Roberto Maluf Filho

Em época de resoluções de ano novo, abandono de velhos hábitos e aproximando-se do encerramento da 56ª legislatura, os holofotes da vida pública voltam-se às inovações normativas que fazem parte da transição governamental e aos prognósticos legislativos dos próximos anos. As atuais instituições precisam saber receber novas alterações normativas, e esse deve ser um dos desafios da administração e dos órgãos que a controlam.  
Em especial, deve-se questionar como o Tribunal de Contas da União (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/tcu">TCU</a>) pode ser impactado por inovações normativas e de que modo ele pode acolher da melhor maneira novos dispositivos legais, num cenário em que suas decisões têm abrangido cada vez mais áreas da atuação da administração. Em outras palavras, de que maneira a jurisprudência consolidada de um ente tão relevante para o atual direito administrativo, como o é o TCU, lidará com eventuais e possíveis alterações legislativas, esperadas para este e para os próximos anos que virão? 
O ainda embrionário <a href="https://www.congressonacional.leg.br/materias/materias-bicamerais/-/ver/pl-2481-2022">PL 2481/2022</a> ilustra o questionamento proposto, no sentido de como futuras normas podem afetar o TCU. Proposto em setembro do ano passado pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o projeto pretende reformar a <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9784.htm">Lei 9.784/99</a>, atual Lei de Processo Administrativo Federal, nacionalizando-a e deixando expressa sua aplicação, também, aos tribunais de contas. Apesar de seu caráter incipiente, destaca-se a inclusão da possibilidade de participar nos processos em que tenha interesse como um dos direitos dos administrados (artigo 3º), em prestígio à ampla defesa e ao contraditório em processos administrativos. 
Não que esses princípios não sejam assegurados em processos administrativos no TCU; mas, em algumas situações, o tribunal adota uma interpretação mais restritiva da ampla defesa e do contraditório em seus processos. Não é recente a jurisprudência segundo a qual os autores das denúncias e seus representantes não são considerados interessados nos processos que provocaram. Segundo o TCU, mesmo após apresentar a denúncia, o autor deve provar “razão legítima” ou “possibilidade de lesão a direito subjetivo próprio” para intervir nos autos. Somente depois de admitido como interessado é que o denunciante poderá participar do processo, inclusive como legitimado para interpor recursos.  
Se o PL 2481/22 for aprovado, também seria possível a revitalização dessa jurisprudência da corte, já que a participação em processos em que tenha interesse passaria a ser presumida pela lei, ainda com mais vigor, como direito dos administrados. Isto é, seria aberta nova margem de argumentação para se propor a dispensa do ônus do denunciante de provar sua legitimidade em denúncia a que ele próprio deu causa perante o TCU.  
A questão é como o TCU pode recepcionar futuras normas e, eventualmente, atualizar sua jurisprudência, respeitando os atos já consumados e garantindo segurança jurídica às novas decisões. Além de pesquisas e do acompanhamento dos julgados da corte, que ajudam organizar e divulgar a visão do TCU sobre novos dispositivos legais , o próprio órgão de controle pode adotar medidas positivas nesse sentido, como, nos casos concretos, a celebração instrumentos consensuais com os responsáveis e, de maneira geral, a publicação de respostas a consultas, a revisão de normas internas e a elaboração de súmulas; o aumento da segurança jurídica é tratado pela própria LINDB como dever das autoridades (artigo 30). 
O TCU sabe como fazê-lo. Especialistas já destacaram que a publicação da Resolução 344/2022 pelo tribunal, que reconhece a existência de prescrição ressarcitória e punitiva em seus processos, em consonância com a própria jurisprudência do STF, é um exemplo de medida que valoriza a segurança jurídica. Ainda que a discussão sobre a prescrição no âmbito do TCU não envolvesse a superveniência de leis, mas sim a aplicabilidade daquele instituto aos processos de contas, a atuação da corte nesse sentido deve ser a mesma para alterações legislativas que surjam daqui para a frente e impactem a jurisprudência consolidada do tribunal. 
Novas legislações que busquem aprimorar o direito administrativo têm lugar na jurisprudência, mesmo que sedimentada, de órgãos como o TCU. Que as mudanças normativas de 2023 e dos próximos anos sejam acolhidas adequadamente, prestigiando a segurança jurídica e os direitos dos administrados.

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JOTA

PL 2481/2022 é um dos exemplos de proposições legislativas que podem afetar o tribunal

O impacto de novas legislações sobre a jurisprudência do TCU

Novas legislações que busquem aprimorar o direito administrativo têm lugar na jurisprudência, mesmo que sedimentada, de órgãos como o TCU