Leonardo Coelho Ribeiro

A recém-editada MP 700 promove alterações significativas na disciplina das desapropriações, concorrendo para favorecer a aceleração de projetos de infraestrutura. O faz, contudo, não sem o risco de banalizar o emprego do mecanismo, que consiste na forma mais gravosa de intervenção imperativa na propriedade, e por isso deve ser manuseado com parcimônia e zelo, em atenção ao direito fundamental à propriedade privada cumpridora de sua função social. 
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O emprego da desapropriação no contexto de empreendimentos de infraestrutura é um ponto muitas vezes central para o seu sucesso. Seja o projeto capitaneado pelo poder público, seja pela iniciativa privada, fato é que quanto maior for a sua extensão física, e quanto menos infraestrutura prévia existir, grandes dificuldades serão colocadas na etapa inicial de liberação das áreas necessárias para sua implantação. 
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A desapropriação, dessa forma, desempenha papel fundamental em projetos greenfield, como ocorre na expansão de uma linha metroviária e na construção de uma nova ferrovia ou dutovia, para ficarmos em três exemplos.
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Não bastasse isso, é também comum que, em casos envolvendo a concessão de serviços públicos precedida de obras públicas, a definição da repartição dos riscos envolvendo a liberação de áreas e seu custeio configure um fator impactante no cronograma previsto, repercutindo sobre a equação econômico-financeira do projeto concessionário.
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A desapropriação é, portanto, sem espaço para dúvidas, um dos gargalos que atravancam o desenvolvimento da infraestrutura nacional. Por esse lado, seu aperfeiçoamento vem a calhar.
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É nesse sentido que a MP 700/2015 altera o famigerado Decreto Lei nº 3.365/1941, dedicado a disciplinar as desapropriações por utilidade pública, fazendo incursões que ampliam o espaço de emprego da desapropriação. 
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A possibilidade de promoção da desapropriação passa a ser franqueada não só a concessionários de serviços públicos e estabelecimentos de caráter público, ou que exerçam funções delegadas, mas também, expressamente, a concessionários de serviços públicos em regime de parceria público-privada – PPP, permissionários, autorizatários, arrendatários e contratados pelo Poder Público para fins de execução de obras e serviços de engenharia sob os regimes de empreitada por preço global, empreitada integral e contratação integrada. Neste último caso, prevê ainda que caberá ao edital definir o responsável por cada fase do procedimento expropriatório, o orçamento estimado para sua realização e a distribuição objetiva de riscos entre as partes, incluído o risco pela variação do custo das desapropriações em relação ao orçamento estimado. 
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A ampliação de promotores/beneficiários da desapropriação é importante, mas há ao menos dois pontos iniciais que demandam enfoque mais intenso.
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O primeiro deles é o de que a legislação segue amparada no critério da titularidade da atividade para empenhar a desapropriação em seu favor, quando o mais adequado seria voltar esforços para a utilidade pública gerada, que é o produto final realmente importante à coletividade. Quer dizer: há empreendimentos privados que geram benefícios para a coletividade, independente da atividade ser caracterizada como um serviço público dependente de delegação. O critério não é, portanto, o mais seguro para se alcançar as finalidades desejadas.
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Melhor seria, a meu ver, que se migrasse de uma lógica predominantemente subjetiva, da titularidade da atividade, ou supostamente objetiva, de conteúdo do regime jurídico incidente, para uma lógica finalística, da utilidade da atividade, mediada por um procedimento capaz de aferir se as utilidades que serão geradas efetivamente importam à sociedade, para que também não haja espaço excessivo de conformação ao gestor público, limitando a tentação dos desvios.
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De outro lado, a nova redação proposta amplia o rol de beneficiários, mas não sem assumir algum risco desmedido. É que, novamente, portar um título habilitante do poder público não necessariamente importa em depender do emprego proporcional da desapropriação para o exercício de uma atividade de utilidade pública. A referência genérica aos autorizatários, por exemplo, coloca em um mesmo grupo indivíduos e empresas que hoje recebem matizes muito diferentes – um ambulante de praia pode ser considerado autorizatário, assim como o empreendedor de um Terminal portuário de uso privado –, não sendo mais possível encontrar uniformidade na colocação, o que faz do critério pouco certeiro. 
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Além dessa ampliação de beneficiários, outro ponto a ser destacado diz respeito à previsão de que “os bens desapropriados para fins de utilidade pública e os direitos decorrentes da respectiva imissão na posse poderão ser alienados a terceiros, locados, cedidos, arrendados, outorgados em regimes de concessão de direito real de uso, de concessão comum ou de parceria público-privada e ainda transferidos como integralização de fundos de investimento ou sociedades de propósito específico.”
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A previsão é extremamente útil para emplacar projetos de infraestrutura, especialmente em cenários econômicos nos quais o Estado não dispõe de muitos recursos para investimentos diretos, mas pode se utilizar da desapropriação para viabilizar os projetos e agregar valor a áreas contíguas, criando um novo ativo. 
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O ponto, no entanto, pode ser reconduzido à crítica anterior: se o critério definidor da utilidade pública não for seguro, a hipótese pode acenar com o risco de banalizar o manejo da desapropriação, que não se pode esquecer, é medida de intervenção extrema na propriedade e, desse modo, deve ser empregada com excepcionalidade. 
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A regra deve ser a proteção do direito fundamental à propriedade privada cumpridora de sua função social, e não sua relativização em termos tão abrangentes. 
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No mais, as alterações procedidas no Decreto Lei nº 3.365/1941 perdem a chance de avançar tanto rumo à consensualidade, que tem o potencial de reduzir os custos públicos da desapropriação, como indicam os Princípios do Equador, quanto no critério indenizatório, um dos pontos mais tormentosos da matéria, haja vista que o processo de desapropriação tem se mostrado muitas vezes injusto quando, em sua etapa indenizatória, não são contempladas as peculiaridades presentes no caso concreto, que revelam que a justa indenização vai além do simples valor de mercado do bem. 
Não custa lembrar que o DL nº 3.365/1941, tendo sido editado durante o Estado Novo, denota certo viés autoritário e anacrônico, e segue carecendo de uma reforma harmonizadora com a Constituição democrática de 1988. Alargar o espaço de aplicação das desapropriações pode facilitar o avanço de projetos de infraestrutura, mas no formato até aqui desenhado, não sem implicar custo relevante sobre o direito fundamental à propriedade privada. A pergunta que deixou de ser feita, e precisa ser respondida, é: a sociedade está disposta a pagar esse preço?

Palácio do planalto

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JOTA

Texto pode acelerar projetos, mas há risco de banalizar instrumento

MP 700, desapropriação e infraestrutura

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