Mariane Cunha da Silva Miranda

Fernando Guido Okumura

Nas relações empresariais, firmadas por partes capazes, é cada vez mais comum a celebração de contratos com a cláusula limitativa de indenização para estabelecer critérios financeiros mais realistas e razoáveis na execução do contrato.
Essas disposições têm como objetivo minimizar o impacto da previsão do Código Civil, especificamente a que prevê que aquele que por ato ilícito causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>. Tal premissa tem como consequência lógica a obrigação do causador do dano de indenizar a vítima.
A preocupação das empresas em casos como esses decorre do fato de que a disposição do Código Civil não fornece previsibilidade do montante indenizatório para fins de reparo do ato ilícito, na medida que caberá análise judicial do quantum debutar.
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Uma justificativa comum para a inclusão desta condição nos contratos é a redução dos riscos como condição para que o custo dos serviços seja reduzido. Em alguns casos, encontramos também cláusula por meio da qual parte (normalmente a contratante) declara que tem conhecimento de que o valor dos serviços foi estabelecido sob a premissa da limitação da responsabilidade e que a ausência da limitação acarretará a alteração significativa do valor dos serviços.
A limitação de indenização por responsabilidade civil é um tema amplamente discutido no teor das relações contratuais. Por vezes os contratos são revisados buscando encontrar um equilíbrio que atenda os dois lados do contrato. A dúvida sempre existe: será que a cláusula será considerada válida em eventual litígio?
A cláusula de limitação de responsabilidade tem por objetivo – limitar – a indenização por eventual dano causado no descumprimento do contrato. Esse dano, em sua maioria das vezes, está ligado à execução em si e aos impactos resultantes dela, como, por exemplo, o atraso na entrega de uma matéria prima que resulta na demora do fornecimento do produto da contratante. Essa demora pode ensejar na perda de um cliente e até mesmo desprestigiar a imagem da empresa no mercado.
Convém esclarecer que essa cláusula não pode ser confundida com a cláusula penal, devida pelo descumprimento contratual, consoante disposto no artigo 408 e seguintes do Código Civil, em que não há necessidade de arguição de prejuízo.
<blockquote class="jota-article__eye">Os contratos entre particulares são regidos pelos princípios da autonomia de vontade e do pacta sunt servanda, respeitando, é claro, a função social e econômica do contrato. Por tal razão, a cláusula de limitação de responsabilidade é tão utilizada nos contratos privados.</blockquote>
Contudo, nem toda a relação poderá ter a sua indenização limitada de acordo com a vontade das partes.  Como por exemplo no contrato de transporte<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>, que o valor de perdas e danos sempre será o valor declarado no conhecimento de transporte, acrescido dos valores do frete e do seguro correspondentes. Na mesma esteira é Súmula 161 do STF: “Em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar.
Também na Lei de Softwares há a determinação de nulidade das cláusulas que limitem responsabilidades por eventuais ações de terceiros, decorrentes de vícios, defeitos ou violação de direitos do autor. <a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>
Na esfera consumerista, o artigo 25 do Código de Defesa do Consumidor, prevê que é vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar. Na mesma toada, o art. 51, inciso I, considera nula de pleno direito as cláusulas que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos ou serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos.
Todavia, a parte final do art. 51, inciso I, ressalva que, nas relações de consumo entre fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis. Aqui, mais uma vez, demonstra-se a possibilidade de limitação indenizatória.
Ainda, não há um posicionamento jurisprudencial consolidado acerca da aceitação da cláusula contratual de limitação de responsabilidade. De todo modo, podemos destacar que, em recente julgado proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, ficou claro a admissibilidade da cláusula limitativa de responsabilidade, a seguir:
Apelação. Bancário. Responsabilidade civil. Ação de cobrança. Contrato de locação de cofre para uso particular. Roubo de cofre bancário. Cláusula limitativa da indenização. Admissibilidade. Princípio 'pacta sunt servanda' que deve ser observado. Contrato formalizado ante o consentimento das partes. Adesão feita de forma livre e consciente. Autores tinham ciência do limite e não poderiam requerer o pagamento de indenização referente aos bens com valores superiores e não declarados e sobre os quais o Banco não havia se comprometido a, indiretamente, proteger. 
Precedente do TJSP. Cláusula válida. Abusividade não caracterizada. Sentença mantida. Recurso não provido. (Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível 1002980-79.2014.8.26.0011; Relator (a): Elói Estevão Troly; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 34ª Vara Cível; Data do Julgamento: 10/04/2018; Data de Registro: 13/04/2018).
Fato é que a inclinação legislativa é seguir na liberdade das partes na negociação. Com a recente promulgação da Lei 13.874/2019, que dispõem sobre a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, estabelecendo garantias de livre mercado e consequentemente a redução da intervenção estatal, a tendência é que as cláusulas limitativas negociadas entre os privados sejam mais recepcionadas pelo Poder Judiciário.
Nesse sentido, o Código Civil já prevê que nas relações contratuais privadas prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>, sendo certo que nesse contexto o Judiciário tende a seguir o novo cenário legislativo ao fundamentar suas decisões, em eventual litígio entre contratos de entes privados.
Por fim, para análise da validade da cláusula limitativa de responsabilidade é necessário observar o contexto de celebração deste contrato, inclusive se foi respeitado a autonomia, a boa fé e a liberdade das partes durante a negociação.
Conclui-se, portanto, que, embora não exista previsão legal expressa no Código Civil, a cláusula de limitação de responsabilidade, ou até mesmo de sua exoneração, é plenamente admitida no nosso ordenamento e há de ser cada vez mais importante no âmbito contratual, cabendo às partes cautela ao aceitar tal dispositivo nos contratos empresarias.
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O episódio 47 do podcast Sem Precedentes analisa o julgamento do Supremo Tribunal Federal que decidiu pela inconstitucionalidade da reeleição dos presidentes do Congresso. Ouça:
https://youtu.be/roD5SwCzhLI
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Código Civil - artigo 927.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Lei 11.442/2007, artigo, 14º
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Lei 9.609/1998, artigo 10º, paragrafo §1º ,inciso II
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Código Civil, artigo 421.

ação monitória

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JOTA

Código Civil não fornece previsibilidade do montante indenizatório para fins de reparo do ato ilícito

Cláusula limitativa de responsabilidade indenizatória

Indenização e responsabilidade: o código civil não fornece a previsibilidade do montante indenizatório para fins de reparo do ato ilícito