Isabelle Glezer

Daniele Botaro

Renata Moraes

Mulheres na liderança de países não são um fato inédito. A ex-premiê britânica Margaret Thatcher, a primeira-ministra indiana Indira Gandhi, a chanceler alemã Angela Merkel, nossa vizinha Michelle Bachelet e Tarja Kaarina Halonen, presidente da Finlândia por 12 anos seguidos, são apenas alguns casos de sucesso na mais alta esfera de poder público. No entanto, a arena política e a esfera pública seguem sendo espaços pouco receptivos às mulheres. Há menos de 100 anos as mulheres conquistaram o direito de voto no mundo ocidental. Talvez justamente por conta deste atraso devamos discutir vieses inconscientes que fazem com que a associação “mulher” e “presidente” ou “política” ainda cause desconforto.
Vieses inconscientes nada mais são do que atalhos mentais utilizados para processar com eficiência a infinidade de informações que nos é apresentada a cada segundo. Esses vieses se manifestam diariamente ao longo de nossas inúmeras pequenas decisões baseadas em informações acumuladas de forma fragmentada, pouco organizada, por meio de experiências e conhecimentos prévios. Por um lado, os vieses nos ajudam a navegar na sociedade, evitando exposição a riscos à nossa integridade física por nos alertar em situações de potencial perigo, por exemplo. No entanto, nos levam a formar juizo sobre pessoas e situações sem analisarmos de fato cada caso específico. Para melhor entender o funcionamento dos vieses e seus desdobramentos em questões de gênero, o Google disponibiliza <a href="https://rework.withgoogle.com/guides/unbiasing-raise-awareness/steps/watch-unconscious-bias-at-work/">gratuitamente</a> seu treinamento sobre vieses inconscientes.
Realizada a breve explicação científica, fica a pergunta: como os tais vieses inconscientes se relacionam às mulheres e suas ambições políticas? Historicamente vimos homens ocupando as posições de poder político e as mulheres cuidando de seus lares. As qualidades associadas a cada perfil de atividade, bem como as expectativas sobre o que é ser um homem padrão (firme, focado, ambicioso, trabalhador, estratégico, prático) e ser uma mulher padrão (sensível, colaborativa, voltada ao bem comum, cuidadora da família, dotada de habilidades manuais), estão gravadas em nosso subconsciente individual e coletivo. Assim, quando vemos uma mulher ocupando uma posição de poder (e liderar um país é o ápice desse cenário), soa estranho e a primeira reação de homens e mulheres não atentos aos seus vieses inconscientes é buscar elementos que os ajudem a validar sua desconfiança involuntária.
Um dos dados que torna esta discussão ainda mais rica e interessante é o exemplo de como até mesmo vieses positivos podem ter consequências negativas sobre as mulheres. Pesquisadoras das escolas de negócios de Vanderbilt, Wharton e Kellogg descobriram que, no ambiente de trabalho, mulheres são percebidas como mais éticas, mas, consequentemente, violações éticas cometidas por mulheres são punidas com mais severidade do que infrações idênticas cometidas por homens, pois são menos esperadas e menos toleradas.
Falemos de casos recentes: É difícil analisar questões e divergências políticas com objetividade, mas fenômenos como o impeachment da presidente Dilma Rousseff e a não-eleição de Hillary Clinton nos Estados Unidos (dominada em grande parte pelo escândalo dos servidores de e-mail) podem indicar que a barra ética também seja mais alta para mulheres na política. De fato, “barra mais alta” é o nome do fenômeno classificado pelos estudiosos de estereótipos de gênero (quando os vieses se relacionam com a questão de gênero) como o quadro gerado quando as mulheres precisam se provar mais para conseguir o mesmo nível de credibilidade.
Voltando ao início dessa conversa, em menos de 100 anos de participação feminina na política, 67 países tiveram uma presidente ou primeira-ministra, de acordo com o <a href="http://www3.weforum.org/docs/GGGR16/WEF_Global_Gender_Gap_Report_2016.pdf">Global Gender Gap Report de 2016</a>, uma publicação do Fórum Econômico Mundial que analisou a questão. Mais de 70% dessas líderes assumiram suas posições a partir de 1990, de acordo com o <a href="http://www.umsl.edu/~jalalzaif/beyondbenazir.pdf">estudo Beyond Hillary and Benazir: Women’s Political Leadership Worldwide, da cientista Farida Jalalzai</a>, especialista na participação feminina na política. Parte dessas representantes, em especial nos países nórdicos, com o incentivo de ações afirmativas.
Muitos vão dizer que o que importa é discutir a competência de nossos candidatos e que isso basta. Mas é importante que continuemos a discutir estes temas que impedem a análise isenta da competência dos candidatos. E isto deverá ser feito até que o atributo de destaque na eleição de uma mulher não seja seu gênero. Gostamos de reforçar nosso otimismo com as palavras de Sheryl Sandberg, a executiva ativista de igualdade de gênero do Facebook: “no futuro, não haverá mulheres líderes, haverá apenas líderes”.

madam

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JOTA

"No futuro, não haverá mulheres líderes, haverá apenas líderes"

Madam President e nossos vieses inconscientes

"No futuro, não haverá mulheres líderes, haverá apenas líderes"