Alexandre Frayze David

O Brasil é autossuficiente em petróleo. O Brasil é uma potência verde. A <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/petrobras">Petrobras</a> é uma empresa focada na transição energética. O Brasil corre o risco de ter falta de diesel. Todas as frases acima são verdadeiras, mas guardam profunda contradição, tornando a missão de compreender o futuro do mercado de hidrocarbonetos do Brasil difícil. Mas enquanto o futuro de longo prazo mantém um véu de incerteza grande, dado que não há consolidação clara sobre o futuro da matriz energética ideal (entre hidrogênio, fotovoltaica, eólica, nuclear etc.), o presente é bastante claro: a atual política de preços proposta pela Petrobras é impossível de ser sustentada.
As razões são já conhecidas, mas vamos recapitulá-las. Muito embora o Brasil seja, de fato, autossuficiente na produção de <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/petroleo">petróleo</a>, não possui capacidade de refino correspondente, significando dizer que, embora tenha toda a matéria-prima de que precise, não consegue transformá-la em produto (gasolina e diesel) apto para uso interno. A falta de capacidade é particularmente sentida para o diesel nas regiões Norte e Nordeste.
Historicamente, esta disparidade entre o prospectado e o transformado era suprida por empresas distribuidoras do setor privado, que ocuparam esse vazio e importavam o óleo diesel e gasolina para revendê-los no mercado interno, atendendo assim o excedente de consumo que a produção interna não conseguia suprir.
Contudo, a recente alteração da política de preços da Petrobras, que se desapegou da chamada “paridade internacional”, trouxe como consequência a implantação de uma prática concorrencial desleal, pois enquanto a Petrobras abastece o mercado com diesel “a preço de custo”, por assim dizer, as importadoras se viam obrigadas a comprar o mesmo produto no mercado internacional a “preço de mercado”, substancialmente maior, o que dificultava ou impossibilitava o seu repasse ao mercado interno.
O limite desta disparidade foi sentido recentemente, quando algumas regiões registraram desabastecimento de diesel, cenário parcialmente pacificado pelo reajuste de preços divulgado pela Petrobras, mas que ainda persiste em face da elevação do preço do barril de petróleo no mercado internacional. Mas, a despeito desta pequena correção de rota que ainda não deixa clara a postura efetiva da petrolífera nacional, é fato que a proposta de manter uma política de preços “internos” tem gerado outras duas consequências nocivas ao país que merecem ser sopesadas.
De um lado, cria uma diferença sensível de preço para o combustível nas diferentes regiões do Brasil, tornando mais barato para os estados onde há capacidade de refino já instalado, e mais cara onde o abastecimento conta com a importação de agentes independentes, fato este que serve para aumentar ainda mais as desigualdades regionais históricas do país.
De outro, prejudica o desenvolvimento do mercado de energia alternativas e ambientalmente mais amigáveis, em particular o etanol combustível para os carros, gás veicular para os caminhões e eletrificação para os ônibus, dada a dificuldade econômica de se justificar frente ao preço subsidiado da gasolina e do diesel. Isto sem se falar nas usinas fotovoltaicas de menor porte, não raro substituídas por geradores a diesel para abastecer supermercados, hotéis etc. O cenário que temos hoje no mercado de combustíveis é, portanto, incompreensível. Irracional até.
Ouvimos o discurso de nosso governo federal em prol de uma revolução na direção da energia sustentável, com propostas de liderança mundial no setor parelhas com anúncios de investimentos estaduais em infraestruturas de energia elétrica e de hidrogênio, e, ao mesmo tempo, notamos a orientação para que a petrolífera nacional mantenha uma política de preços de subsídio aos combustíveis fósseis e avance com novos investimentos neste setor tradicional. E tudo isto enquanto sufocamos o mercado privado que por décadas atendeu às necessidades do país com investimentos próprios, dando flexibilidade e capacidade de reação em momentos de crise internacional.
A nosso ver, é mais adequado (e coerente) que a orientação do governo federal seja uniforme tanto ao mercado, quanto à sua investida, orientando a Petrobras a manter o seu foco no desenvolvimento de novas tecnologias e soluções energéticas, aproveitando-se das margens existentes no mercado internacional (ainda que vendendo internamente) para permanecer à frente de sua efetiva concorrência.
Afinal, o conjunto de agentes privados pode tranquilamente suprir as necessidades pontuais do mercado de hidrocarbonetos enquanto a Petrobras lidera o movimento a caminho de uma matriz energética mais amigável ao meio ambiente. O respeito aos preços internacionais não somente dará o fôlego financeiro necessário para que a Petrobras cumpra bem esta missão, mas também abrirá espaço para que as novas tecnologias se provem competitivas e encontrem o seu mercado.
Parece claro que, se o Brasil quer mesmo liderar o mundo na busca de uma matriz energética correta, precisa antes de tudo compreender que a política atual de subsídio aos combustíveis mantida pela Petrobras precisa ser revista, como medida necessária para não somente assegurar a sobrevida do mercado interno, mas retirar a pressão no aumento das desigualdades regionais e abrir caminho para o desenvolvimento de soluções alternativas ambientalmente mais amigáveis.

20/04/2018-P-74 no campo de Búzios no pré-sal da Bacia de Santos

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JOTA

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