Antonio Carlos Pereira Neto

Julia Heuser

De grande relevância social, a igualdade salarial entre mulheres e homens ainda não é uma realidade no Brasil, mesmo diante da garantia constitucional (artigo 7º, inciso XXX) e de dispositivos presentes na legislação trabalhista (artigo 461 da <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/clt">CLT</a>, com a redação dada pela <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm">lei 13.467</a> - Reforma Trabalhista).
Em recente pesquisa, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aferiu que a remuneração recebida por mulheres representa, em média, 78% do rendimento dos homens, ou seja, uma diferença equivalente a 22%.
Com o advento da Lei 14.611/23, publicada no Diário da União Federal de 03/07/23, novos mecanismos de incentivo, fiscalização e penalidade foram acrescidos ao ordenamento jurídico, inclusive com alteração relevante no artigo 461 da CLT.
Assim, o artigo 461 da CLT passa a vigorar com mais dois parágrafos, 6º e 7º, que dispõem sobre o direito de ação de indenização por danos morais a ser intentada pelo empregado discriminado, assegurado mesmo diante do pagamento das diferenças salariais devidas por força de discriminação por sexo, raça, etnia, origem ou idade, estipulando multa equivalente a 10 vezes o valor do novo salário devido pelo empregador ao empregado discriminado, elevada ao dobro, no caso de reincidência.
Na mesma toada, a lei introduz novos mecanismos de garantia da igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens, tais como a disponibilização de canais específicos para denúncias de discriminação salarial; o fomento à capacitação e à formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens; e a promoção e implementação de programas de diversidade e inclusão no ambiente trabalho que englobem a capacitação de gestores, de lideranças e de empregados a respeito do tema equidade entre homens e mulheres no mercado de trabalho, com aferição de resultados.
Merece destaque o cuidado do legislador com a proporção de ocupação dos cargos de liderança e gestão, já que, além da desigualdade salarial, as mulheres enfrentam barreiras e dificuldades para acenderem na carreira e ocuparem cargos de comando.
No entanto, o artigo 4º da lei 14.611/2023 deixa dúvidas quanto à responsabilidade pela adoção das medidas e mecanismos de transparência, controle e combate ao desequilíbrio salarial entre mulheres e homens — ou seja, se é das empresas ou do Poder Executivo.
O certo é que as empresas deverão rever suas atuais práticas e procedimentos internos, inclusive não se limitando ao fomento à capacitação de mulheres para, muito além da inserção no mercado de trabalho com salários iguais aos ofertados aos homens, a permanência e evolução da carreira, sempre em igualdade de condições com os homens e em proporção igualitária para os cargos de direção e comando.
Da mesma forma, o iminente aumento da fiscalização obrigará as empresas à adoção de práticas transparentes, com a disponibilização de canais específicos para denuncias de discriminação salarial. A reavaliação dos canais de compliance, termo que tem origem no verbo da língua inglesa “to comply” – na tradução livre, “agir conforme” –, se impõe como medida de reflexão e adaptação.
Para as pessoas jurídicas de direito privado com 100 ou mais empregados, observado o disposto na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), torna-se obrigatório a publicação semestral de relatórios de transparência salarial e dos critérios remuneratórios, com dados anonimizados e informações que permitam a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos de direção, gerencia e chefia preenchidos por mulheres e homens, acompanhados de informações aptas a fornecer dados estatísticos sobre possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade.
Uma vez verificada a desigualdade salarial ou os critérios remuneratórios, a empresa deverá apresentar e implementar plano de ação para mitigação e enfrentamento das não conformidades encontradas, com metas e prazos definidos, e garantia de participação sindical e dos representantes dos empregados nos locais de trabalho.
A penalidade pela não publicação dos relatórios implica na aplicação de multa administrativa equivalente a 3% da folha salarial do empregador, limitado a 100 salários-mínimos, sem prejuízo da aplicação das demais sanções previstas na CLT, com a nova redação dos parágrafos 6º e 7º do artigo 461, assegurado, ainda, o direito de ação do empregado lesado para pleitear eventual indenização por danos morais.
A lei é de aplicação imediata, com entrada em vigor na data de sua publicação, cabendo ao Poder Executivo instituir protocolo de fiscalização.
O momento é de reflexão e reavaliação de processos e políticas internas de compliance, sendo certo que a Lei 14.611/23 coloca o Brasil em condições reais de combater, com resultados práticos, a desigualdade e a discriminação por todo e qualquer motivo. Nunca é demais lembrar que a igualdade entre todos é direito e garantia fundamental, expressamente previsto na Constituição Federal.

salário

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JOTA

Paridade ainda não é realidade no país apesar de garantia constitucional

Lei da Igualdade Salarial e a reavaliação de processos de compliance

Igualdade salarial entre homens e mulheres ainda não é realidade no país apesar de garantia constitucional