Jeronimo Roveda

A discussão sobre as concessões florestais e os direitos dos povos originários, quilombolas e tradicionais ganhou novos contornos, com a recomendação do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/mpf">Ministério Público Federal</a> de suspender todos os projetos de <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/credito-de-carbono">crédito de carbono</a> que envolvem populações indígenas no Amazonas.
É uma questão delicada. Exige equilíbrio entre, de um lado, respeitar a autonomia e a cultura dessas populações e, de outro, dar segurança jurídica para projetos que trarão as receitas necessárias precisamente para a sustentação dessas comunidades, e para a proteção ambiental.
<h3><a href="https://conteudo.jota.info/marketing-lp-conversao-jota-pro-energia">Conheça o monitoramento nos Três Poderes sobre os principais assuntos do setor de energia feito pela solução corporativa do JOTA PRO Energia</a></h3>
Nas concorrências públicas para estradas, redes de energia, ferrovias e outras obras de infraestrutura, cabe ao poder concedente, no processo de tomada de decisão, levar em conta a presença de comunidades indígenas nesses territórios, para então realizar  consultas apropriadas e seguir ou não com a concessão ou licitação.
O mesmo se aplica aos projetos de carbono. Em ambos os casos, é preciso aplicar a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, sobre Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI).
No caso dos projetos de carbono, há ainda a Lei de Concessão das Florestas Públicas, regulamentada pelo <a href="https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-12.046-de-5-de-junho-de-2024-563759808">Decreto 12.046/2024</a>, que obriga as empresas a repassar receitas obtidas com atividades econômicas em terras indígenas. Esses recursos devem ser aplicados no desenvolvimento socioeconômico dos povos indígenas e comunidades locais da região e em ações de proteção das unidades de conservação e dos territórios.
As obras de infraestrutura geram impactos nos territórios, pelas alterações físicas que introduzem, pela circulação de pessoas de fora e pela criação de uma economia temporária e precária. Já nas concessões florestais não há, nem deve haver, qualquer prejuízo ao modo de vida tradicional das comunidades que ali habitam. Em especial no momento que vivemos hoje, quando a proteção das florestas em que elas vivem  se torna imperativa, para evitar mais catástrofes ambientais, incluindo as queimadas.
O propósito dos projetos de carbono é justamente valorizar e remunerar por aquilo que as populações locais já fazem, seja pela proteção da floresta, seja pelo incremento das suas atividades de renda tradicionais. E possibilitar que isso se perpetue ao longo do tempo, impulsionando a independência financeira e valorização do seu bem-viver, de acordo com a especificidade de cada comunidade.
Entretanto, estão sendo criadas exigências e procedimentos muito mais rígidos para a concessão de florestas do que jamais se impuseram às grandes obras de infraestrutura que impactam negativamente as comunidades.
A CPLI não é a mera fase de um projeto, mas um instrumento vivo, que precisa ser revisitado sempre que haja o menor indício de qualquer ação naquele território ou entorno que atinja determinada comunidade. Ainda que efetivamente não tenha sido realizada consulta prévia ao edital de licitação de áreas no Estado do Amazonas, os contratos para desenvolvimento dos projetos somente serão assinados após a consulta dessas comunidades. E mais, é de responsabilidade da desenvolvedora manter essa consulta latente para sempre se utilizar dela quando entender sua mínima necessidade.
<h3>Maturidade</h3>
Esse tipo de exigência nunca foi visto em nenhuma obra de infraestrutura. As concessões florestais para geração de créditos de carbono estão num estado de maturidade muito maior que qualquer grande empreendimento que atinja diretamente e negativamente as populações tradicionais.
A metodologia exige isso. As constantes auditorias monitoram o cumprimento dessa exigência. Se ela for descumprida, simplesmente os créditos de carbono não serão emitidos pelo órgão certificador.
Portanto, o mercado de crédito de carbono está apto a cumprir com todas as exigências necessárias para garantir que os direitos dos povos originários e tradicionais sejam respeitados em todas as fases dos projetos. E indiretamente fortalecer o processo de consulta diante de cada projeto que possa impactar as comunidades.
O Brasil desempenha um papel central nesse grave momento de emergência climática. É uma janela de oportunidade de protagonismo para o nosso país, valorizando o que temos de mais importante, nossa biodiversidade e sua preservação.
Mais importante ainda: o financiamento climático é a forma mais rápida de levar recursos a quem sempre protegeu as florestas e nunca foi recompensado por isso — os povos que vivem nelas. Tanto assim que 98,5% dos municípios da região amazônica apresentam índices de desenvolvimento humano menores do que os das demais regiões do Brasil.
Será que não estamos errando a mão sobre o que realmente temos que nos preocupar? Se existe abuso e desrespeito às comunidades indígenas,  temos o dever de corrigir. Mas simplesmente negar oportunidades é a melhor forma de proteção?
Vivenciamos tanto desrespeito, mortes, usurpação dos direitos das comunidades indígenas, neste e em outros momentos, e parece que não temos sido tão rigorosos e contundentes com quem as feriu. As grandes obras não pararam, as intervenções nos seus territórios não pararam.
Optar pela paralisação daquilo que pode ser a alternativa mais rápida e eficaz de promover justiça ambiental, climática e econômica às comunidades indígenas é mesmo a melhor alternativa? Será que, mais uma vez, o Brasil vai perder a oportunidade de ser uma grande e real referência de proteção dos direitos das comunidades indígenas aliada a preservação ambiental e emancipação econômica dessas comunidades por meio do financiamento climático?

praticas esg mercado de carbono 09 02 2024

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Mercado de crédito de carbono está apto a cumprir com todas as exigências necessárias

Não há conflito entre financiamento climático e respeito às comunidades

Mercado de crédito de carbono brasileiro está apto a cumprir com todas as exigências necessárias