ter um país cheio de cidadãos, inteligentes e cheios de espírito como um fraternal amigo, que deixou as aparências para ser feliz. 
Filho de tradicional família judaica, saiu do armário quase aos trinta anos. Um dia lhe perguntei se ele já havia contado para a avó paterna – uma daquelas senhoras rígidas, preconceituosas, as típicas avós dos que tem mais de 30 anos – e ele me saiu com essa, sem dúvida a maior pérola que ouvi na vida:
“Não, vou esperar namorar um negão. Porque aí ela vai se preocupar que ele é preto e não que eu sou gay”. Ela faleceu antes de saber.  
3. A solução
Basta de arranjos políticos para a nomeação de cargos de suma importância. O apoio parlamentar deve vir pelo comungar de ideias, não pelo jogo pelo poder. Coloque-se gente qualificada e não simples representantes de instituições e partidos para pensarem os verdadeiros problemas do país.
Depois disso, é só cumprir a lei. É o caminho mais fácil e o único certo.
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[1] Foi ele o responsável pelo fim da primeira onda de absolvição de criminosos passionais (outra viria nos anos 50/60), quando ainda era comum se alegar a perturbação dos sentidos e da inteligência para absolvê-los. Foi também um dos nossos três maiores penalistas e criminólogos, tendo participado das comissões elaboradoras do código penal de 40.

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JOTA

Basta de arranjos políticos para a nomeação de cargos de suma importância

O livro mais importante sobre prisões é de Roberto Lyra

Basta de arranjos políticos para a nomeação de cargos de suma importância