Grupo de Pesquisa sobre Jurisprudência do TIT do NEF/FGV Direito SP

No âmbito do Projeto Observatório de Jurisprudência do TIT-SP, o presente artigo, publicação número 100 da segunda fase da pesquisa, tem por escopo analisar a possibilidade de atualização dos valores a serem ressarcidos em razão da diferença gerada pela apuração do ICMS substituição tributária, nos termos da <a href="https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/pcat171999.aspx">Portaria CAT n° 17/99</a>. 
Nesse contexto, nossa análise recai sobre o acórdão proferido pela Câmara Superior no AIIM 4.125.805-8, em 29 de setembro de 2022, no qual foi provido parcialmente o Recurso Especial interposto pela Fazenda, por maioria (11 a 5). 
A autuação decorre de creditamento indevido de ICMS com infração ao artigo 61, §2º, do RICMS/2000, tendo em vista que o crédito escriturado foi registrado a destempo com a respectiva atualização. Não se discute o crédito em si, mas tão somente a correção monetária. Em sua defesa, o contribuinte alega ter direito à correção dos valores passíveis de ressarcimento de substituição tributária, pois a metodologia de cálculo prevista pela Portaria CAT nº 17/99 obstava parte do crédito a que teria direito. Ressalta, ainda, que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em especial o REsp nº 1.035.847, autoriza o procedimento adotado pelo contribuinte, visto que obstaculizado injustamente o creditamento pelo Fisco.  
A Portaria CAT n° 17/99, que disciplina os procedimentos de complemento e ressarcimento do ICMS retido por substituição, previa método de apuração que foi obrigatório de julho de 1999 até o final de 2015, facultado em 2016 e revogado a partir de 2017, data em que passou a ser obrigatória a metodologia corrigida pela Portaria CAT nº 158/15[1]. 
Nos termos dos artigos 3º e 4º da referida Portaria 17/99, o montante a ser ressarcido deveria ser calculado a partir da diferença entre a base de cálculo utilizada para cálculo do imposto recolhido pelo regime de substituição tributária e o valor de aquisição interestadual, aplicando-se a alíquota interna prevista para o produto, o que ensejava ressarcimento a menor. Para exemplificar, o quadro a seguir demonstra que por essa metodologia a restituição seria de 9, enquanto o correto seria de 15: 
<table style="height: 189px;" data-tablestyle="MsoNormalTable" data-tablelook="1184" aria-rowcount="9">
<tbody>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="1">
<td style="height: 21px; width: 636.609px;" colspan="2" data-celllook="69905">Pagamento antecipado – Cálculo do imposto  </td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="2">
<td style="height: 21px; width: 405.125px;" data-celllook="69905">Valor NF – Aquisição interestadual </td>
<td style="height: 21px; width: 216.094px;" data-celllook="69905"> R$ 100</td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="3">
<td style="height: 21px; width: 405.125px;" data-celllook="69905">ICMS destacado </td>
<td style="height: 21px; width: 216.094px;" data-celllook="69905"> R$ 12</td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="4">
<td style="height: 21px; width: 405.125px;" data-celllook="69905">Base de Cálculo ICMS-ST antecipado (MVA 50%) </td>
<td style="height: 21px; width: 216.094px;" data-celllook="69905"> R$ 150</td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="5">
<td style="height: 21px; width: 405.125px;" data-celllook="69905">ICMS-ST antecipado (18%) </td>
<td style="height: 21px; width: 216.094px;" data-celllook="69905"> R$ 15</td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="6">
<td style="height: 21px; width: 636.609px;" colspan="2" data-celllook="69905">Cálculo do ressarcimento pela Portaria CAT nº 17/99 </td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="7">
<td style="height: 21px; width: 405.125px;" data-celllook="69905">Apuração da diferença das bases  </td>
<td style="height: 21px; width: 216.094px;" data-celllook="69905">R$ 150 (-) R$ 100 = R$ 50 </td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="8">
