Carmen Sfeir Jacir

Quem deseja resolver uma disputa sobre reestruturação ou recuperação empresarial de forma célere, econômica, consensual e ainda preservar relacionamentos, pensa na mediação. Diversas normativas incentivam a utilização deste método de resolução de disputas no Brasil, especialmente desde o início da pandemia de Covid-19.
A seção II-A da Lei 11.101/2005, modificada pela Lei 14.112/2020, regula expressa e detalhadamente a utilização da mediação na recuperação judicial e extrajudicial, que consiste num conflito multipartes, no qual os participantes têm vínculos preexistentes ao processo, por ser empregados, fornecedores ou parceiros comerciais da recuperanda, dentre outras possibilidades. Com a mediação eles contam com a possibilidade de chegarem a acordos para resolver a disputa e preservar seus relacionamentos, permitindo o soerguimento e reinserção na economia por parte do empresário ou sociedade empresária em dificuldades.
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>A negociação, conduzida através da mediação, basear-se-á nos interesses dos credores e da recuperanda, e não somente nas pretensões individuais ou só de alguns, para assim facilitar o soerguimento da recuperanda e proteger os legítimos interesses de todos credores<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Os mediadores, terceiros imparciais e independentes, auxiliam os mediandos para restabelecer a comunicação, restaurar a confiança e desenvolver opções que criem valor para todos os envolvidos. Tais alternativas de solução que os mediandos criam, ajudados pelo mediador, sempre dentro do que permite a lei e o plano de recuperação judicial, podem facilitar à empresa em recuperação ou em dificuldade a venda de todos ou de alguns dos seus bens e assim obter a necessária liquidez para oferecer pagamento das suas dívidas, por exemplo.
Tais alternativas de solução também podem consistir em receber determinados produtos ou serviços do devedor como pagamento das suas dívidas, o que pode dar lugar ao nascimento de novos negócios e novas oportunidades para devedor e credor. Ou seja, trata-se de opções “fora da caixa”, diferentes das clássicas que se reduzem à discussão sobre o montante a pagar e ao prazo de pagamento.
A utilização dessas técnicas de negociação é permitida ao mediador expressamente pelo §3º do artigo 166 do Código de Processo Civil, que estabelece que se admite “a aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição”. 
Dentro daquelas técnicas de negociação está a etapa de criação de opções ou “chuva de ideias” (brainstorming) e a posterior e necessária análise e seleção dessas opções através da aplicação analítica de filtros objetivos e subjetivos. É no processo de criação de opções que o mediador auxilia os participantes para descobrir novas oportunidades que podem se transformar em situações de ganha-ganha, saindo da costumeira barganha que é, normalmente, confundida por tantos com a negociação.
Os acordos que resultam da mediação tendem a ser mais satisfatórios para os envolvidos e têm maiores possibilidades de serem cumpridos e respeitados, já que são as próprias partes que os alcançam, diferente dos métodos heterocompositivos, através dos quais as disputas são resolvidas por uma decisão emanada de um terceiro e imposta às partes.
Embora o procedimento de mediação seja conduzido pelo mediador, são os mediados que mantêm o controle do processo, determinando, dentre outras questões, os assuntos trazidos para mediação. Tais assuntos podem estar direta ou indiretamente relacionados com a recuperação da empresa. Essa flexibilidade representa uma enorme vantagem para todos os participantes, já que eles podem determinar o detalhe, ordem e frequência das negociações e resolver conflitos anexos, que de outra forma ficariam pendentes de resolução. Trata-se de uma possibilidade que o processo judicial, pela sua própria natureza, não oferece.
Finalmente, a confidencialidade na mediação, que obriga ao mediador, aos mediandos e a toda pessoa que venha participar do processo, em qualidade de expert, colaborador, representante, dentre outras, permite um diálogo fluido e abrangente entre os participantes e um ambiente seguro e de confiança, abrindo possibilidades para soluções as quais não seria possível chegar através de um processo judicial, revestido de publicidade.
Considerando todas as vantagens mencionadas, resulta indiscutível a enorme e inédita oportunidade que existe hoje no Brasil para resolver disputas relativas a recuperação extrajudicial, judicial e falência através de um método ágil, confidencial, informal, célere, econômico e sustentável.
Embora a mediação represente uma enorme oportunidade para resolver disputas sobre reestruturação e recuperação empresarial, ainda não é amplamente conhecida nem sua utilidade foi completamente entendida pelos seus destinatários.
A mediação representa uma quebra de paradigma relativa à forma como resolvemos disputas e requer de uma mudança no modo de pensar por parte das partes da disputa e seus advogados.<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>
Existe uma cultura da sentença em nossa sociedade, que faz os indivíduos acreditarem que a única forma de resolver disputas é o processo judicial e, em determinados casos, a arbitragem. Ambos são métodos que as partes passam a responsabilidade da resolução para um terceiro e onde as partes perdem o controle do processo de resolução. Assim, enxerga-se como debilidade recorrer ao diálogo e a tentativas de restabelecimento dos relacionamentos. Teme-se, erradamente, passar a impressão de fragilidade do próprio argumento.
