Luiz Fernando Gomes Esteves

No <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/sem-precedentes/o-que-esperar-da-sabatina-de-cristiano-zanin-na-ccj-do-senado-16062023">último episódio do Sem Precedentes</a>, ao discutir o que deveríamos esperar da <a href="https://www.jota.info/legislativo/ao-vivo-sabatina-de-cristiano-zanin-indicado-ao-stf-na-ccj-do-senado-21062023">sabatina de Cristiano Zanin</a>, Juliana Cesario Alvim levantou um interessante ponto sobre a relação de ministros do STF com seus antigos escritórios e clientes. Formulo a preocupação em duas perguntas: aprovado no Senado, como o ministro Cristiano Zanin deveria se portar ao receber processos em que figurem como partes seus antigos clientes? Ou, mais do que isso, o ministro atuaria em processos que envolvessem clientes do escritório de sua esposa?
+JOTA: <a href="https://www.jota.info/legislativo/ao-vivo-sabatina-de-cristiano-zanin-indicado-ao-stf-na-ccj-do-senado-21062023">AO VIVO – Sabatina de Cristiano Zanin, indicado ao STF, na CCJ do Senado</a>
Em geral, como bem lembrou Alvim, quando questionados sobre o tema em sabatinas, os indicados reagem com uma resposta genérica, indicando que o Código de Processo Civil (CPC) prevê as causas de impedimento e suspeição dos magistrados, e que estará submetido a essas regras caso ingresse no cargo. Tal resposta foge da complexidade da situação, ao não apontar especificamente em que tipo de casos o candidato declararia sua suspeição ou reconheceria seu impedimento a partir das regras já postas.
Contudo, há um segundo plano de complexidade que envolve a atuação dos ministros e as regras de impedimento e suspeição. Os ministros do STF têm não apenas o poder de interpretar se uma situação específica se enquadra nas regras existentes, mas também podem julgar se as regras que definem as hipóteses de impedimento e suspeição são constitucionais.
É essa última questão que está na <a href="https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5481637">ordem do dia do tribunal</a>. Em 2018, a Associação dos Magistrados Brasileiros questionou a constitucionalidade de uma rígida hipótese de impedimento prevista no CPC, a qual impede que magistrados atuem em processos “em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório”.
O STF começou a julgar o caso no plenário virtual em 2020, e o relator, ministro Edson Fachin, não viu qualquer inconstitucionalidade na regra questionada. Porém, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, que devolveu a vista apenas no início do mês. Retomado o julgamento, Mendes votou pela inconstitucionalidade da regra, e em seguida o ministro Roberto Barroso acompanhou, com poucas ressalvas, o voto do relator, ministro Edson Fachin. O placar, portanto, era de 2 a 1 em favor da regra, mas novo pedido de vista, dessa vez do ministro Luiz Fux, suspendeu novamente o julgamento.
O próprio ministro Gilmar Mendes ilustra a dualidade na relação de ministros do STF com as regras de suspeição e impedimento. Em 2017, ao julgar um habeas corpus de um indivíduo que era cliente do escritório em que atua sua esposa, o ministro entendeu que a situação não se enquadraria em hipótese de impedimento ou suspeição. Três anos depois, votou a respeito da constitucionalidade da própria regra que poderia levar ao seu impedimento no habeas corpus de 2017.
Caso os pontos não tenham ficados claros até aqui, é bom reforçar. Do lado do STF, há uma incrível oportunidade para a definição de quais são as situações que geram o impedimento de magistrados em situações que não apenas já existem no tribunal – uma vez que vários ministros possuem parentes próximos que atuam em escritórios de advocacia –, mas que também atingirão o mais novo ministro.
Por outro lado, a constatação de que os ministros do STF podem definir não só os limites das regras de impedimento e suspeição, mas a própria validade de tais regras, pode ser importante na sabatina, caso Zanin faça uso da resposta genérica que referencie os artigos do CPC. Ela abre aos senadores a oportunidade de perguntas mais sofisticadas, que ultrapassem discussões sobre a participação de Zanin em processos relacionados com a Lava Jato ou com as Americanas, para questionar o candidato sobre a validade das regras em abstrato.
É possível que Zanin se esquive de tais questões na sabatina com o argumento de que não pode se manifestar sobre questões pendentes de julgamento no STF – outra estratégia comum adotada por indicados ao cargo. Todavia, o processo pendente no STF diz respeito a apenas uma hipótese específica de impedimento, não a todo arcabouço de regras que limitam a atuação de magistrados para garantir a imparcialidade nos julgamentos.
Não restam dúvidas de que a indicação de Zanin para o STF trouxe de volta um antigo <a href="https://oglobo.globo.com/politica/stf-arquivou-todos-os-pedidos-de-impedimento-suspeicao-contra-seus-ministros-diz-estudo-23872527">debate sobre como o tribunal deve lidar com as causas de impedimento e suspeição</a> – o problema não é novo, portanto. Mas desta vez o tribunal tem a chance de discutir a constitucionalidade da regra longe das polêmicas de um caso concreto, e antes mesmo da chegada do novo ministro. A mesma oportunidade se abre para Zanin, que em sua sabatina pode fornecer respostas a perguntas como as seguintes: o candidato considera que são constitucionais as regras que podem limitar sua participação em processos futuros? São razoáveis? Devem se aplicar a todos os casos?

zanin

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JOTA

Desta vez o tribunal tem a chance de discutir a constitucionalidade da regra longe das polêmicas de um caso concreto

Impedimento de ministros do STF: qual é a visão da corte e de Zanin?

Indicação de Zanin para o STF trouxe de volta um antigo debate sobre como o tribunal deve lidar com as causas de impedimento e suspeição