<td style="height: 21px; width: 405.125px;" data-celllook="69905">Aplicação da alíquota interna  </td>
<td style="height: 21px; width: 216.094px;" data-celllook="69905"> R$ 50 (*) 18% = R$ 9  </td>
</tr>
<tr style="height: 21px;" aria-rowindex="9">
<td style="height: 21px; width: 405.125px;" data-celllook="69905">Montante do ressarcimento  </td>
<td style="height: 21px; width: 216.094px;" data-celllook="69905"> R$ 9</td>
</tr>
</tbody>
</table>
 A necessidade de correção da metodologia da Portaria CAT nº 17/99, adotada para a modalidade de restituição de valores em operações interestaduais, foi objeto de diversas respostas a consultas formuladas pelos contribuintes, entre elas a <a href="https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/RC2341_2013.aspx">RC 2341/2013</a>, sendo ao final confirmado pela Fazenda estadual que a metodologia de cálculo estava equivocada ao reconhecer o direito ao ressarcimento somente da parcela resultante da aplicação da alíquota interna sobre o MVA (no exemplo acima, R$ 9), quando o correto seria o ressarcimento integral do ICMS-ST antecipado (no exemplo acima, R$ 15), com o consequente reconhecimento do direito dos contribuintes à restituição da diferença do saldo ressarcido a menor ou seja, R$ 6. 
No julgamento do AIIM 4.125.805-8, a Câmara Superior do TIT, considerando que o contribuinte se creditou de ICMS do período de 2009 a 2012, na GIA de 2014, corrigidos monetariamente (no exemplo acima, R$ 6 atualizados), deu provimento parcial ao Recurso Especial da Fazenda, por maioria, por entender que os valores ressarcidos referem-se a crédito extemporâneo e por essa razão, o contribuinte não poderia atualizar os valores, nos termos da <a href="https://portal.fazenda.sp.gov.br/servicos/tit/Paginas/Sumula-032003.aspx">Súmula 03/2003</a>. Note que não se questiona o ressarcimento em si (no exemplo, R$ 6), mas a correção monetária acrescida ao valor do principal ressarcido. 
Diferente da relatora juíza Cacilda Peixoto, que foi seguida pela maioria do colegiado, o juiz Edison Aurélio Corazza, apresentou voto vista, entendendo pelo não conhecimento do recurso fazendário, ressaltando que o caso não é de crédito extemporâneo, mas sim de indébito tributário, restituição ou ressarcimento:  
<blockquote class="jota-article__citation">“Saldo credor do ICMS é um conceito próprio, decorrente da sistemática constitucional não cumulativa do imposto, e definido pela legislação, no caso, pelo artigo 24, III, da Lei Complementar 87/1996. 
Nas minhas palavras: saldo credor do ICMS é o resultado da apuração do ICMS, quando o montante de créditos escriturados (no período ou transportado de períodos anteriores) supera o de débitos registrados no período de apuração, o que enseja o transporte desse saldo para o próximo período de apuração. 
Por sua vez, o crédito extemporâneo é um crédito legítimo não escriturado em época própria, sendo aproveitado em momento futuro, antes do termo final de sua decadência. 
Já a decisão recorrida, no quanto formalizado em voto vista vencedor e discordante do relator do ordinário considerou que, no caso dos autos, o lançamento fiscal não se refere a correção monetária de saldo credor, ou de crédito extemporâneo, mas sim de indébito tributário, restituição ou ressarcimento, instituto diverso. 
(...) Concluindo, quanto ao mérito, impossível conhecer do recurso, posto que nenhum dos paradigmas apresentados tratam de correção monetária de restituição do indevidamente pago, assim como não o faz a Súmula 03/2003. (...)”</blockquote>
Como bem destacado pela decisão recorrida, “o contribuinte não deu causa à restituição a menor e, por isso, tem o direito à atualização do complemento da restituição do ICMS, seja com base na posição do STJ sobre crédito escritural (RESP nº 1.035.647, representativo da controvérsia, que vincula à administração pública), seja pelo regramento previsto para pagamento a maior do arts. 165 e 167, do CTN, pois o que se pretende é evitar o locupletamento indevido ou sem causa de uma das partes”. 