Felizmente, essa tendência está diminuindo, já que a partir de 2019 as faculdades de direito do Brasil ministram matérias relativas a métodos adequados de resolução de disputas, dentre elas, a mediação<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>. Destarte, os advogados passaram a recomendar a mediação para resolver disputas com maior frequência e convicção.
Em ocasiões, os participantes da mediação esperam que o mediador entregue um conselho sobre como resolver o assunto, mas segundo a normativa brasileira, o mediador não tem faculdade para emitir uma opinião em relação a como deve ser resolvida uma determinada disputa, embora possa colaborar com os mediandos nas etapas de geração de opções que  posteriormente serão analisadas, selecionadas e/ou descartadas por eles para formulação de uma proposta. A função do mediador é a de facilitar o diálogo entre os mediandos e estimulá-los para criarem soluções possíveis que possam derivar num eventual acordo.
Participar de uma mediação sem preparação prévia ou sem poder de decisão, dificulta e demora o processo para todos os envolvidos.
<blockquote class="jota-article__eye">A mediação é uma instância de diálogo e não uma chance para dilatar o procedimento judicial ou ganhar tempo com outros propósitos.</blockquote>
Comportamentos como os mencionados acima, evidenciam uma falta de perspectiva em relação à oportunidade real e demonstrada, tanto pela experiência nacional como comparada, que a mediação oferece para a recuperação de empresas.
A participação ativa e proativa, comprometida, de boa-fé das partes envolvidas e de seus advogados é chave para o sucesso do método.
Na prática, são os advogados das partes que participam normalmente das mediações, representado os interesses e, especialmente as posições, dos seus clientes. Eles têm uma enorme responsabilidade na resolução consensual da disputa.
O advogado tem a obrigação de informar seu cliente sobre a existência do método, sua natureza, funcionamento e objetivos. Também deverá aconselhá-lo em relação à escolha do mediador<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>.
Durante a mediação o advogado atua como um consultor do seu cliente e o informa sobre os riscos e vantagens de propor ou aceitar determinadas alternativas de solução ou propostas<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>.
O advogado participará da redação do acordo - a que, eventualmente os mediandos chegarem - junto com os outros advogados que participem da mediação, cuidando que ele reflita todos os acordos a que os mediandos chegaram e que ele seja válido, possível de implementar e exequível.
Trata-se de funções diferentes das que o advogado desempenha num litígio e exigem habilidades diferentes, tais como escuta ativa, empatia, criatividade para gerar opções, comunicação efetiva e uma posição colaborativa, em prol dos legítimos interesses do seu cliente.
O mediador conta com variadas técnicas para tentar conseguir o engajamento das partes e tem uma grande responsabilidade na condução do processo, mas não é só dele que dependerá que a mediação seja uma experiência satisfatória e útil para os envolvidos. A colaboração e o comprometimento dos mediandos e, particularmente dos seus conselheiros de confiança, seus advogados, resulta a chave para que a mediação contribua para resolver disputas empresariais, de recuperação judicial e falência, gerando efeitos positivos para a economia e para a paz social.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Nesse sentido, resulta interessante lembrar da assim chamada „Tragédia dos comuns“, teoria apresentada por Garret Hardin em 1968, <a href="http://www.garretthardinsociety.org/articles/art_tragedy_of_the_commons.html">http://www.garretthardinsociety.org/articles/art_tragedy_of_the_commons.html</a>, visitada em 1° de julho de 2021.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> “La mediación y el rol del abogado en ella”, Mercedes Tarrazón, em  <a href="http://www.disputemanagement.es/wp-content/uploads/2015/02/OtroSi_072010.pdf">http://www.disputemanagement.es/wp-content/uploads/2015/02/OtroSi_072010.pdf</a>, visitada em 03.07.2021
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a>  Parecer n.°635/2018 do Conselho Nacional de Educação (CNE), aprovado em 04.10.2018, que na parte 5.2 referente au perfil de egresso dos estudantes de Direito establece: “O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do graduando, sólida formação geral, humanística, capacidade de análise, domínio de conceitos e da terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e sociais, além do domínio das formas consensuais de composição de conflitos, aliado a uma postura reflexiva e de visão crítica, que fomente a capacidade e a aptidão para a aprendizagem, autônoma e dinâmica, indispensável ao exercício do Direito, à prestação da justiça e ao desenvolvimento da cidadania.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Role of attorneys in mediation process, American Bar Association, em <a href="https://www.americanbar.org/content/dam/aba/administrative/dispute_resolution/dispute_resolution/role_of_attorney_in_mediation_process.pdf">https://www.americanbar.org/content/dam/aba/administrative/dispute_resolution/dispute_resolution/role_of_attorney_in_mediation_process.pdf</a>, visitada em 03.07.2021
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> From Advocate to Advisor: The Role of the Lawyer in Mediation, Michael Lang, Outubro 2010, em <a href="https://www.mediate.com/articles/langlawyerrole.cfm">https://www.mediate.com/articles/langlawyerrole.cfm</a>, visitada em 03.07.2021

empresarial

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JOTA

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