Vinicius Da Silva Fonseca

A recente operação de incorporação das ações da Linx pela Stone suscitou algumas controvérsias entre seus acionistas e demais agentes do mercado financeiro.
Em resumo, propõe-se a incorporação das ações de emissão da Linx pela STNE, subsidiária da StoneCo, conferindo-se aos atuais acionistas da Linx duas ações preferenciais obrigatoriamente resgatáveis da STNE para cada ação da Linx por eles titularizada, uma a ser resgatada mediante pagamento em dinheiro e a outra a ser resgatada por meio da entrega de BDRs StoneCo.
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Entretanto, foi ao redor da multa compensatória prevista no item 8.1, (iv), do acordo de associação firmado entre as companhias que gravitou parte significativa dos debates suscitados pela operação, eis que ela seria devida, dentre outras hipóteses, caso os acionistas da Linx não aprovassem (i) a operação de incorporação de ações, (ii) a dispensa de a STNE realizar a OPA prevista no Artigo 43 do estatuto social da Linx (poison pill) ou (iii) a dispensa de adesão da STNE ao Novo Mercado.<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>
A referida multa compensatória tinha sido fixada inicialmente no valor de R$ 151 milhões, posteriormente revisto para o patamar de R$ 112 milhões, equivalente a aproximadamente 1,6% do valor total da operação. Porém, a Stone acabou por renunciar ao direito de exigir o pagamento da multa caso sobreviesse alguma das situações descritas anteriormente na AGE da Linx.
Vale frisar que a renúncia sucedeu à manifestação da Diretoria de Emissores da B3 no sentido de que os administradores da Linx não poderiam ter constituído qualquer ônus sobre a deliberação prevista no art. 46, parágrafo único, do Regulamento do Novo Mercado, que trata da adesão da sociedade resultante da operação de reorganização societária àquele segmento de listagem.<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>
<blockquote class="jota-article__eye">Registre-se que apesar das controvérsias, a operação foi aprovada pela maioria absoluta dos acionistas da Linx no dia 17 de novembro.</blockquote>
A multa compensatória é definida como uma obrigação acessória estipulada com o fim de reforçar o cumprimento de uma obrigação principal, ou, em caso de inadimplemento da obrigação principal, de preordenar o montante da indenização que será devida à contraparte do negócio jurídico.
De igual maneira, no âmbito das operações de M&amp;A as multas compensatórias têm por objetivo não só incentivar o adimplemento das obrigações ajustadas nos instrumentos da operação como também desde logo fixar o valor da indenização devida na hipótese de sua não conclusão.
O ponto nodal, entretanto, está na atenção que deve ser dispensada pelos administradores das companhias, notadamente aquelas com ações negociadas em bolsa e sem controlador definido, à negociação do valor da multa compensatória que tenha como hipóteses de incidência a rejeição da operação ou de alguma de suas condições precedentes pelos acionistas da companhia alvo.
Isso porque, ausente um acionista controlador com quem possa desde logo garantir a aprovação da operação na AGE da companhia alvo, o potencial comprador buscará elevar ao máximo os ônus de uma eventual rejeição da operação, inclusive valendo-se da multa compensatória como instrumento de coerção da vontade dos acionistas a fim de alcançar o quórum qualificado do Art. 136 da Lei n° 6.404/76.
Dessa forma, a administração da companhia alvo deve atentar para que a referida penalidade não sirva antes como meio de coerção da vontade dos acionistas do que propriamente um meio de justa indenização à parte lesada pelo eventual fracasso da operação.
De acordo com estudos citados nos pareceres que instruíram a proposta da administração da Linx, o valor das multas compensatórias em pelo menos nove recentes operações de M&amp;A envolvendo companhias abertas com ações negociadas em bolsa variaram de 1,4% a 16,4% do valor total da transação.<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>
Parece-nos, contudo, que o melhor referencial para avaliar se a penalidade está sendo empregada ou não com o propósito de constranger os acionistas a aprovarem a operação está no dimensionamento do impacto que o eventual pagamento da multa causaria ao regular desenvolvimento das atividades da companhia e não na mera relação entre o valor da multa compensatória e o valor total da transação.
