Felipe Kotait Buchatsky

O mais longo ocupante do Supremo Tribunal brasileiro, Nabuco de Araújo, foi nomeado em 1832 e permaneceu por mais de 31 anos no órgão durante o Império. Apenas a sua carreira no tribunal praticamente equivale à expectativa de vida inteira de homens brasileiros em 1910.
Por apenas 25 dias o ministro Celso de Mello, aposentado em 2020, não atingiu o recorde de permanência no órgão. Para Marco Aurélio, aposentado em 2021, faltariam 53 dias para se tornar recordista, sendo que hoje apenas Dias Toffoli poderá conquistar o título.
Tal como no presente, a abertura de vagas no Supremo sempre foi momento de debate sobre o modo e tempo de investidura de seus integrantes. Políticos e juristas criticam o fato de a Constituição admitir a permanência por até 40 anos no tribunal, e muitos defendem o mandato fixo como uma solução adequada. Contudo, esta defesa parte de um diagnóstico incompleto sobre a conjuntura brasileira.
Na prática, a maior contribuição dos mandatos seria reduzir o tempo médio de permanência no cargo. Supondo que os atuais ministros deixem o cargo na idade máxima permitida constitucionalmente, a média de permanência dos ingressantes no Supremo desde 1988 seria de, aproximadamente, 16 anos.
Ainda que este número se iguale ao tempo médio de permanência dos ministros da Suprema Corte dos Estados Unidos, os quais possuem investidura vitalícia, nas 54 democracias surgidas entre 1974 e 2012 que adotam o mandato fixo a média de sua duração é de apenas 8 anos e 5 meses. Assim, o mandato fixo possuiria como virtude a redução do tempo de permanência no tribunal, permitindo a sua oxigenação.
O debate em favor do mandato parece ter se intensificado nos últimos anos, frente ao protagonismo assumido pelo Supremo na política nacional. A escalada da atuação do órgão em temas centrais ao país, somada a disfuncionalidades em seu desenho institucional, elevou a quantidade e o tom das críticas ao tribunal, a despeito do reconhecimento de seu papel central na contenção do populismo autoritário de Bolsonaro.
Sob o argumento de evitar uma degradação ainda maior da imagem do Supremo, o mandato fixo traz a roupagem de aprimorar a jurisdição constitucional, conferindo celeridade na renovação de engrenagens “desgastadas” e oxigenando o tribunal.
Todavia, por mais que aparente ser remédio para preservar a instituição, permitindo a reversão mais rápida de indicações presidenciais, a proposta não altera o perfil dos escolhidos ao Supremo, o que só pode ocorrer por meio de mudanças materiais – e não temporais – no processo seletivo.
Mandatos também apresentam um risco adicional, a depender do modo como são desenhados pelo Poder Legislativo. Isso porque mandatos de curta duração podem tornar o tribunal constitucional refém de vontades políticas momentâneas, na medida em que os ministros podem se constranger a entrar em embates com o governo, com receio de retaliações futuras, especialmente quando deixarem o tribunal e precisarem se reposicionar em suas carreiras jurídicas.
Como agravante, em outros países, mandatos curtos costumam ser acompanhados da possibilidade de recondução dos ministros, os quais igualmente deveriam se furtar de embates com a classe política para garantir um novo mandato.
É inegável que o atual modelo de investidura até certa idade de aposentadoria compulsória, a despeito de teoricamente garantir uma maior independência judicial frente às instâncias políticas, pode dar a impressão de tornar menos frequente a possibilidade de reavaliação de rumos via mudança da composição do tribunal.
Muitos argumentam que a solução a este diagnóstico seria a instituição dos mandatos fixos. Porém, em se tratando do guardião da Constituição, não cabe falar em acelerar a correção de rumos, mas em não perder o rumo em primeiro lugar. Por mais desafiador que seja, criar freios e contrapesos efetivos no processo de seleção pode estimular a fidelidade do indicado à Constituição, a qual cuida, por si só, de manter o sistema de engrenagens oxigenado.
O diálogo institucional entre forças antagônicas pode, sim, produzir escolhas mais equilibradas. Se é verdade que o Senado chancelou todas as escolhas presidenciais nos últimos 129 anos, também é necessário reconhecer que é prática corriqueira conduzir os diálogos e negociações dos nomes nos bastidores da política, longe da opinião pública.
A implementação do modelo argentino, no qual a sociedade civil tece comentários sobre os nomes cotados pelo presidente, pode ser positiva ao criar custos decisórios às autoridades eleitas e transpor o debate à cena pública, onde setores mobilizados e vigilantes terão a chance de contribuir com a escolha de ministros comprometidos com a Constituição e conscientes da responsabilidade institucional que carregam.

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JOTA

Diálogo institucional entre forças antagônicas pode, sim, produzir escolhas mais equilibradas

Mandatos no Supremo não blindam a instituição

Diálogo institucional entre forças antagônicas pode, sim, produzir escolhas mais equilibradas de ministros para o Supremo