Coronavírus

Impactos da pandemia da Covid-19 nas assembleias de fundos de investimento

Arcabouço normativo já trazia elementos suficientes para admitir participação nas assembleias de forma remota

CVM
Crédito: Pixabay

As severas restrições de ordem sanitária observadas em decorrência da propagação do coronavírus vêm impactando diretamente diversos setores de atividade econômica. Nos mercados financeiro e de capitais esses impactos têm sido percebidos não apenas em sua dimensão econômica, mas também no âmbito jurídico e regulatório.

A Comissão de Valores Mobiliários – CVM, entidade reguladora desse mercado no Brasil, vem oferecendo rápidas respostas à situação, seja por meio do diferimento de prazos regulatórios – como se deu no último dia 25 de março, com a edição da Deliberação nº 848/2020 – seja por meio da edição de normas que viabilizem a tomada de decisões e a manutenção de atividades dos participantes do mercado.

Exemplo recente se deu com a edição da Instrução CVM nº 622, de 17 de abril de 2020, que disciplinou a realização de assembleias de companhias abertas de modo inteiramente digital.

No mesmo sentido, foi posta em audiência pública minuta de Instrução daquela autarquia por meio da qual se pretende estabelecer condições para a realização de assembleias digitais para titulares de debêntures de emissão de companhias abertas, ofertadas publicamente ou admitidas à negociação em mercados de valores mobiliários.

Com relação aos fundos de investimento, no entanto, o arcabouço normativo existente antes do cenário da pandemia já trazia elementos suficientes para admitir, de forma segura, a participação ou a manifestação de voto nas assembleias de forma remota.

Constam previsões expressas nesse sentido, por exemplo, no art. 10, § 3º ou, mais claramente, no art. 72 da Instrução CVM nº 555/2014, norma geral que disciplina os fundos de investimento, que assevera que, a assembleia geral pode ser realizada por meio eletrônico, devendo estar resguardados os meios para garantir a participação dos cotistas e a autenticidade e segurança na transmissão de informações.

De modo semelhante dispõem o art. 27, parágrafo único, da Instrução CVM nº 578/2016, que trata dos fundos de investimento em participações (FIP), e o art. 22, parágrafo único, da Instrução CVM nº 472/2008, que disciplina os fundos de investimento imobiliário (FII).

Não é outro, portanto, o entendimento expresso pela Superintendência de Relações com Investidores Institucionais da CVM, responsável pela supervisão e orientação dos fundos de investimento, manifestado no Ofício-Circular n° 6/2020/CVM/SIN.

De acordo com aquela área técnica, somente é justificável, à luz do interesse público, o cancelamento ou adiamento de assembleias gerais, convocadas ou não, em casos nos quais não seja possível a realização do conclave de forma remota, virtual ou por meio de consulta formal.

Como visto, a não realização só se mostra admissível na hipótese de impossibilidade de realização da sessão de modo remoto ou virtual, devendo essa condição, a nosso ver, ser devidamente fundamentada e comprovada pela instituição administradora do fundo.

A despeito do diferimento de prazos pela Deliberação nº 848/2020, é fato que diversas decisões relacionadas aos fundos de investimento precisam ser tomadas em caráter de urgência, até mesmo por força dos reflexos da Covid-19 em diversos agentes econômicos, tais como a repactuação de obrigações das quais os próprios fundos ou sociedades por eles investidas sejam credores.

E muitas vezes, o ambiente adequado para que se dê essa tomada de decisão é a assembleia, onde se pode viabilizar um debate aprofundado e com a mais ampla participação possível por todos os interessados.

Em um momento como o atual, em que diversas decisões extremamente relevantes para os destinos do planeta vêm sendo tomadas por meio de sessões virtuais e com o apoio de ferramentas digitais, inclusive por chefes de Estado e de governo em organismos internacionais, a adoção dessa metodologia nos fundos de investimento se mostra não apenas adequada, mas também em linha com os deveres de transparência, lealdade e diligência que os responsáveis pela administração e gestão desses veículos possuem com seus cotistas.