Anna Soubbotina

Haruka Abe

O cenário brasileiro de preços de transferência passou por mudanças significativas com a recente adoção do padrão Arm's Length e o maior alinhamento de métodos e requisitos de documentação com a prática internacional. As novas regras de preços de transferência entram em vigor a partir do exercício social iniciado em 1º de janeiro de 2024 e dão aos contribuintes a opção de adotá-las com um ano de antecedência, para 2023. Essas mudanças regulatórias levaram a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/receita-federal">Receita Federal do Brasil</a> (RFB) a lançar uma Instrução Normativa preliminar para consulta em 3 de julho de 2023. A principal dúvida que fica é: as empresas brasileiras estão preparadas?
Os métodos de preços de transferência descritos nos novos regulamentos são uma mudança dos métodos históricos de preços de transferência baseados em fórmulas do Brasil para aqueles alinhados com as Diretrizes de Preços de Transferência da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para Empresas Multinacionais e Administrações Fiscais (as Diretrizes da OCDE). De acordo com as Diretrizes da OCDE, o retorno da parte testada pode ser avaliado pelo método de margem líquida transacional (TNMM) ou pelo método de custo acrescido (CPLM), ambos baseados em uma pesquisa para identificar empresas comparáveis. A recente Instrução Normativa indica a preferência pela utilização de empresas nacionais comparáveis para operações brasileiras, indicando que pode haver diferenças significativas nas circunstâncias econômicas de diferentes mercados. Neste artigo, compartilhamos nossa experiência com a disponibilidade de empresas brasileiras comparáveis.
Em 14 de junho de 2023, o presidente brasileiro assinou a Lei 14.596, promulgando a Medida Provisória 1.152 e iniciando mudanças significativas no sistema brasileiro de preços de transferência. A jornada rumo a essas mudanças começou há muitos anos, principalmente quando o Brasil manifestou interesse em ingressar na OCDE em maio de 2017.
Pelas antigas regras da Lei 9.430/96, dois métodos comumente usados para avaliar a rentabilidade das empresas brasileiras são o método do Preço de Revenda Menos Lucro (PRL) e o método do Custo de Produção Mais (CPL). Tanto o método PRL quanto o CPL ofereciam uma margem fixa pré-aprovada (em torno de 20-40%) que as empresas poderiam usar para avaliar o retorno das entidades brasileiras.
No entanto, com a nova Lei, os contribuintes deixarão de aplicar o conceito de margem fixa pré-aprovada e passarão a aplicar o método MCL (i.e., custo mais lucro) ou MLT (i.e., margem líquida da transação) para estabelecer o arm's length intervalo para os retornos a serem obtidos pelas partes brasileiras testadas. A Instrução Normativa detalha os métodos de preços de transferência MCL e MLT, que geralmente estão alinhados com os métodos CPLM e TNMM, respectivamente, conforme as Diretrizes da OCDE. Ambos métodos dependem de uma busca para identificar empresas comparáveis com preferência por empresas comparáveis no mercado geográfico onde a parte testada opera.
Para entender o panorama das empresas brasileiras com informações publicamente disponíveis que poderiam ser usadas para analisar atividades interempresariais brasileiras de rotina comuns, como distribuição e prestação de serviços, realizamos uma pesquisa de alto nível para procurar empresas brasileiras privadas e públicas em todos os setores e funções. Aplicamos critérios de seleção que estão amplamente alinhados com os descritos pela OCDE em sua publicação intitulada “Documento de consulta pública: Pilar Um – Valor B”.
Esses critérios eliminam primeiramente as empresas com status de operação inativa, informações financeiras insuficientes ou operações e resultados financeiros controlados. Em seguida, aplicamos códigos de classificação industrial padrão ampla (SIC) e telas quantitativas e, finalmente, revisamos as descrições de negócios das empresas restantes. Essas etapas foram destinadas a eliminar empresas que possuem propriedade intelectual valiosa, possuem grandes quantidades de ativos fixos ou se dedicam a atividades muito diferentes, como mineração, agricultura ou prestação de serviços de utilidade pública.
Após esse processo de triagem, 30 a 40 empresas brasileiras permaneceram em funções, níveis de mercado, setores e grupos de produtos antes de realizar qualquer revisão detalhada ou análise de comparabilidade. Por exemplo, essas empresas operam em vários setores e categorias de produtos, incluindo produtos médicos, produtos agrícolas e diversos bens de consumo. Os serviços prestados incluem tecnologia e serviços digitais, serviços de contact center, serviços de gerenciamento de instalações, serviços de logística e cadeia de suprimentos e serviços de turismo e hospitalidade.
A recente Instrução normativa indicou a preferência da RFB por empresas comparáveis locais. No entanto, nossa pesquisa indica que pode haver menos de vinte empresas brasileiras disponíveis como ponto de partida para a análise de algumas das funções de rotina mais comumente comparadas, como distribuição e serviços. Para fins de comparação, as pesquisas de empresas dos Estados Unidos (EUA) geralmente rendem várias centenas no estágio inicial do processo de pesquisa, antes de realizar uma análise de comparabilidade detalhada. O número de empresas brasileiras pode não ser suficiente para criar benchmarks de mercado locais autônomos, especialmente se a indústria, o nível de mercado ou o mix de produtos/serviços de uma parte testada forem considerados. Por exemplo, nenhuma consultoria de gestão ou prestadores de serviços de vendas e marketing que passaram em todos os critérios de triagem foram observados.
Conforme observado acima, o pool inicial limitado e a escassez de informações quantitativas e qualitativas de empresas locais provavelmente representam desafios para os contribuintes na identificação de um número suficiente de empresas brasileiras comparáveis. Nesses casos, permite a utilização de empresas de outras regiões, desde que ajustes razoáveis possam ser feitos para compensar eventuais diferenças significativas. Para ilustrar esse conceito, a RFB incluiu um exemplo desse ajuste no Anexo I da Instrução Normativa. Este método consiste em calcular a diferença do prêmio de risco-país e aplicar essa diferença ao capital empregado pelas empresas comparáveis.
Embora permitir que empresas regionais comparáveis trate do desafio de empresas limitadas comparáveis no Brasil, os contribuintes poderiam se beneficiar de mais esclarecimentos sobre outros ajustes aceitáveis. Por exemplo, orientação sobre ajustes de capital de giro seria inestimável. As recentes altas taxas de juros no Brasil amplificam o impacto da contabilização do capital de giro. Instruções claras sobre como calcular e incorporar tais ajustes permitiriam que as empresas alinhassem suas práticas de preços de transferência com os novos regulamentos de forma eficaz.
O entendimento e a adaptação às próximas diretrizes serão cruciais para as empresas envolvidas em transações intercompanhias com partes relacionadas ao Brasil. As empresas devem analisar o impacto potencial das novas regras em suas posições fiscais locais e globais, incluindo a opção de implementação antecipada para 2023.

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JOTA

Adaptação às próximas diretrizes serão cruciais para as envolvidas em transações intercompanhias

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