Carina Quirino

Felipe Pereira dos Santos

O mercado relacionado à inovação tecnológica – economia criativa, startups e inovação em produtos e serviços criados por empresas de base tecnológica – já tem notado uma sensível mudança no ambiente de negócios: alíquotas de IPTU e demais condições relativas ao pagamento do tributo estão sendo definidas para fins de atração e manutenção daquele segmento.
O estímulo de condutas pela via tributária é usualmente observado pela adoção de alíquotas benéficas e condições de pagamento facilitadas para os particulares que cumprirem os requisitos que geram o resultado pretendido pelo poder público. Essa configuração de medidas, comumente chamadas de incentivos fiscais, já é largamente adotada pelos mais diversos entes da federação.
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Caso interessante é o do município do Recife, que, por meio da Lei nº 16.290/97, oferece isenção de IPTU aos proprietários que realizarem obras de reforma no imóvel, visando a recuperação arquitetônica das construções históricas. O benefício varia conforme o grau de intervenção: quanto maior a preservação do patrimônio, maior o desconto, que tem validade de cinco anos. A área delimitada para essa política de isenção abarca o Porto Digital, hub de inovação pernambucano que agrega empresas, instituições de ensino e ações governamentais em uma política pública de incentivo à inovação e ao empreendedorismo.
Salvador também possui uma experiência interessante com o uso de tributos para a indução de condutas. A capital baiana, por meio da Lei nº 9.534/2020, instituiu a Política Municipal de Inovação, que cria incentivos para que empresas de base tecnológica e startups se instalem no perímetro definido no diploma. O município estabelece isenções parciais de diversos tributos, dentre os quais se destaca o IPTU e o ISS, que afetam sobremaneira a escolha de empresas a respeito de qual município irão estabelecer seus negócios.
Outro exemplo é Florianópolis, que, semelhante ao que fez Salvador, concedeu incentivos fiscais às empresas de economia criativa que se enquadram como startup ou empresas de inovação, e que estejam instaladas no perímetro do Centro Sapiens, hub de inovação da capital catarinense. A Lei Complementar nº 686/2020 estabelece isenção de IPTU para imóveis no limite de 180 m² e isenção total de ISS por três anos.
Os três exemplos mencionados são ilustrativos do empoderamento dos municípios no planejamento e execução de políticas de impacto econômico locais por meio do fomento à inovação e ao empreendedorismo, explorando a extrafiscalidade dos tributos de sua competência. Como toda política pública, para que possa atingir seu objetivo – ou corrigir os rumos na hipótese de desvios –, além do diagnóstico do problema, é necessário que haja verificação dos resultados obtidos durante a execução do programa. Considerando a ferramenta adotada pelos municípios, os resultados obtidos devem ser avaliados em ao menos dois aspectos: o gasto tributário<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> e o resultado finalístico.
Quanto ao gasto tributário, o art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal oferece marcos interessantes para a avaliação de resultados. Em verdade, o dispositivo se refere à necessidade de planejamento prévio, mas as suas indicações podem ser empregadas também na avaliação contínua de resultados. A norma requer a projeção do impacto orçamentário das renúncias de receitas implementadas nos exercícios seguintes; a adequação com os preceitos da Lei de Diretrizes Orçamentárias e o cumprimento alternativo de uma das seguintes condições: demonstração de que a renúncia de receita já foi considerada na estimativa de receita da Lei Orçamentária Anual ou previsão de medidas de compensação para o que se deixará de arrecadar.
A avaliação do resultado finalístico, por sua vez, vem ganhando ainda mais importância. Atualmente, a Administração Pública vem se valendo cada vez mais de políticas públicas baseadas em evidências, ou seja, as intervenções são guiadas por dados estatísticos, econômicos, geográficos, dentre outros. Verificar empiricamente a eficácia das isenções concedidas diante do objetivo descrito em lei é fundamental para que se perceba o sucesso ou a necessidade de correções nas políticas de atração e de fomento de negócios inovadores.
A utilização da função extrafiscal sem evidências técnicas de sua utilidade e o monitoramento contínuo dos resultados obtidos é pouco útil para os propósitos que se quer concretizar tecnicamente com a adoção dessas medidas. Incentivos fiscais são medidas complexas, que requerem dados específicos para que se possa calcular seus impactos. Nos casos municipais acima comentados, não foi possível verificar as bases de dados que sugerem que essas políticas estejam alinhadas aos propósitos desenhados e, se estiverem, qual é o seu grau de resultado obtido até então.
Os municípios estão se utilizando de <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/prefeitura-de-sp-sanciona-lei-do-retrofit-com-expansao-do-perimetro-de-abrangencia-06082021">instrumentos cada vez mais complexos para promover as políticas locais</a>. Os incentivos fiscais nos tributos de competência municipal são ferramentas poderosas que, se bem manejadas, podem resultar em um impacto econômico considerável assim como em alteração do espaço urbano, em especial quando recaem sobre o IPTU.
É importante que se tenha clareza sobre os dados que lastreiam a formulação de políticas e a tomada de decisão do administrador público, assim como é igualmente importante a obtenção de dados sobre o resultado das iniciativas empregadas no bojo de uma política pública. Sem transparência e clareza metodológica, os incentivos fiscais encontram o mesmo lugar comum de falha: o esvaziamento técnico.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Gasto tributário diz respeito às renúncias de receitas realizadas em favor de certo grupo, sendo equiparado a arrecadação e ao gasto direto, sem ter, contudo, efetivamente ingressado valores nos cofres públicos. A esse respeito cf. OLIVEIRA, Phelippe Toledo Pires de. "O gasto tributário no direito brasileiro: o que fazer para melhorar o seu controle?". Revista Fórum de Direito Financeiro e Econômico – RFDFE, Belo Horizonte, ano 7, n. 12, p. 149-163, set./fev. 2018.

Recife

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JOTA

Os incentivos fiscais são ferramentas poderosas que, se bem manejadas, podem resultar em alteração do espaço urbano

O IPTU como instrumento de políticas públicas municipais

Os incentivos fiscais nos tributos municipais, como o IPTU, são instrumentos poderosos que podem resultar em alteração do espaço urbano