Carlos Eduardo Navarro

Chama-se de “tese do século” a “tese” tributária que se sagrou vencedora no Supremo Tribunal Federal (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stf">STF</a>) por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 574.706. Em síntese, segundo a Corte, o <a href="https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/icms-entenda-os-aspectos-fundamentais-13052021">ICMS</a> não deve estar incluído na base de cálculo do PIS e da Cofins, pois ele representa receita dos estados e não dos contribuintes.
Confesso que sempre achei a tese ruim. O ICMS – assim como o ISS e o próprio <a href="https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/pis-cofins-13052021">PIS/Cofins</a> – é um tributo que compõe o preço da mercadoria, e, portanto, sempre foi contabilizado como receita do vendedor de bens ou serviços.
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>Ocorre que, ignorando o conceito contábil de receita bruta (e isso ficou claro no voto vencido do ministro Dias Toffoli), o STF entendeu que receita contábil não é, necessariamente, receita jurídica (isso, aliás, sempre esteve claro na parte final do “caput” dos artigos 1º das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, mas, nós tributaristas, sabemos que não é fácil dissociar essas duas coisas).
Com a vitória no STF, os contribuintes passaram a entender que os chamados tributos sobre vendas deveriam, todos eles, serem excluídos das bases de cálculo das contribuições, de modo que o conceito jurídico de receita bruta se tornaria equivalente ao conceito contábil de receita líquida.
Do ponto de vista de política fiscal, a tese seria um grande avanço, pois acabaria com o famigerado cálculo por dentro, ao menos para o PIS e a Cofins – já que o tributo sobre tributo seguiria existindo no <a href="https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/iss-entenda-os-aspectos-gerais-13052021">ISS</a> e no ICMS. Muitos pensaram que o STF, portanto, inauguraria novos tempos, impondo maior transparência ao cálculo dessas contribuições (que teriam bases imponíveis mais alinhadas com o que ocorre nos IVAs mudo afora).
Nesse contexto, o Poder Judiciário foi inundado com as chamadas “teses filhotes”. Algumas delas mais “certas”, pois tratando de PIS/Cofins (notadamente as exclusões do ISS e das próprias contribuições), e outras mais “incertas”, pois tratando de outros tributos cujas bases de cálculo também são, direta ou indiretamente, receita bruta (como ocorre com a CPRB e o IRPJ/CSLL pelo lucro presumido).
Ocorre que, no Brasil, nada é certo. O mesmo tribunal que, em um momento, afirma que o ICMS é receita do estado, se viu, recentemente, prestes a dizer que o ISS é receita do contribuinte. O voto que abriu divergência contra os contribuintes, também de lavra do ministro Toffoli, caso se mostre vencedor, fará com que nenhum de nós tenha a menor ideia do que é receita bruta jurídica.
Lá no início dos anos 2000, quando do surgimento do regime não cumulativo das contribuições, havia certa segurança em afirmar que a base de cálculo do PIS/Cofins equivalia à receita bruta contábil, ou seja, a soma da receita líquida e dos chamados tributos sobre venda.
Após o julgamento do RE 574.706, criou-se uma expectativa de que as contribuições passariam a ser calculadas sobre receita líquida contábil (receita bruta contábil subtraída dos tributos sobre vendas). Mas, se o ISS não for excluído, a pergunta que fica é: qual o conceito de receita bruta jurídica?
<blockquote class="jota-article__eye" dir="auto">Por que devemos excluir o ICMS e não o ISS? E os demais tributos sobre vendas?</blockquote>
E não pergunto apenas do PIS/Cofins, mas há outros tributos que podem ser assim classificados, como a CIDE combustíveis, o IOF, etc. Será que faz sentido vivermos ao sabor do acaso, observando, sem qualquer prognóstico, o julgamento de cada uma das teses filhotes por ministros que aparentam não ter qualquer rigor ou preocupação com o conceito jurídico de receita?
Como disse no início desse texto, nunca gostei da tese em questão. Se fosse ministro do STF à época, teria, muito provavelmente, seguido o voto do ministro Dias Toffoli.
Ocorre que, uma vez que a tese foi vencedora, a Corte deve se comportar de maneira rigorosa, delimitando um conceito jurídico de receita que faça algum sentido e, especialmente, que dê segurança jurídica (para os atuais tributos sobre vendas e para outros que possam surgir no futuro).
Ou os tributos sobre venda estão dentro ou estão fora. Por que um poderia estar dentro e fora? “Porque a arrecadação precisa” não é uma resposta aceitável.

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JOTA

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