Rebeca Müller

Como salvar a Petrobras da delicada situação na qual essa notável companhia se encontra? Muitos apostariam em uma solução vinda dos Estados Unidos, a nação sempre lembrada em todas as teorias conspiratórias envolvendo petróleo. A ideia, de pouca originalidade intelectual, se mostra um clichê. No caso brasileiro, esse suporte deve vir de um ator cuja presença cada vez mais marcante na geopolítica mostra as novidades que o século XXI apresenta à economia mundial. É a China que está dando suas caras.
Crendo pacientemente – ao modo confuciano – em investimentos a longo prazo, a China, com o seu “capitalismo de estado”, mantém sob seu domínio um expressivo número de empresas: são 150 mil estatais com mais de 15.7 trilhões de dólares em ativos e aproximadamente 35 milhões de funcionários públicos. Um modelo ousado, que hoje já expõe suas fragilidades.
Foi quando a polêmica era Maoísta teve fim, em 1976, com o falecimento de seu mentor, Mao-Tsé Tung, que a nova direção do partido comunista chinês determinou o fim de um ciclo e o início de uma série de reformas em busca de incentivos por intermédio do comércio internacional e de investimentos estrangeiros. As mudanças perduram até hoje. No final do ano passado, por exemplo, o governo chinês anunciou um plano de privatização parcial de várias empresas estatais, com destaque para as do setor de telecomunicação e energia. Privatizações feitas num governo comunista, um curioso fato que a história e o tempo apresentam a nós.  
O pacote veio à tona como uma tentativa de reverter o fraco desempenho dessas companhias, muito inferior às suas semelhantes privadas, em que pese a proteção estatal. Se posto em prática, ele estimulará o mercado de fusões e aquisições bem como financiamentos offshore. Nada obstante a guinada que a China demonstra estar disposta a dar, fato é que o mundo assiste a uma das maiores ascensões de uma nação responsável por redesenhar os pilares financeiros globais. 
A presença da China pode ser vista em várias partes do globo, sobretudo em países cujos desafios ainda são monumentais, o que inclui o continente Africano como um todo. Na África do Sul, por exemplo, diariamente embarcações com a bandeira e inscrições chinesas se aproximam do porto da Cidade do Cabo. A bordo do navio, trabalhadores responsáveis por empreendimentos nos setores energéticos e de infraestrutura viram a noite reparando peças e máquinas. 
Boa parte dessa presença chinesa ao redor do mundo se deve aos bancos de desenvolvimento, instituições financeiras utilizadas essencialmente como instrumentos de políticas públicas nacionais e internacionais. O Novo Banco de Desenvolvimento dos BRICS (NBD), <a href="https://www.jota.info/jota-inside-o-novo-banco-de-desenvolvimento-do-brics" target="_blank">discutido em artigo passado aqui no JOTA Inside</a>, e o recém-criado Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB), são apenas algumas dessas instituições multilaterais que contam com participação substancial da China.
Isso porque o período atual de desaceleração econômica e da mudança no cenário dos países em desenvolvimento, até pouco tempo motores do crescimento global, tem dado espaço para a China mostrar o seu fôlego monetário com suas reservas de mais de quatro trilhões de dólares, mesmo diante do desaquecimento que ela também enfrenta. De acordo com o relatório Perspectivas Econômicas Globais de 2016, do Banco Mundial, a previsão é de que os Estados Unidos contarão com um crescimento de 2,7%, a União Europeia 1,7% enquanto a China crescerá em 6,7% - contra 6,9% em 2015 – (um decréscimo de 10% se comparado a 2010), em relação ao Produto Interno Bruto.
É nesse ambiente, com uma arquitetura financeira pouco tradicional, onde a Petrobrás se sentiu confortável para buscar financiamentos em meio aos escândalos de corrupção, as revisões das notas de crédito em razão da má gestão e ao peso da crise do petróleo. Vale lembrar que a estatal brasileira registrou recordes desanimadores no quarto trimestre de 2015, com um prejuízo de R$ 36,938 bilhões, quase um terço de seu valor de mercado.
Em acordo assinado com o Banco de Desenvolvimento chinês, o China Development Bank (CDB), em 2015, o Brasil receberá 10 bilhões de dólares e, em troca, fornecerá petróleo para empresas chinesas. A expectativa é de que a quantia ajudará a equilibrar os balancetes da Petrobrás e requerer um valor menor de venda de ativos até 2017. O CDB tem financiado projetos internacionais de grande escala e ajudado na expansão de empresas chinesas em mercados estrangeiros. Em solo brasileiro, esse plano tem ganhado cada vez mais corpo.
No total, trinta e cinco acordos de cooperação foram assinados entre Brasil e China no ano passado. Além do China Development Bank, o presidente da Petrobrás, Aldemir Bendine, e o presidente do Export Import Bank of China, firmaram contrato de financiamento envolvendo 2 bilhões de dólares, dos quais 1 bilhão foi anunciado essa semana como antecipação na captação de recursos prevista para ocorrer só em 2017. 
Será que o mundo está preparado para a força do capital chinês? A verdade é que, como insistentemente relembrado pelo economista Milton Friedman, “não existe essa coisa de lanche grátis”. Se a resposta for um “sim”, certamente determinados modelos institucionais adotados deverão ser mudados, a fim de comportar tamanha responsabilidade econômica por parte desse gigante asiático. Vale recordar a lição deixada em janeiro deste ano pelo mercado financeiro, que respondeu à queda no crescimento econômico da China, país responsável por quase 18% das atividades econômicas mundiais em 2016, segundo o Fundo Monetário Internacional – FMI.
Joseph Schumpter, economista austríaco, defendeu a necessidade do que ele denominou de “destruição criativa”, onde é preciso que as velhas concepções cedam lugar para as novas e mais modernas visões, para que o caminho da prosperidade seja aberto. Estaria o governo Chinês pronto para rever o seu modelo econômico atual? Se depender da pressão do mercado, mais mudanças deverão estar perto de acontecer. Quem viver verá.

money-17418_1280

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Será que o mundo está preparado para a força do capital chinês? 

O plano de resgate da Petrobrás e a força do capital chinês sobre o mercado financeiro

Será que o mundo está preparado para a força do capital chinês?