Allan de Abreu

Jornalistas, policiais e titulares do Ministério Público costumam formar parcerias memoráveis. Eu me lembro aqui do caso do médico Roger Abdelmassih, que estava foragido e foi descoberto em agosto deste ano no Paraguai por jornalistas da TV Record associados a promotores do Gaeco. Ou da Máfia do Apito, bela investigação de jornalistas da Veja, Gaeco e Polícia Federal, que trouxe à tona em 2005 um megaesquema entre empresários e árbitros corruptos para fraudar resultados no futebol.
Como repórter, sempre acreditei no poder dessa parceria. Até o dia em que um certo procurador, o empertigado Álvaro Luiz de Mattos Stipp, me chamou na sua ampla sala do Ministério Público Federal em São José do Rio Preto (SP), na tarde do dia 2 de maio de 2011. Dr. Stipp estava inquieto.
Disse que eu não poderia ter divulgado no <a href="http://www.diarioweb.com.br/novoportal/">Diário da Região</a>, no dia anterior, escutas telefônicas de uma operação, coordenada por ele e pela Polícia Federal, que desvendara um esquema de corrupção dentro da delegacia do Ministério do Trabalho na cidade que envolvia auditores fiscais e o chefe da unidade (leia <a href="http://www.diarioweb.com.br/novoportal/Noticias/Cidades/58855,,Caffagni+e+fiscais+do+Trabalho+recebiam+caixinha+de+usineiros.aspx">aqui</a>). Disse também que a divulgação atrapalhou o andamento das investigações – embora a fase ostensiva da operação, com 18 prisões, houvesse ocorrido três meses antes.
E pediu para que eu lhe revelasse a fonte que havia me passado as informações, para que fosse devidamente punida pela lei. Obviamente, impossível aceitar o pedido. Três dias mais tarde, publiquei outra reportagem com mais escutas (leia <a href="http://www.diarioweb.com.br/novoportal/Noticias/Cidades/59504,,MPF+acusa+Caffagni+de+favorecer+empresas.aspx">aqui</a>).
Dr. Stipp ficou furioso. E ordenou à PF meu imediato indiciamento por quebra de sigilo de comunicação telefônica, crime previsto na lei 9.296, de 1996. Assim foi feito – o delegado da PF, José Eduardo Pereira de Paula, mesmo contrário à medida, não poderia desobedecer à determinação. Sigo indiciado até hoje por um crime que, tenho absoluta certeza, nunca cometi.
O inquérito prosseguiu. Em fevereiro deste ano, o delegado da PF solicitou ao MPF o arquivamento da investigação. Mas o procurador Svamer Adriano Cordeiro – a essa altura o dr. Stipp fora promovido a procurador do Tribunal Regional Federal em São Paulo – negou o pedido e foi além. Determinou ao delegado que solicitasse à Justiça a quebra do meu sigilo telefônico e também dos telefones do jornal. Foram seis meses de espera até que o juiz da 4ª Vara Federal de S. José do Rio Preto, Dasser Lettiére Júnior, acatou o pedido nesta semana.
Dois procuradores regionais da República e um juiz federal ignoraram duas garantias basilares de uma democracia, que, certamente, eles estudaram na graduação em Direito: a liberdade de imprensa e o sigilo de fonte.
Imagine, leitor, se informações sigilosas da Operação Lava Jato, para ficar em um só exemplo, ficassem para sempre nos escaninhos dos fóruns e delegacias, conhecidas apenas por uns poucos. Como seria se a sociedade nunca soubesse os nomes dos poderosos que saíram das bocas de Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef no megaescândalo da Petrobrás, em depoimentos secretos?
Já se disse mais de uma vez que a luz do sol é o melhor detergente para a sujeira. E que a informação genuína, coberta ou não pelo sigilo, pode mudar a história ao chegar às mãos de jornalistas. Isso nenhum procurador ou juiz pode evitar. Que bom que seja assim.
Leia as reportagens que provocaram a ira do MPF de São José do Rio Preto:
<a href="http://www.diarioweb.com.br/novoportal/Noticias/Cidades/58855,,Caffagni+e+fiscais+do+Trabalho+recebiam+caixinha+de+usineiros.aspx">Caffagni e fiscais do Trabalho recebiam ‘caixinha’ de usineiros</a>
<a href="http://www.diarioweb.com.br/novoportal/Noticias/Cidades/59504,,MPF+acusa+Caffagni+de+favorecer+empresas.aspx">MPF acusa Caffagni de favorecer empresas</a>

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JOTA

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