Alex Vasconcellos Prisco

O novo CPC revigorou o tratamento dos negócios processuais, a fim de deixar mais explícita que o Código de 1973 a ampla capacidade das partes para convencionarem, antes ou durante o litígio judicial, sobre seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, de forma a ajustar o procedimento às especificidades da causa. Trata-se, no entanto, de um modelo jurídico em estágio embrionário, pendente de desenvolvimento e maturação para que possa desde já ser usado como segura ferramenta de arquitetura contratual. Afinal, diante da verdadeira cláusula geral de atipicidade dos negócios processuais trazida pelo atual Código, será preciso alguns bons anos de aplicação normativa até que se forme uma doutrina e jurisprudência minimamente estáveis e uniformes, capazes de orientar previamente os contratantes a respeito daquilo que pode ou não se fazer em termos de clausulado procedimental. Tocará aos operadores do direito, portanto, trabalhar na construção teórica e prática do instituto do negócio processual, fixando as possibilidades e limites dos inúmeros e variados tipos de disposições contratuais geradoras de efeitos no processo estatal de resolução de conflitos.
Nessa linha de experimentalismos, entre as espécies de negociações processuais que vêm sendo idealizadas no âmbito doutrinário, cogita-se do pacto para intervenção de terceiro no processo fora das hipóteses legais. Arranjos assim são de grande utilidade no ambiente interconectado dos contratos empresariais, onde não raro é recomendável aos contratantes regularem como será eventual interação com terceiros titulares de situações jurídicas discutidas em litígios com impactos diretos ou indiretos na operação contratada.
A experiência demonstra que diante da complexa dinâmica do relacionamento empresarial, nem sempre é possível acomodar e proteger todos os interesses em jogo pelo uso dos esquemas de intervenção de terceiro pré-moldados na lei processual. Mesmo a figura da assistência (simples ou litisconsorcial), fenômeno interventivo bem comum, muitas vezes se revela limitada e insatisfatória. É que nela, por exemplo, o interesse puramente econômico, ainda que relevante, não é suficiente para autorizar o ingresso do terceiro na demanda. A este incumbe ir além e comprovar seu interesse jurídico, o que nem sempre é viável.
A exceção é a União, que por disposição expressa de lei pode intervir nas causas em que suas autarquias, fundações públicas e empresas estatais forem autoras ou rés, independente de interesse jurídico. Basta que haja mero interesse econômico. 
Pois bem.
Será que essa sistemática, conhecida como intervenção anômala, pode agora ser estendida às partes privadas pela via do negócio processual, quebrando a rigidez do arquétipo legal da assistência? Exemplo: grupo de empresas que ajustam previamente nos seus respectivos atos constitutivos que a sociedade controladora poderá intervir nos processos que suas controladas figurarem como autoras ou rés, caso a decisão venha a acarretar graves reflexos econômicos à controladora e/ou ao conglomerado como um todo. Fica previsto, ainda, que a controladora poderá ingressar nos autos para esclarecer questões de fato e de direito, bem como juntar documentos e memoriais reputados úteis à análise da matéria pelo Judiciário.
Também é possível mediante negócio processual de intervenção de terceiro tornar mais efetivo o exercício do direito de preferência, mecanismo que de uma forma ou de outra está sempre presente nos contratos empresariais e que, diante da atipicidade de certos ajustes, não conta com disciplinamento legal adequado.
Nesse sentido, figure-se uma cláusula em contrato de arrendamento de maquinário industrial, dispondo que no caso de penhora dos bens arrendados promovida por credores particulares do arrendante, o arrendatário terá a opção de comprá-las, intervindo no processo para depositar em juízo o valor do preço, em substituição aos equipamentos penhorados. O arrendatário interveniente poderia se manifestar em eventual perícia de avaliação das máquinas, sendo-lhe franqueada a apresentação de quesitos, indicação de assistente técnico e até a interposição de recursos.
Essas são apenas algumas das múltiplas funcionalidades que podem ser criadas a partir da ampla abertura do sistema processual vigente.
Não se desconhece, todavia, que os negócios processuais atípicos de intervenção de terceiro têm potencial para causar grande desordem processual. O temor de sua utilização massificada e sem critérios pelas partes era a justificativa da doutrina da lei processual anterior para advogar a total impossibilidade de convenção nesse sentido. Diziam (e talvez ainda digam) que terceiros somente podem ser admitidos no processo judicial nas hipóteses legalmente previstas.
Entendemos, no entanto, que a mentalidade dialógica e flexível almejada pelo novo CPC permite abrandar esse posicionamento, máxime na seara das relações interempresariais, em que há presunção de equilíbrio das partes na autorregulamentação de seus interesses privados. 
Ao menos nessa área, deve ser abandonada a ideia da negação apriorística e absoluta dos ajustes atípicos de intervenção processual de terceiro. Por outro lado, tendo em vista que realmente a disseminação indiscriminada dessas cláusulas pode resultar em balbúrdia processual, caberá ao juiz exercer rigoroso controle desses pactos nos casos concretos. A atenção deverá ser redobrada quando uma das partes da demanda não participar da convenção interventiva. Embora seja desnecessário que ela expresse sua concordância com o negócio processual feito entre a sua contraparte no processo e o terceiro, é imperativo que o envolvimento deste no processo se dê sob o crivo de um contraditório reforçado, de maneira que a cláusula de intervenção só produzirá efeitos externos se isso se der de forma cooperativa com os interesses dos litigantes e sem maiores prejuízos à celeridade e à efetividade da jurisdição. Ademais, cláusulas dessa natureza são inaplicáveis em procedimentos cuja lei de regência não admita a intervenção de terceiros, como é o exemplo dos juizados especiais.
Espera-se, enfim, que essa cláusula geral de atipicidade dos negócios processuais propicie um modelo procedimental maleável, onde a autonomia privada influencie decisivamente nos métodos de realização da justiça pelo Estado, trazendo ganhos de eficiência ao processo civil.

Law concept

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Um modelo jurídico em estágio embrionário, pendente de desenvolvimento e maturação

Negócio Processual e Intervenção de Terceiros

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