Letícia Piccolotto

<p>Os avanços tecnológicos têm contribuído para diversos efeitos positivos em nossa sociedade. A Inteligência Artificial, por exemplo, pode responder desafios fundamentais da sociedade, desde os mais complexos, por exemplo, apoiar hospitais em diagnósticos, até mesmo em tarefas cotidianas, além de ser uma valiosa alternativa para dar eficiência à prestação do serviço público. Não é sem razão que o professor Andrew Yan-Takng, da Universidade de Stanford, uma dos maiores nomes no assunto, afirma que a “inteligência artificial é a nova eletricidade”.</p>
<p>O tema tem sido alvo de grandes discussões nos últimos anos. Isso porque tanto Senado Federal, quanto Câmara dos Deputados se movimentam ativamente para garantir a regulação de suas possíveis utilizações pelos mais diferentes atores.</p>
<p><a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>O Senado Federal, por exemplo, encaminhou em 2019 dois projetos de Lei (PLs 5051 e 5691), ambos de autoria de Styvenson Valentim (Podemos-RN) – um prevendo a revisão humana de decisões por inteligências artificiais, outro fixando parâmetros éticos gerais. Já no ano passado, o deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE) propôs o PL 21/20, que ambiciona estabelecer o “Marco Civil da Inteligência Artificial”, tendo como principal objetivo tornar obrigatório os princípios éticos consagrados em âmbito internacional.</p>
<p>Esses esforços também se estendem ao Poder Executivo. O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, seguindo o exemplo de países como os Estados Unidos e a União Europeia, divulgou, em abril deste ano, a Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial, que propõe um conjunto de ações para temas específicos, como a destinação de investimentos, a educação básica, formação universitária, impactos no emprego e reskilling, além da aplicação da IA no setor público e para o desenvolvimento e implantação de sistemas inteligentes.</p>
<p>Como é natural em qualquer processo disruptivo, há opiniões controversas, especulação e poucas certezas. Ainda assim, considerando a relevância da regulação, o momento é fundamental para promover reflexões amplas sobre potenciais impactos, sejam eles oriundos da tecnologia ou da legislação.</p>
<h3><strong>A proposta em discussão</strong></h3>
<p>O projeto de lei que está em tramitação na Câmara dos Deputados, estabelece princípios, direitos e deveres para o uso de inteligência artificial no Brasil. Também prevê o uso de IA no desenvolvimento tecnológico e inovação; a livre iniciativa e concorrência; o respeito aos direitos humanos e aos valores democráticos; a igualdade, a não discriminação, a pluralidade e o respeito aos direitos trabalhistas; e a privacidade e a proteção de dados. Além disso, propõe que, entre os objetivos, deve existir a “promoção da pesquisa e do desenvolvimento da inteligência artificial ética e livre de preconceitos”.</p>
<p>A princípio, a proposta toca temas relevantes e necessários. No entanto, especialistas apontam fragilidades do texto inicial. Na avaliação destes atores, a proposta busca estimular o crescimento da IA, ao mesmo tempo em que protege os cidadãos de eventuais danos causados por seu uso indevido, mas falha ao não prever especificamente os mecanismos que irão assegurar o cumprimento de deveres e a defesa dos direitos.</p>
<p>Além disso, a proposta estabeleceria critérios para as diversas áreas que utilizam a IA, ao mesmo tempo em que não prevê mecanismos de atualização de suas disposições.</p>
<p>Esse ponto é especialmente complexo, uma vez que se trata de uma tecnologia que se modifica e avança de forma exponencial e é aplicada de diferentes maneiras nos mais diferentes setores.</p>
<blockquote class="jota-article__eye"><p>Sendo assim, ao se estabelecer o mesmo conceito para todas as áreas, correria-se o risco de limitar a inovação em um mercado crescente e com uma tecnologia transversal.</p></blockquote>
<p>A tramitação anda a passos largos, mesmo em um cenário em que não temos todas as respostas necessárias para um assunto de tamanha importância. Mas um consenso é unânime: a IA pode trazer diversos benefícios para nossa sociedade.</p>
<h3><strong>IA é o tema do momento</strong></h3>
<p>Não é só o Brasil que vem discutindo o desenvolvimento e a regulamentação da inteligência artificial. Nos últimos quatro anos, pelo menos 40 países têm debatido a criação de políticas públicas para fomentar o desenvolvimento dessa tecnologia nacionalmente, segundo o jornal da UNESP. Muitos deles se depararam com os mesmos dilemas relacionados aos limites éticos e ao futuro da tecnologia.</p>
<p>Para se ter uma ideia, na União Europeia, a proposta é extensa, com mais de 80 páginas e 85 artigos, que tratam todos os temas que norteiam a IA, como compartilhamento de informações, transparência e até a proibição de certas aplicações consideradas antiéticas.</p>
<p>Por aqui, o Marco Legal da IA é a ponta do iceberg. O assunto me faz lembrar de quando a internet chegou ao Brasil, na década de 80, e havia uma discussão em torno de sua regulamentação. Naquela época não sabíamos ao certo o seu potencial e o que ela se tornaria nos dias de hoje.</p>
<p>Parte de sua regulamentação só se tornou realidade em 2014, com o Marco Civil da Internet, cuja elaboração envolveu um processo altamente participativo e que ouviu os diferentes atores interessados e, especialmente, a sociedade brasileira, que pode contribuir, inclusive, com a redação do próprio texto da lei.</p>
<p>Retomando esse exemplo de nosso passado muito recente, não quero questionar o mérito da regulamentação da IA. A discussão é estratégica e fundamental. E, especialmente por isso, demanda uma construção participativa, ampla e que considere as distintas implicações, demandas e visões sobre o tema. Afinal, estamos diante de um fato histórico e da oportunidade de construir as bases para o futuro da inteligência artificial no Brasil.</p>
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