João Paulo Cavinatto

Rafaela Canito

Durante o mês de agosto, por 476 votos a 3, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) nº 5.829/2019 que pretende criar o marco legal da geração distribuída no Brasil, até então regulada apenas por resoluções da Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel, em especial a Resolução Aneel nº 482/2012 e alterações posteriores.
O texto do PL, que seguiu para aprovação no Senado Federal, permite ao consumidor produzir e consumir a própria eletricidade em usinas de micro e minigeração de energia elétrica com potência instalada de até 5MW[1], além de instituir o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE), por meio do qual o consumidor-gerador pode injetar o excedente da energia produzida nas redes de distribuição, gerando créditos de energia que poderão ser compensados em suas futuras contas de luz, na forma e prazo disciplinados na legislação.
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Embora não seja uma norma tributária, o PL nº 5.829/2019 pode ajudar a solucionar antigas controvérsias fiscais presentes desde a publicação da Resolução Aneel nº 482/2012, a começar pela atribuição com força de lei da natureza jurídica das operações realizadas no contexto do SCEE, o que impacta diretamente a incidência do ICMS.
O PL prevê expressamente que, no SCEE, a energia é injetada na rede da distribuidora local pelo micro ou pelo minigerador a título de empréstimo gratuito à distribuidora local.
A atribuição da natureza de empréstimo gratuito à operação em questão não é novidade. Desde a Resolução Aneel nº 517/2012, a Aneel atribuiu expressamente essa natureza a essas operações. Não havendo transmissão onerosa da energia elétrica, por consequência, não haveria natureza mercantil, o que automaticamente colocaria as operações realizadas por micro e minigeradores no SCEE fora do campo de incidência do ICMS.
No entanto, houve unidades federativas que, no âmbito do Confaz, editaram o Convênio ICMS nº 16/2015, que pressupôs a incidência do ICMS sobre essas operações e autorizou a isenção do imposto em determinados casos envolvendo a micro e minigeração com potência instalada (respectivamente, menor que 75kW e entre 75kW e 1MW).
O Convênio ICMS nº 16/2015 induz, portanto, à conclusão de que incidiria ICMS sobre as operações envolvendo usinas com potência instalada superior a 1MW. E vai além, ao excluir da isenção alguns valores cobrados pela distribuidora, como encargos de uso do sistema de distribuição.
Com base nisso, alguns estados – tais como Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Sergipe[2] – vêm exigindo o ICMS na geração distribuída não apenas sobre as usinas com potência superior a 1MW, como também sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (Tusd), no caso de operações isentas do ICMS.
Em março deste ano, inclusive, as discussões sobre o tema se acirraram ainda mais quando a distribuidora de energia do Estado do Ceará adaptou seus sistemas informatizados para segregar, para fins tributários, a tarifa volumétrica de energia, passando a cobrar ICMS de micro e minigeradores sobre o valor da Tusd.
Para além do debate acerca da indivisibilidade da tarifa[3], com o agravamento da crise energética no País, a aprovação do PL nº 5.829/2019 vem em oportuno momento, se considerarmos o grande potencial de expansão do mercado de geração própria. Ao atribuir caráter legal à natureza jurídica de empréstimo gratuito de energia elétrica, no âmbito SCEE, micro e minigeradores ganham mais um respaldo jurídico importante para reduzir os custos de seus projetos, se buscarem afastar, ainda que judicialmente, a pretensão das autoridades fiscais de exigirem o ICMS sobre operação manifestamente fora do campo de incidência do tributo.
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[1] O limite de até 5MW aplica-se somente à minigeração em central geradora com fontes despacháveis (sujeitas a controle humano, como hidrelétricas e usinas a gás natural). Esse limite é de 3MW para as fontes não despacháveis (que disparam energia sem controle humano e a depender das condições climáticas, tais como a energia eólica e fotovoltaica).
[2] Essa lista é dinâmica, considerando que as unidades da federação podem alterar sua interpretação do tema.
[3] Contribuintes e especialistas no setor apontam a impossibilidade de fracionamento da tarifa volumétrica de energia para fins tributários. Essa discussão inclusive norteia o julgamento do Tema 986, pendente de julgamento no STJ sob o rito dos recursos repetitivos. Embora, o STF tenha entendido se tratar de matéria infraconstitucional quando discutiu o tema no contexto do RE 1.041.816/SP, a tese da indivisibilidade das atividades de transmissão e distribuição da atividade de comercialização da energia em si foi aventada pelos Ministros, no âmbito do julgamento da ADI nº 4281/SP, em 13.10.2020.

icms

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JOTA

Com agravamento da crise energética no País, aprovação do PL nº 5.829/2019 virá em oportuno momento

Marco Legal pode reforçar não incidência do ICMS em geração distribuída

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