Ariane Bini

Ariane Costa Guimarães

Erik Marques Palma Duarte

Marcelo Guimarães Francisco

A votação e subsequente aprovação, pela Câmara dos Deputados, da <a href="https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2196833">PEC 45/2019</a> trouxe esperança de simplificação do sistema tributário. Dentre os pontos que devem ser objeto de discussão no Senado está a manutenção do tratamento favorecido conferido à <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/zona-franca-de-manaus">Zona Franca de Manaus</a> (ZFM).
Há diversas previsões na Constituição Federal de manutenção de regime tributário favorecido à ZFM, visando incrementar a competitividade do setor e incentivar o desenvolvimento econômico da região, como meio de combate às desigualdades regionais existentes no país.
Contudo, o estado de São Paulo tem submetido os contribuintes da indústria de processamento de dados sediados na ZFM a tratamento tributário desigual e mais gravoso do que aquele conferido aos estabelecimentos industriais do restante do país. Tal expediente viola diversos preceitos constitucionais. 
O artigo 27, I, do Anexo II do Decreto 45.490/2000 (RICMS-SP), prevê benefício fiscal de redução de base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ICMS">ICMS</a>) incidente sobre as operações que destinem bens da indústria de processamento de dados ao estado de São Paulo. 
Em sua redação original, a redução se dava na proporção necessária para que a carga tributária do imposto correspondesse a 12%. Com o <a href="https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/decreto/2020/decreto-65255-15.10.2020.html">Decreto 65.255/2020</a>, passou para 13,3% da operação. A partir da edição do Decreto 67.524/2023, as saídas de bens sujeitas ao benefício fiscal e ocorridas a partir retornaram a experimentar redução da carga tributária ao patamar de 12%.
Ocorre que o estado de São Paulo editou a Resolução SF 14/2013, que impôs restrições ao aproveitamento deste benefício por contribuintes situados na Zona Franca de Manaus, limitando seu alcance a modalidades específicas de unidades de processamento, especificamente para notebooks e tablets.
Desse modo, outros produtos fabricados na ZFM e destinados ao Estado de São Paulo estão sujeitos à tributação integral de 18%, a exemplo de outras unidades de processamento, monitores de informática e smartphones.
As inconstitucionalidades são flagrantes. O artigo 152 da Constituição Federal (CF) veda que entes tributantes diferenciem o tratamento tributário em razão de sua procedência, tal como ocorre no estado de São Paulo, em que as unidades de processamento de dados oriundas das ZFM são submetidas à alíquota de 18%, enquanto as oriundas de outros estados são submetidas à alíquota de 12%. Discriminação esta que eleva consideravelmente o preço das mercadorias.
O plenário do Supremo Tribunal Federal (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/STF">STF</a>) já reconheceu a violação ao aludido dispositivo ao julgar as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) nos 6.222/CE e 3.984/SC, em razão da diferenciação de benefício fiscal a depender da origem. 
Em regra, não pode haver tratamento fiscal díspar em razão da procedência ou destino. A única exceção constitucionalmente prevista é a dos artigos 40, 92 e 92-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ADCT">ADCT</a>), que preveem a possibilidade de tratamento desigual, quando instituído em benefício – e não em prejuízo – do desenvolvimento econômico da ZFM como área de incentivos fiscais.
A partir da interpretação desses dispositivos, em abril de 2019, o plenário do STF julgou o Tema 322 da Repercussão Geral e entendeu que o tratamento tributário diferenciado atribuído em favor da ZFM é de interesse e relevância para toda a Federação, sob pena de esvaziamento das disposições do ADCT referentes ao tema.
Especificamente para o ICMS, a Suprema Corte destacou, no julgamento da ADI 310/AM, a inconstitucionalidade da revogação de benefícios fiscais de ICMS na Zona Franca de Manaus, por afetar negativamente o tratamento tributário privilegiado da região.
No entanto, o estado de São Paulo adotou caminho inverso, violando a Constituição Federal de duas formas: dando tratamento tributário mais gravoso em razão da origem e em prejuízo à única região que, por mandamento constitucional, deve ter tratamento privilegiado. 
A diferença entre as cargas tributárias dos produtos da ZFM (18%) e daqueles de outras procedências (12%) compromete a competitividade daquela região, impacta negativamente o acesso dos contribuintes ao mercado paulista e prejudica o desenvolvimento econômico da indústria de bens de processamento de dados lá sediada.
As medidas do fisco paulista em prejuízo ao regime diferenciado da ZFM não são novidade e têm resultado em questionamentos judiciais reincidentes sobre sua constitucionalidade, à luz das normas do ADCT.
O governador do Amazonas ajuizou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.004/SP, alegando a inconstitucionalidade das autuações lavradas pelo estado de São Paulo e mantidas por decisões do Tribunal de Impostos e Taxas (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/TIT-SP">TIT-SP</a>), que buscaram a glosa de créditos de ICMS referentes à aquisição de mercadorias originadas da ZFM e, consequentemente, sujeitas ao seu regime de incentivos fiscais.
A Procuradoria-Geral da República (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/PGR">PGR</a>), em agosto de 2023, se manifestou naqueles autos, entendendo, com fundamento e dos precedentes acima citados (Tema 322/STF e ADI 310/AM), pela procedência do pedido, sob pena de violação ao tratamento favorecido da ZFM assegurado constitucionalmente.
O governador do Amazonas também já buscou a Suprema Corte para afastar medidas de São Paulo especificamente prejudiciais à indústria de processamento de dados. Ao ajuizar a ADI 3.935/SP, a intenção era afastar dispositivos da Lei Paulista 6.374/1989, que atribuiu alíquotas diferentes de ICMS para tais produtos dentro (12%) e fora (7%) da ZFM.
Ocorre que os referidos dispositivos foram revogados antes que o STF pudesse declarar sua inconstitucionalidade, o que acarretou a extinção da ação por perda de objeto.
A despeito da revogação para evitar a declaração de inconstitucionalidade, o Estado de São Paulo editou resolução com as restrições ao usufruto de benefício fiscal que estabelece cenário similar, senão mais grave, de tratamento prejudicial à indústria de bens de informática estabelecida na ZFM.
Por essa razão, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/TJSP">TJSP</a>) deverá enfrentar, em breve, a matéria sobre as inconstitucionais limitações impostas pela Resolução SF 14/2013. 
Espera-se que o TJSP resguarde os preceitos jurídicos estabelecidos pelo STF quanto à preservação da Zona Franca de Manaus e à impossibilidade de tratamento distinto de mercadorias a depender da origem, ainda mais se esse tratamento resvalar em um encarecimento dos itens provenientes da Zona Franca.
A despeito do ânimo com o ambiente de simplificação do sistema tributário, vale lembrar a importância do papel de cada poder: ao Congresso, o estabelecimento de normas jurídicas claras, ao Executivo considerá-las na estruturação de suas políticas e ao Poder Judiciário assegurar a sua inviolabilidade.

Divulgação/Suframa

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JOTA

SP restringe benefício fiscal apenas para produtos de processamento de dados oriundos da Zona Franca de Manaus

Inconstitucionalidade do tratamento prejudicial à ZFM pelo fisco paulista

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