O valor total da transação refletirá as expectativas futuras de fluxo de caixa e lucro da companhia alvo, logo, trata-se de valor que não reflete a sua situação patrimonial no momento da operação, motivo pelo qual o eventual pagamento da multa compensatória, ainda que representativa de uma pequena fração do valor total da transação, poderá comprometer a capacidade da companhia de continuar a desenvolver regularmente as suas atividades.
No caso da Linx, fosse aplicada a multa compensatória nos patamares inicialmente estipulados no item 8.1, (iv), do acordo de associação, ela corresponderia a um percentual entre 20% e 14% do caixa, equivalentes de caixa e aplicações financeiras da companhia reportados no último balanço divulgado antes da operação, ou seja, um valor que poderia ter efeitos deletérios para a companhia, notadamente diante do contexto econômico atual.<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>
Frisa-se, portanto, que os administradores devem atentar, no processo de negociação do valor da multa compensatória, não só para os custos efetivamente incorridos pela contraparte com assessores, due diligence, avaliações patrimoniais, dentre outros, quanto para a capacidade de a companhia eventualmente efetuar o pagamento da multa sem comprometer suas operações futuras, impedindo que a penalidade seja utilizada como um meio para constranger os acionistas a votarem favoravelmente à operação com o fim de evitar um dano ainda maior à sociedade.
Na hipótese de os acionistas rejeitarem a operação e considerarem o valor da multa compensatória excessiva, restariam ainda as seguintes medidas, ambas tangenciando a destituição dos administradores que concorreram para a estipulação da penalidade no patamar questionado.
Por um lado, os acionistas poderiam deliberar pelo ajuizamento de medida judicial tendo por objeto a revisão da multa devida com fundamento no Art. 413 do Código Civil, embora se considere remota a probabilidade de sucesso, notadamente a partir das alterações promovidas pela Lei n° 13.874/2019 nos Arts. 421 e 421-A do Código Civil, eis que se trata de obrigação estipulada em contrato empresarial paritário cujas hipóteses de revisão são estritamente excepcionais.
De outro modo, os acionistas poderiam deliberar pelo ajuizamento de ação de responsabilidade civil contra os administradores da companhia visando a recomposição dos danos suportados em decorrência do pagamento da penalidade, na forma do Art. 158, inciso I da Lei n° 6.404/76.
Por fim, parece-nos recomendável a inclusão, nos estatutos das companhias com ações negociadas em bolsa e sem controlador definido, de regras que fixem limites para o pagamento de multas compensatórias em operações de M&amp;A nas hipóteses de rejeição da operação ou de alguma de suas condições precedentes pelos acionistas, utilizando-se como referenciais os indicadores de liquidez da sociedade e a exigência de capital para a continuação regular de suas atividades, delimitando-se a atuação dos administradores e evitando-se a instrumentalização da multa compensatória como meio de coerção da vontade dos acionistas.
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O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
https://youtu.be/-hMj5lwWXEE
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a>Advogado, pós-graduando em Advocacia Empresarial pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CEPED/ UERJ) e bacharel em direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a>https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/0f096bac-7f76-4ace-96d0-af7eab4e55a5/04d57f46-77ab-e57c-668f-de0de89f9179?origin=2
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a>Art. 46, p. u., do Regulamento do Novo Mercado: “Caso a reorganização envolva sociedades resultantes que não pretendam pleitear o ingresso no Novo Mercado, a maioria dos titulares das ações em circulação da companhia presentes na assembleia geral deve dar anuência a essa estrutura”.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a>https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/0f096bac-7f76-4ace-96d0-af7eab4e55a5/3e318c17-8db4-ea27-e538-db21aebe60b0?origin=1
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a>https://www.rad.cvm.gov.br/ENET/frmGerenciaPaginaFRE.aspx?NumeroSequencialDocumento=98152&amp;CodigoTipoInstituicao=1

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