Felipe Fernandes Reis

Daniela Santos

Em razão das dificuldades encontradas pelos agentes de mercado para o acesso às infraestruturas essenciais da Petrobras e à rede de transportes, com transparência, segurança, isonomia e previsibilidade de custos, condições e riscos, ainda não é possível ofertar gás conforme a demanda e necessidade dos consumidores/usuários.
Tal situação é particularmente mais grave naqueles estados onde a Petrobras já formalizou sua posição de fornecimento do gás natural às distribuidoras estaduais a partir de 31 de dezembro deste ano.
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Na verdade, tal situação deveria ter sido corrigida no âmbito do festejado Termo de Cessação de Conduta (TCC) celebrado em julho de 2019 entre o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Petrobras – seguindo as conclusões e recomendações do Comitê de Promoção da Concorrência do Mercado de Gás Natural do Brasil –, no qual ficaram estabelecidas obrigações de venda de ativos e comportamentais por parte da petroleira.
Por certo, não se esperava que todas as questões envolvendo a posição da Petrobras no setor do gás natural nacional fossem resolvidas automaticamente por conta das obrigações contidas no TCC. Mas alguns pontos precisam ser revisitados e ajustados para que a sua eficácia seja preservada.
Nesse sentido, o principal lema é a transparência. Recentemente, inclusive, o Tribunal de Contas da União (TCU) atestou as reiteradas dificuldades para acesso às informações do cumprimento do TCC por parte da Petrobras. E nem se diga que tais conclusões foram pontuais e circunstanciais, porque é certo admitir que – ainda – não há modelo de negociação pública e isonômica envolvendo a Petrobras no setor de gás no país. Os processos administrativos, tanto no âmbito do Cade, como também do órgão regulador do setor de gás, a Agência Nacional do Petróleo (ANP), evidenciam tal fato sem maiores considerações.
Obviamente já é do conhecimento do Cade e do trustee que as empresas que se envolvem comercialmente com a Petrobras possuem contratos confidenciais por exigência da petroleira, além de relações comerciais que devem ser mantidas, sob pena de não mais existirem no mercado. E isso não é novo. Na verdade, trata-se de um dos desdobramentos e estratégias mais nefastas do monopólio. Portanto, condicionar qualquer medida do órgão de defesa da concorrência a informações concretas e pontuais de uma determinada empresa pode ser uma forma indireta de inviabilizar os objetivos do TCC.
Vale ressaltar que, sem transparência e modelo de negociação de acesso, os agentes não terão efetivas condições para endereçar suas dificuldades às autoridades. A contraparte da Petrobras sequer conseguirá identificar se a morosidade, entrave ou condições impostas pela petroleira são desproporcionais ou discriminatórias, ou seja, se seguem um modelo comum de negociação.
Nesta medida, entre outras pendências, é fundamental assegurar que a Petrobras imediatamente adote um modelo aberto, transparente e padronizado para a negociação de acesso às infraestruturas essenciais – na qual restem evidenciadas as relações societárias e comerciais envolvidas (exceto as informações pontuais consideradas confidencias pela lei) – em linha com o que é praticado no mercado internacional e pelos operadores privados no mercado local, previsto na nova Lei do Gás (artigo 2º, <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14134.htm">Lei 14.134/2021</a>) e organizado no caderno de boas práticas do IBP – não se limitando às regras gerais e abstratas de acesso, do modo atualmente feito pela Petrobras.
Ademais, a Petrobras deve apresentar relatório e/ou histórico dessas negociações, indicando as etapas, condições e procedimentos dessas tratativas, bem como a estrutura ou metodologia de preços aplicável a todos os interessados, o que pode ser apresentado de forma a preservar a identidade das partes e particularidades das negociações.
Deve-se, também, dar a devida transparência às informações públicas da capacidade de entrada e saída, bem como os termos contratados da Petrobras junto às transportadoras (prazo, tarifa, modelo tarifário, encargos, penalidades entre outros), justamente para que os agentes do mercado possam verificar se, de fato, terão acesso aos gasodutos de transporte e em condições isonômicas.
Neste ponto, também é importante esclarecer que o Cade deve exigir da Petrobras aquilo que é de sua responsabilidade, independentemente das atribuições e pendências de outros entes. Ou seja, é inadmissível permitir que a Petrobras se valha do prazo de cumprimento de obrigações de terceiros para justificar a sua (não) conduta.
Outra necessidade imediata é a flexibilização da contratação de gás para eventual aquisição de outros fornecedores, em especial aos consumidores finais que pretendem migrar para o mercado livre, como forma de reduzir as barreiras para a sua abertura e desenvolvimento.
Portanto, o desafio é enorme, inclusive na conduta do próprio Cade. Com efeito, o processo administrativo sobre o TCC deve ser disponibilizado integralmente, com, repita-se, as exceções pontuais de confidencialidade indicadas na lei, assegurando o correto enfrentamento das condutas já antes investigadas pela autoridade. O melhor exemplo de transparência deve vir do órgão de defesa da concorrência, possibilitando o conhecimento e as contribuições pertinentes. Será um inequívoco ganha-ganha, cujo beneficiário final será o consumidor de gás natural.

Mercado de gás natural

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JOTA

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