A questão é relevante pois demonstra a diferença de entendimento dos Juízes acerca da possibilidade de atualização desses valores, principalmente por entenderem de forma diversa sobre a natureza do crédito.  
Não há dúvidas que o ICMS-ST e o ICMS possuem a mesma materialidade e se sujeitam ao princípio da não cumulatividade, porém o crédito escritural decorrente do regime da não cumulatividade não pode ser confundido com a garantia constitucional de imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido (artigo 150, §7º, CF). 
De fato, caso o referido crédito fosse considerado extemporâneo, ou seja, crédito escritural decorrente do regime da não cumulatividade não registrado em época própria, como entendeu a Juíza Relatora, não seria possível a atualização desses valores, uma vez que encontra óbice na Súmula 03/2003 do TIT. 
Todavia, em sendo indébito tributário restituição ou ressarcimento, como sustentado no voto divergente, é assegurado ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor do imposto pago a maior, devidamente atualizado, nos termos dos artigos 165 e 167 do CTN e 10 da LC 87/96, visto que a simplificação de arrecadação tributária não pode deixar em segundo plano os direitos e garantias dos contribuintes, sob pena de enriquecimento ilícito do erário. 
Neste sentido, vem decidindo o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, como se verifica da ementa proferida no processo 1030006-47.2019.8.26.0053: 
<blockquote class="jota-article__citation">“AÇÃO DECLARATÓRIA. ICMS Substituição Tributária. Pedidos administrativos de ressarcimento. Deferimento apenas do montante originariamente recolhido do imposto. Pretensão de declaração do direito à atualização monetária dos valores ressarcidos. Possibilidade, inclusive para os casos em que o fato gerador presumido não se realizar. Previsão expressa nos artigos 150, §7º, da Constituição Federal e 10, §1º, da Lei Kandir (Lei Complementar nº 87/96). Precedentes do STJ e deste Tribunal de Justiça. Incidência da Taxa SELIC (Súmula nº 523 do STJ)”.</blockquote>
De todo modo, cabe lembrar que o contribuinte só realizou o creditamento desses valores em período posterior por conta da sistemática trazida pela Portaria CAT n° 17/99 (posteriormente alterada) e que, somente após o reconhecimento da Fazenda, por meio de solução de consulta, foi possível aproveitar da diferença.  
Como se verifica, ainda que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 593.849/MG (tema 201), tenha concluído que o artigo 150, §7º, da CF autoriza a restituição da diferença do ICMS-ST pago a mais, quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida, ainda é possível observar desafios a serem enfrentados, tal como a discussão debatida no AIIM 4.125.805-8, relativa ao direito à atualização monetária do ressarcimento na substituição tributária.
Autoria:
Erika Garcia Cunha Melo - Pesquisadora do Projeto Repertório Analítico de Jurisprudência do TIT - NEF-FGV-SP. Mestre em Direito Tributário (FGV-SP). Pós-graduada em Petróleo e Gás (COPPE-UFRJ). Graduada em Direito (UFMG) e em Ciências Contábeis (PUC-MG). Juíza do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo. Advogada no escritório Bento, Cunha &amp; Rigo Sociedade de Advogados (B2CR)
André Montenegro Bertolino - Graduado em Direito (FMU). Advogado tributarista do escritório Bento, Cunha &amp; Rigo Sociedade de Advogados (B2CR)
Coordenação geral:
Eurico Marcos Diniz de Santi 
Eduardo Perez Salusse 
Lina Santin 
Kalinka Bravo 
<hr />
[1] Nesse sentido, verificar <a href="https://portal.fazenda.sp.gov.br/servicos/st/Paginas/RetrospectoHistorico.aspx">https://portal.fazenda.sp.gov.br/servicos/st/Paginas/RetrospectoHistorico.aspx</a>

icms

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JOTA

Câmara Superior classifica os valores como crédito extemporâneo, impedindo a atualização 

ICMS-ST: correção monetária do indébito tributário, restituição ou ressarcimento

Observatório do TIT: Câmara Superior classifica os valores do ICMS-ST como crédito extemporâneo, impedindo a atualização