Mariana Fabietti

Tiago Carneiro

Todos os países da Europa introduzirão, até o final de 2023, uma alíquota efetiva mínima de 15% sobre os rendimentos auferidos em cada jurisdição onde operam. Esse foi o acordo chamado Pilar Dois, fechado em dezembro de 2022, com entrada em vigor em dezembro de 2023.
As Regras do Modelo do Pilar Dois (também chamadas de Regras “Anti Global Base Erosion”, “GloBE” ou simplesmente Pilar Dois) fazem parte de um acordo para enfrentar os desafios fiscais da digitalização da economia que foi tratado pelos membros da <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ocde">OCDE</a> e endossado, em outubro de 2022, pelos líderes do G20, do qual o Brasil faz parte.
Um dos objetivos dessa medida é inibir a introdução de incentivos fiscais excessivamente generosos para competir por investimentos. Especialmente nos países em desenvolvimento, que, não raras vezes, utilizam incentivos fiscais para atrair recursos estrangeiros, os benefícios concedidos podem não atingir os objetivos pretendidos, resultando em ganhos desmedidos para os investidores e perdas desnecessárias das receitas públicas.
Com a entrada do Pilar Dois em vigor, as empresas que tenham, pelo menos, € 750 milhões em capital consolidado deverão pagar uma alíquota efetiva de, no mínimo, 15% de tributação sobre os rendimentos auferidos em cada jurisdição onde operam.
O Pilar Dois fornece um padrão normativo a ser observado pelas jurisdições, para que implementem regras, no direito interno, que objetivam, fundamentalmente, desenvolver um sistema coordenado de tributação, destinado a garantir que grupos de grandes empresas multinacionais (MNE) paguem um percentual mínimo de imposto sobre a renda proveniente de cada uma das jurisdições onde operam.
Os contribuintes abrangidos pelo Pilar Dois calculam a sua alíquota efetiva de imposto para cada jurisdição onde atuam e pagam o imposto complementar pela diferença entre a alíquota efetiva e os 15%, por jurisdição. Espera-se que o imposto complementar seja geralmente cobrado na jurisdição da controladora final da multinacional, mas existe a possibilidade de que as jurisdições introduzam regras no sentido que os 15% sejam pagos em cada jurisdição, com base na mecânica do Pilar Dois.
À primeira vista, poder-se-ia pensar que o Brasil, com uma alíquota de 34% (25% de imposto de renda mais 9% de CSLL) ficaria fora desse limite. Mas não é bem assim. O ponto de partida aqui é o cálculo da alíquota efetiva do imposto sobre a renda. Naturalmente, primeiro se calcula a renda e depois o imposto pago sobre ela. Aí está o desafio que obrigará muitos contribuintes a reavaliar seus negócios, especialmente seus benefícios fiscais. Vamos a um exemplo simples de cálculo de alíquota efetiva.
<table>
<tbody>
<tr>
<td width="368">Receita antes dos impostos</td>
<td width="66">1.000</td>
</tr>
<tr>
<td width="368">Incentivos fiscais</td>
<td width="66">300</td>
</tr>
<tr>
<td width="368">Juros sobre capital próprio</td>
<td width="66">100</td>
</tr>
<tr>
<td width="368">Receita tributável</td>
<td width="66">600</td>
</tr>
<tr>
<td width="368">Alíquota 34%</td>
<td width="66">204</td>
</tr>
<tr>
<td width="368">Provisão para impostos diferidos</td>
<td width="66">130</td>
</tr>
<tr>
<td width="368">Imposto sobre a renda a pagar</td>
<td width="66">74</td>
</tr>
<tr>
<td width="368">Alíquota efetiva do imposto sobre a renda</td>
<td width="66">12%</td>
</tr>
</tbody>
</table>
Conforme visto acima, calcula-se a alíquota efetiva com a divisão do imposto pago pela receita tributável da empresa.
A alíquota do imposto complementar devido é a diferença entre a taxa mínima de 15% e a alíquota efetiva na jurisdição, calculado com base em  fórmula específicas, proporcionais à participação relativa aos ativos de cada entidade jurídica e quantidade de funcionários. Consequentemente, quanto maior o benefício fiscal fruído, menor será sua alíquota efetiva e maior o imposto complementar na jurisdição da controlada.<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>
Portanto, espera-se um impacto sobre a eficácia de certos incentivos fiscais, exigindo das empresas uma reavaliação cuidadosa de seus planejamentos tributários, em um ambiente pós-Pilar Dois.
De acordo com as novas regras, as jurisdições continuarão a poder usar alguns benefícios fiscais para atrair investimentos, mas as regras desencorajarão o uso de políticas de incentivos que não agreguem investimentos ou geração de empregos.<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>
Assim, o Pilar Dois propõe o equilíbrio certo entre criar um ambiente atraente para investimentos e proteger as finanças públicas. Trata-se de um desafio importante para as políticas de incentivos fiscais em muitos países em desenvolvimento.<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>
Importante notar que essas regras não se aplicam a empresas nacionais ou subsidiárias de grupos multinacionais com receitas inferiores a € 750 milhões, o que restringe, substancialmente, o alcance do Pilar Dois. A despeito disso, espera-se que a introdução de um imposto mínimo global, ainda que para um conjunto notadamente restrito de empresas, revolucione o direito tributário internacional e concorrencial.
<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> As regras do Pilar Dois ainda permitem que se uma jurisdição já tiver a exigência de um mínimo de 15% de alíquota efetiva que seja consistente com as Regras Modelo do Pilar Dois, tal imposto pode ser creditado na controlada.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> OECD. Organization for Economic Co-operation and Development. Tax Incentives and the Global Minimum Corporate Tax: Reconsidering Tax Incentives after the GloBE Rules. Paris: OECD Publishing, 2022, p. 6. Disponível em: <a href="https://doi.org/10.1787/25d30b96-en">https://doi.org/10.1787/25d30b96-en</a>. Acesso em: 10 jan. 2023.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Ibid., p. 11.

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JOTA

A despeito de alcance limitado no início, espera-se que a medida europeia revolucione o direito tributário internacional

O imposto mínimo global

Imposto europeu passará a operar com alíquota efetiva mínima de 15% sobre os rendimentos auferidos até o final de 2023