José Alfredo Graça Lima

Países, como seres humanos, têm necessidades. Suas estratégias e ações no plano externo são ou devem ser desenhadas e executadas em função dessas necessidades.
O Brasil, potência agro-energético-ambiental, necessita de insumos e bens intermediários para aumentar a produtividade de sua indústria manufatureira, necessita de investimentos para obras de infraestrutura, e necessita de produtos acabados que pode adquirir a preços inferiores aos da produção doméstica, de maneira a satisfazer a demanda dos consumidores de baixa renda.
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Por ser auto-suficiente nos itens que são efetivamente essenciais para atender necessidades básicas, a saber, alimentos e energia, o Estado brasileiro não depende, como algumas economias industriais, do abastecimento externo para eliminar a fome e os males derivados da falta de acesso àqueles itens.
Nessas condições, faz todo sentido empreender uma reforma da política comercial com o objetivo de reverter a trajetória de concentração de renda que caracterizou o processo de industrialização nacional, fazendo com que a proteção e a subsidiação, por restritivas e discriminatórias, cedam lugar a um plano de redução tarifária gradual, capaz de tornar a economia mais competitiva e a sociedade mais bem atendida.
Também parece claro que, para evitar desequilíbrios resultantes de uma abertura unilateral ou soberana, urge um esforço concentrado visando à defesa e ampliação de nossos direitos de acesso aos mercados consumidores de commodities, inclusive, e sobretudo, os processados, objeto de entraves e/ou exigências que não se aplicam aos bens in natura.
Urge, de resto, que a política externa de qualquer país que se disponha a se inserir na ordem internacional, através de um fluxo de comércio e de investimentos mais vigoroso, esteja perfeitamente sintonizada com essa política comercial mais consentânea com os princípios e objetivos do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês) e dos acordos negociados na Rodada Uruguai.
Será, no mínimo, contraproducente tentar estabelecer relações comerciais mais sólidas com os numerosos compradores de nossos bens e serviços e, ao mesmo tempo, emitir sinais políticos e/ou diplomáticos desnecessariamente controversos ou mesmo contrários a compromissos assumidos em nome até de princípios constitucionais consagrados.
<blockquote class="jota-article__eye">Não pode haver contradição entre uma estratégia de autonomia pela participação e pela integração global e manifestações de alinhamento que venham a prejudicar a imagem de neutralidade favorável às transações internacionais.</blockquote>
Para ser justo, dada a prioridade que normalmente se atribui ao atendimento de necessidades básicas, declarações infelizes ou entreveros diplomáticos produzem ruído mas, a rigor, não interferem no cumprimento dos contratos comerciais. Não é, tampouco, crível que acordos preferenciais, ainda que compatíveis com as regras multilaterais, contribuam para a criação de comércio por não alterar substancialmente o regime comercial das partes. Basta lembrar que à maior parte das operações de compra e venda de bens e serviços se confere o tratamento de nação mais favorecida, princípio basilar do sistema multilateral de comércio.
Comércio internacional, como assinala Paulo Estivallet de Mesquita, é área em que mais claramente sobressai a necessidade da cooperação entre os países. E é uma bênção que um país como o Brasil, cujo Produto Interno Bruto (PIB) é alto mas mal distribuído, tenha alcançado níveis de produtividade tão expressivos para a agroindústria. Graças à produção e exportação de alimentos, de energia e de minérios, o Brasil levanta receitas para pagar as importações indispensáveis ao seu desenvolvimento econômico e social.
Quando o Brasil, em fins de 1994, procedeu a uma reforma tarifária perfeitamente unilateral, de comum acordo com seus parceiros de Mercosul, foi preciso efetuar ajustes para evitar surtos em mercados de produtos “sensíveis”, mas, feito isso, não foi a indústria adversamente afetada e até hoje existe uma diferença substancial entre a tarifa consolidada na Organização Mundial do Comércio (OMC) e a tarifa efetivamente praticada. É no interesse do próprio País reduzir o custo das suas importações, de modo a melhor atender às necessidades da sua indústria e da sua sociedade.
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O comércio como necessidade

Reflexões sobre o caso brasileiro