Marina Fontão Zago
Professora na Faculdade de Direito da USP. Doutora em Direito do Estado pela USP e mestra em Gestão e Políticas Públicas pela EAESP-FGV/SP. Advogada com experiência em infraestrutura, regulação e políticas públicas
Quase vinte anos após a edição da Lei das Organizações Sociais (Lei Federal nº 9.637/1998), a União publicou seu primeiro regulamento: o Decreto Federal nº 9.190, de 1º de novembro de 2017.
De início, ressalte-se que o decreto aplica-se apenas para a administração federal, isto é, para órgãos e entes da União. Isso significa que as relações entre OSs e entes estaduais e municipais continuarão regidas pelas normas gerais trazidas pela Lei nº 9.637/1998, bem como pela legislação e regulamentação do ente federativo em específico, caso existente. O Decreto nº 9.190/2017, portanto, não se aplica – nem mesmo subsidiariamente – para as relações travadas por Estados e Municípios com as OSs.
O Decreto tem por objetivo principal regular o art. 20, Lei nº 9.637/1998, instituindo o Programa Nacional de Publicização (“PNP”) no âmbito da administração federal. O PNP prevê a absorção, pelas OSs, de atividades que são atualmente desenvolvidas por órgãos e entes federais, buscando parcerias estáveis e de longo prazo para a prestação, com foco nos usuários, de serviços de interesse da comunidade.
Além da instituição do PNP, o Decreto prevê uma série de regras e procedimentos para (i) a qualificação das entidades como OS e (ii) a celebração de contratos de gestão entre essas entidades e a administração federal.
De fato, uma das principais inovações do Decreto é “juntar” essas duas etapas, condicionando a qualificação como OS ao processo de publicização de determinada atividade e de celebração do contrato de gestão.
Assim, deverá haver, inicialmente, a decisão de publicização de uma atividade que seja enquadrada no âmbito art. 1º, Lei nº 9.637/1998 (ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, meio ambiente, cultura e saúde), conforme os procedimentos previstos no Decreto (art. 7º).
Tomada a decisão de publicização da atividade, será iniciado procedimento de seleção das entidades interessadas em executá-la, por meio de procedimento de chamamento público (cf. regras do art. 8º e seguintes, Decreto). Note-se que, nesse momento, a entidade interessada não precisará já ter sido previamente qualificada como OS – embora deva deter todos os requisitos para tal.
Selecionada a entidade, esta será, então (e somente nesse momento), qualificada como OS, por ato do Presidente da República e após as manifestações dos Ministros responsáveis (art. 13, Decreto).
Após ser qualificada como OS, a entidade deverá celebrar, em seguida, o contrato de gestão com a entidade da administração federal responsável (art. 14, Decreto).
Com isso, portanto, entende-se que deixará de haver a qualificação de entidades como OS que seja desvinculada da efetiva celebração de um contrato de gestão.
Por fim, ressalte-se que o Decreto afasta a aplicação das novas regras de seleção às entidades que já sejam qualificadas como OS (art. 27) – embora imponha a adequação dos contratos de gestão vigentes às suas disposições (art. 28).
Com essas novas regras, o Decreto nº 9.190/2017 passa a ser mais um diploma a ser considerado no marco regulatório das entidades do terceiro setor, especialmente para as entidades que atuam (ou pretendem atuar) em projetos em âmbito federal.