Fernando Antônio Ribeiro Soares
Doutor em economia e diretor de Regulação e Inovação da Conexis Brasil Digital

Caso haja um crescimento sustentado do PIB brasileiro, haverá a necessidade de aumentar a oferta de energia – apesar da sobreoferta presente na atualidade. Não é demais lembrar que este insumo é essencial a todas as atividades produtivas. Alguns setores são mais intensivos que outros, mas todos demandam energia. Outro fator associado é a questão da competitividade e do tão decantado custo Brasil. Uma maior pressão em termos de demanda de energia tenderá a aumentar os custos de produção, o que, por seu turno, reduz a capacidade de competição dos produtos brasileiros. Ambos os fatores demonstram a relevância de se discutir a matriz energética brasileira.
Dada então a necessidade futura de expansão da oferta de energia, e considerando que muitos dos projetos precisam de um razoável período para chegar ao seu completion, qual ou quais fontes devem ser desenvolvidas ou expandidas? Entra em cena as questões ambientais. A resposta a esta pergunta passa pela preocupação com os gases de efeito estufa (GEE) e seus desdobramentos sobre as mudanças climáticas.
Em decorrência da preocupação ambiental, a utilização de fontes mais poluentes em termos de carbono equivalente, como o carvão e os óleos combustíveis, deve ser avaliada – considerem que sempre haverá de se procurar um equilíbrio entre as questões ambientais e a segurança energética.
Outra possibilidade seria a energia nuclear, apesar de seus efeitos colaterais e a necessidade de gerenciamento de riscos. O Brasil, no entanto, enfrenta grandes dificuldades nesta área. A legislação do setor, inclusive a constitucional, determina o monopólio da União. Na atualidade, ainda enfrentamos dificuldades em relação à construção de Angra 3 e, dada a situação fiscal, há a quase impossibilidade de começar novos projetos. Nesta seara seria necessário iniciar um importante debate: a mudança regulatória para permitir a provisão privada de energia nuclear. Seria pré-condição para tanto um acentuado robustecimento da capacidade regulatória e de fiscalização na área acompanhado do fortalecimento da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN).
Muito se tem falado em novas fontes renováveis de energia: (i) hidrogênio verde e outros; (ii) eólica offshore; (iii) biorefino etc. Todas são importantes alternativas, mas que ainda podem ser consideradas possibilidades para o futuro. Dessa forma, não conseguem aumentar rapidamente e substancialmente a capacidade de geração de energia elétrica. Há sim de se investir nessas fontes, mas, neste primeiro momento, ainda é importante trabalhar no desenvolvimento e aperfeiçoamento da tecnologia, que poderá reduzir os custos de produção (olha a questão da segurança energética), bem como nos marcos regulatórios e nas regras de certificação e auditoria. É importante considerar que é fundamental deixar a matriz de energia como um todo – e não só a de energia elétrica – mais limpa, porém os custos sociais e econômicos dessas medidas devem ser objetivamente ponderados.
Voltemos às fontes usadas de energia elétrica no país, em especial a hidráulica, a eólica (onshore) e a solar. A hidráulica, sem considerar a questão ambiental do solo, principalmente em usinas com reservatório, pode ser considerada, pelos menos para grandes projetos, esgotada no Brasil. Sobrariam as possibilidades na Amazônia. Essa localização traz justamente grandes problemas e discussões ambientais, além de dificuldades relacionadas às terras indígenas e aos povos ribeirinhos. Teria que se equacionar todas estas questões previamente. Ademais, as hidrelétricas na Amazônia trazem consigo elevados custos de instalação da transmissão derivados da distância dos centros consumidores.
As energias eólica (onshore) e solar também são boas opções e devem ser ampliadas, mas há um porém: são fontes intermitentes. Ajudam formidavelmente a matriz brasileira, inclusive pelo crescimento da geração distribuída, apesar de toda a discussão regulatória ainda pendente, mas mesmo assim são intermitentes. Em outros termos, não podemos contar com estas fontes de forma integral para compor a base do sistema, principalmente nos horários de pico de demanda. É a lógica de funcionamento do sistema 24/7.
Restaria para compor a base junto com a energia hidráulica neste momento o gás natural. Nossa base ainda seria hidráulica, porém complementada com o gás natural que em parte deixaria de ser energia de reserva. Porém, para isso, novos desafios nos aguardam: ambientais, institucionais, regulatórios, concorrenciais etc. Além disso, é importante a construção de gasodutos para a captação e transporte deste gás às usinas termelétricas. Novamente surge uma ponderação: o custo da instalação desta infraestrutura de transporte tem que ser devidamente ponderado, principalmente em relação à localização das termelétricas.
Particularmente, acredito que as térmicas deveriam estar próximas às fontes produtoras do gás natural, o que diminuiria, inclusive, a reinjeção deste. Portanto, em grande medida, as térmicas deveriam estar localizadas na região litorânea, demandando menores custos de construção de gasodutos, que gradativamente seriam interiorizados conforme a demanda. Novamente se coloca a condição: a necessidade de razoabilidade dos custos do sistema, da competitividade do país e do custo de vida para a população. Além das questões ambientais, a matriz de energia elétrica brasileira que irá surgir nos próximos anos também deve ser pautada pelas questões econômicas e sociais.